Cinema na Educação
Quero ser grande
Sonhos da Infância
Qual criança entre os sete e os doze anos não sonha em antecipar a idade adulta? Sair com os amigos sem ter que avisar ninguém... Assistir qualquer filme na televisão até a hora que quiser... Comprar suas próprias roupas sem que os pais orientem ou obriguem a adquirir tais peças... Ter seu próprio dinheiro e gastá-lo do jeito que bem entender... Comer doces e todo o tipo de guloseimas sem objeções...
Todos já vivemos por isso. Talvez já tenhamos nos esquecido por conta do ritmo de nossas vidas e pelo passar dos anos. Mas adiantar-se no tempo e poder deliciar-se com as possibilidades do mundo adulto é etapa obrigatória na existência de praticamente todas as pessoas que conheço.
“Quero ser grande”, comédia de grande sucesso mundial, dirigida com sensibilidade por Penny Marshall e a primeira indicação ao Oscar do astro Tom Hanks, torna o sonho realidade. E a magia do cinema mais uma vez nos possibilita brincar com aquilo que é aparentemente impossível aos nossos olhos no mundo real.
E porque digo apenas “aparentemente impossível” se as evidências são todas no sentido contrário... Afinal de contas não temos como viajar no tempo e antecipar ou adiantar etapas de nossas existências. Não é claro a todos que a cada dia que passa envelhecemos gradualmente e nos aproximamos mais e mais do fim de nossa passagem por essa experiência terrena e material?
Se formos pensar cientificamente podemos evocar o grande Albert Einstein e algumas de suas teorias que indicam ser possível viajar no tempo. A física apresenta e explica conceitos que indicam que a temporalidade e a contextualização tão caras a cada um de nós podem ser apenas criações de nossas mentes... Esclarece, por exemplo, que se entrarmos numa cápsula e formos lançados no espaço numa viagem à velocidade da luz, ao voltarmos a reação de nosso corpo ao passar do tempo será diferente das pessoas que permaneceram na Terra. Eles terão envelhecido mais rapidamente...
Mas como não sou especialista em Física, apenas um admirador da ciência e desse campo específico de pesquisa, o enfoque desse artigo é outro...
Tentamos antecipar a adolescência e a juventude queimando etapas do desenvolvimento humano em nossas crianças ao lhes impor - em especial através da mídia (mas também na família, na escola, na igreja, no clube,...) - valores, práticas, ações, pensamentos, idéias e comportamentos próprios de pessoas mais velhas...
Maquiar meninas de nove anos de idade, querer que garotos que mal ingressaram no ensino fundamental namorem, sugerir e estimular o acesso a filmes ou músicas inadequadas, permitir a livre navegação na internet ou simplesmente dar total liberdade para que essas crianças sejam responsáveis por sua vida escolar, por exemplo, são ações que antecipam etapas da vida humana.
Do mesmo modo, vemos adultos que demoram a, literalmente, “desmamar”... Não querem sair de suas casas ainda que já tenham idade suficiente para isso, emprego estável, relacionamentos íntimos, bens próprios,... E o pior, continuam a agir como adolescentes e usufruindo das benesses e vantagens de morar com os pais...
E essas situações não são fruto da imaginação de ninguém. Elas estão sendo divulgadas com grande freqüência através da televisão, dos jornais e mesmo da internet. São casos que merecem a atenção dos especialistas, das famílias e mesmo da escola. E que já estão sendo analisadas por estudiosos de áreas como psicologia, pedagogia e sociologia.
Filmes como “Quero ser grande” orientam o nosso olhar, de forma lúdica e divertida, para uma circunstância que constituía nada mais do que um sonho infanto-juvenil até bem recentemente, no entanto as novas variáveis inseridas ao comportamento em questão tornam o debate bastante sério. É hora de pensarmos sobre isso, em respeito a nossas crianças, adolescentes e jovens...
O Filme
Josh (David Moscow) é um menino de 12 anos que vive com a família numa confortável casa de classe média em uma típica cidade norte-americana. Ter essa idade implica, no entanto, em algumas atribuições e compromissos que aos seus olhos parecem bastante desagradáveis. Cuidar da irmã menor, fazer tarefas escolares ou ajudar na arrumação da casa são realmente deveres chatos tanto para ele quanto para qualquer garoto na pré-adolescência.
O melhor seria chegar logo a idade adulta e usufruir de todas as facilidades relativas à maioridade. Ter sua própria conta bancária, chegar em casa a hora que desejar, assistir qualquer programa da televisão, não ter que fazer tarefas de matemática, não ter que pajear irmãos menores,... E o melhor, quem sabe até mesmo conseguir chamar a atenção da menina com a qual paquera na escola...
Seu sonho distante está prestes a acontecer... Sua ida a um parque de diversões com o melhor amigo Billy (Jared Rushton) o coloca em contato com uma máquina caça-níqueis em que ele pode fazer um pedido que, como parte da brincadeira, irá se realizar. E nesse momento Josh deseja ser grande, antecipar a fase adulta de sua vida...
Tudo termina como começou... A máquina não realiza naquele momento a mágica transformação e Billy volta para casa, se esquecendo no trajeto de retorno, do pedido que havia feito.
Na manhã seguinte, ao levantar-se para ir para a escola e ir ao banheiro, depara-se no espelho com outro Josh (Tom Hanks, em brilhante atuação), já adulto, como ele desejara no dia anterior na máquina caça-níqueis do parque de diversões.
Sua mãe não entende nada e o expulsa de casa, imaginando tratar-se de um marginal que invadiu seu domicílio e que estaria ameaçando seus filhos. Josh cai no mundo e vai para Nova Iorque, onde passa a trabalhar como assistente numa grande fábrica de brinquedos... Está entrando no mundo dos adultos, no corpo de uma pessoa crescida, mas sua cabeça continua sendo a de um menino de 12 anos...
Fábula moderna inteligente, sensível e divertida, “Quero ser grande” se tornou um clássico para milhões de espectadores, além de definitivamente promover Tom Hanks para a galeria dos grandes astros de Hollywood. É filme para ver e rever, rir e chorar, uma produção de primeiríssima. Imperdível!
Para Refletir
1. Temos a tendência natural de querer impor as nossas crianças as idéias e práticas do mundo adulto sem que nem ao menos percebamos isso. E essa ação se torna mais freqüente a partir do momento em que os pequenos atingem os oito ou nove anos de idade. Acontece comigo, com você e também com praticamente todos os adultos e se estabelece como parte da relação que temos com nossos filhos, sobrinhos, alunos,... Dessa forma vamos traçando limites que definem, aos poucos, linhas demarcatórias na transição do mundo infantil para o adulto. Em grande parte dos casos transgredimos as fases de maturação e exigimos que a infância seja superada com mais rapidez do que deveria... Respeitar as crianças significa dar espaço e condições para que a fantasia, a brincadeira, a imaginação, o sonho e a inocência tenham espaço em suas existências. Se não lhes damos essa alternativa estamos tirando dos mesmos a base para uma existência verdadeiramente feliz...
2. Pode-se iniciar as atividades perguntando as crianças o que acham da infância e se alguma delas gostaria de se tornar adulto logo... Isso poderia desencadear um bate-papo para entender melhor quem são os alunos com os quais estamos trabalhando e quais as perspectivas dos mesmos em relação à vida e ao mundo. Essa atividade poderia motivar à produção de textos sobre o que é a infância, a importância de brincar, a influência dos pais na vida dos filhos, como as crianças percebem a escola,... Esse material poderia enriquecer e facilitar a relação entre as famílias e os educadores com esses estudantes ao longo de toda a sua formação. O filme complementaria o debate sendo apresentado aos pais e aos próprios alunos depois da composição de todos esses registros.
3. Uma forma bastante interessante de trabalho a ser desenvolvido a partir da apresentação de “Quero ser grande” é realizar um resgate da idéia de infância em diferentes momentos da história. Para que isso tenha maior repercussão entre os alunos seria bastante proveitoso promover conversas com pessoas mais velhas (bisavós, avós, tios, pais,...) para que deles surgissem relatos sobre como eram as brincadeiras ou que tipos de brinquedos eram comuns quando eles eram crianças. Para complementar seria aconselhável montar uma mostra com brinquedos antigos, pesquisados e encontrados pelos próprios estudantes.
4. A valorização dos laços familiares e das amizades sinceras também é aspecto a ser destacado a partir do filme de Penny Marshall. Há diferenças marcantes entre a forma como as crianças e os pré-adolescentes entendem família e amizade comparativamente com seus pais. Esses aspectos têm que vir a tona para que se crie uma atmosfera de maior compreensão entre pais e filhos e, até mesmo, no ambiente educacional.
Ficha Técnica
Quero ser grande
(Big)
País/Ano de produção: EUA, 1988
Duração/Gênero: 98 min., Comédia
Indicação Etária:livre
Direção de Penny Marshall
Roteiro de Gary Ross e Anne Spielberg
Elenco: Tom Hanks, Elizabeth Perkins, Robert Loggia, John Heard, Jared Rushton, David Moscow, Mercedes Ruehl, Jon Lovitz, Josh Clark, Kimberlee M. Davis.
Links
http://www.cineplayers.com/filme.php?id=1456
http://epipoca.uol.com.br/filmes_detalhes.php?idf=8928
http://cineclick.uol.com.br/cinemateca/ficha_filme.php?id_cine=9010
http://www.adorocinema.com.br/filmes/quero-ser-grande/quero-ser-grande.asp