A Semana - Opiniões
Recall urgente na educação...
O SARESP e seus resultados abaixo da crítica...
Temos visto com relativa freqüência casos de “recall” de mercadorias realizados por indústrias das mais diversas áreas de atuação. Desde fabricantes de brinquedos, passando por indústrias da área de alimentação e chegando até mesmo as poderosas montadoras de automóveis, defeitos têm ocorrido e gerado a necessidade de troca ou revisão/reparo dos produtos.
A orientação nesses casos sempre é no sentido de resolver o problema do consumidor, que demonstrou interesse e apreço pela marca, e que deve ser atendido quanto às reclamações e problemas surgidos com o bem que adquiriu.
O que se preza, nesse sentido, é a máxima de que o consumidor final é o rei. Por isso mesmo, em caso de defeito, erro, problema ou dificuldade no uso de algum produto – os consumidores já sabem que têm o direito e a necessidade de recorrer aos órgãos de defesa do consumidor ou mesmo aos serviços de atendimento ao cliente das empresas.
Esse respeito ao comprador de seus produtos revela que as empresas e o próprio capitalismo amadureceram. Elegeram como prioridade a qualidade – ainda que em alguns casos a pressa (eterna inimiga da perfeição) acabe atrapalhando a busca pelo produto de acabamento impecável.
Esse atendimento preferencial aos clientes demonstra ainda que os fabricantes, comerciantes e prestadores de serviços compreenderam que ao agir dessa forma estão zelando pela imagem de seus empreendimentos. E como é difícil erigir uma reputação de respeitabilidade, aceitação social, interação com a comunidade, credibilidade quanto ao que se oferece enquanto produto e/ou serviço,...
E o que me motiva a fazer essa referência à estratégia inteligente das empresas em sua relação com os consumidores de seus produtos no tocante ao recall de mercadorias e ou serviços que apresentam defeitos ou problemas?
Basicamente escrevo devido à constatação de que as lições e exemplos da iniciativa empresarial, que deveriam motivar outros segmentos produtivos da sociedade, nem sempre são aprendidos, levados em consideração, reconhecidos, percebidos como alternativas que viabilizem melhorias,...
E como a área que mais nos motiva reflexões é a educação, há motivos de sobra para chamarmos a atenção dos profissionais da área quanto a dados alarmantes do segmento educacional.
Na semana passada tivemos a divulgação dos dados do SARESP (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo) referentes ao ano de 2007. E nada mais desalentador do que ficar sabendo através desses dados que a situação, quando comparada com o desempenho de 2005 (já bastante sofrível), está ainda pior...
Por exemplo, em matemática, o percentual de alunos com nível de ensino abaixo do básico esperado nas séries avaliadas em nenhum caso é inferior a 44% dos alunos da rede estadual de ensino de São Paulo. No 3º ano do Ensino Médio os dados revelam que 71% dos estudantes saem da escola sem saber os conteúdos básicos dessa imprescindível área de conhecimento (A título de comparação, em 2005, o SARESP havia registrado que esse despreparo atingia o equivalente a 63% dos formandos do ensino médio estadual paulista).
Nas demais séries avaliadas os resultados são os seguintes:
- 4ª Série = 44% dos alunos abaixo do nível básico de conhecimentos em matemática. (Em 2005 os dados do Saresp demonstravam que 47% dos estudantes nesse nível não tinham conhecimentos básicos na área – ocorreu, portanto, uma pequena melhoria). 37% possuem apenas conhecimentos básicos em matemática; 17% conseguiram atingir o nível adequado na área e apenas 2% demonstram conhecimentos avançados.
- 6ª Série = 55% dos alunos abaixo do nível básico de conhecimentos em matemática. (Essa série não foi avaliada no SARESP de 2005).
- 8ª Série = 50% dos alunos abaixo do nível básico de conhecimentos em matemática. (Em 2005 os dados do Saresp demonstravam que 48% dos estudantes nesse nível não tinham conhecimentos básicos na área – ocorreu, nesse caso, uma pequena piora). 25% possuem apenas conhecimentos básicos em matemática; 4% conseguiram atingir o nível adequado na área e apenas 1% demonstra conhecimentos avançados.
- 3º Ano do Ensino Médio = Além dos 71% de estudantes abaixo do básico em matemática tivemos 25% com conhecimentos elementares (nível básico), 4% atingiram o patamar de saberes adequados a essa faixa etária e 1% demonstrou estar em nível avançado.
No que se refere a Língua Portuguesa os resultados são um pouco melhores, ainda assim preocupantes, a saber:
- Na 4ª Série = 21% dos estudantes não atingiram o nível básico de conhecimentos; 39% possuem dominam apenas os conhecimentos básicos da língua portuguesa para essa faixa etária; 35% obtiveram rendimento adequado e 6% foram, além disso, atingindo o patamar de conhecimento avançado em português.
- Na 6ª Série = 18% dos estudantes estão abaixo do esperado, não possuindo, portanto o domínio sobre conteúdos básicos; 45% atingiram apenas o nível básico em língua portuguesa; 34% demonstraram adequação de saberes nessa área e apenas 3% conseguiram chegar ao Olimpo, ou seja, demonstraram conhecimentos avançados.
- Na 8ª Série = 23% dos estudantes estão abaixo do nível básico; 47% consolidaram apenas os conhecimentos mínimos (nível básico); 24% atingiram os saberes adequados a essa série e, 6% mostraram possuir nível avançado em língua portuguesa.
- No 3º Ano do Ensino Médio = 40% dos alunos da rede estadual pública paulista estão abaixo do nível básico; 39% consolidaram apenas os conhecimentos mínimos em língua portuguesa; 21% demonstraram adequação à série e ninguém apresentou resultados qualificados como avançados (0%).
Por isso tracei no início desse texto uma ponderação sobre o recall das empresas do setor industrial, de serviços e comercial... Precisamos ter consciência da necessidade (urgente) de realizarmos expediente semelhante na educação... Que cidadãos são esses que estamos trabalhando para formar? Como podemos dormir com a consciência tranqüila se os dados de várias pesquisas e levantamentos revelam que os estudantes não atingiram, na maioria dos casos, o nível adequado de conhecimentos em áreas vitais como matemática e língua portuguesa (o que certamente influencia o desempenho e desenvolvimento em todas as demais áreas do conhecimento trabalhadas nas escolas)?
Não podemos mais ficar procurando culpados ou responsáveis pelo descalabro da educação em São Paulo e no Brasil. A hora é de ações que revertam em favor de melhorias rápidas e de eficiência no trabalho em nossas salas de aula. Somos todos responsáveis e, pautados no exemplo de outros setores, precisamos realizar uma consciente revisão de nossos procedimentos, recursos, práticas e ações em prol de real qualidade na educação brasileira. Não há mais tempo a perder... Do mesmo modo que carros defeituosos podem causar acidentes e mortes, educação de baixa ou nenhuma qualidade também causa grandes perdas e, até mesmo, a morte...