Diário de Classe
Somos Professoras da EMEE Anne Sullivan!
Elisete Oliveira Santos Baruel
Somos professoras da EMEE Anne Sullivan, uma escola especial da rede municipal de ensino de São Paulo, onde temos seis escolas para surdos e surdos com múltiplas deficiências.
Ao
lermos a versão preliminar do documento de
política nacional de educação especial
na perspectiva da educação inclusiva, passamos a
refletir sobre alguns pontos.
A inclusão é necessária, mas exige
esforço, tempo, ação,
mudança, diálogo e reflexão.
Inclusão exige cautela, estudo, flexibilidade na postura do educador, possibilidade de inovar e reconhecer-se aprendiz.
Incluir exige uma postura social e política de
comprometimento e cooperação entre as diferentes
esferas sociais.
Não aparece contemplada no documento a cooperação e a definição dos papéis das áreas da saúde, da cultura e da assistência social no importante processo da educação inclusiva.
Este documento é um avanço nas
questões da inclusão frente às
diversidades regionais tão grandes que enfrentamos no
Brasil, mas ao reduzir o atendimento dos surdos somente a uma
possibilidade (atendimento especializado no turno contrário
ao da escolarização) minimizam-se as perspectivas
de seu desenvolvimento e impede-se o exercício de seus
direitos lingüísticos e de sua liberdade de escolha.
Esta restrição das possibilidades de escolha dos
surdos também poderia se caracterizar como
discriminação segundo a
definição dada pela
Convenção da Guatemala (1999) citada no item 22
deste documento, uma vez que tendo os mesmos direitos humanos e
liberdades fundamentais que as demais pessoas o surdo tem o direito de
optar por diferentes tipos de atendimento escolar, inclusive a escola
bilíngüe - Decreto 5626/2005.
Existe uma necessidade real da manutenção das
escolas bilíngües para os alunos surdos para que
ocorra a verdadeira inclusão deles na sociedade, pois
é na escola bilíngüe que se asseguram as
condições necessárias a uma
educação de qualidade: para que o surdo possa se
constituir como sujeito há necessidade da
presença de seus pares lingüísticos no
seu processo de aquisição de língua e
de conhecimento.
A língua de sinais implica na identidade e na cultura desses
indivíduos, e não pode reduzir-se a uma
experiência de linguagem “vocabular”, mas
precisa ser de fato uma experiência comunicativa.
Daí a importância das crianças surdas estarem inseridas nas escolas bilíngües para aquisição e desenvolvimento da Libras.
A língua é compartilhada e, para o surdo,
é a língua que estabelece o quanto se consegue
compartilhar e estar inserido na sociedade e na cultura.
A experiência de vida modificada pela Língua de Sinais, torna-se uma experiência visual de mundo e produz manifestações culturais próprias que ocorrem no contato diário e constante com seus pares lingüísticos.
Por estas razões, na Educação Infantil
e nas séries iniciais, só a presença
do intérprete não garante a inclusão,
pois o aluno ainda não tem suas bases
lingüísticas construídas.
Acreditamos que as escolas bilíngües estão adequadas à política de inclusão na medida em que possibilitam o desenvolvimento lingüístico, cognitivo, crítico e criativo dos alunos surdos e que não são substitutivas da educação regular uma vez que a organização das EMEEs respeita as modalidades de educação infantil e ensino fundamental oferecendo a mesma escolarização da rede regular.
Participamos de todos os programas propostos para as escolas regulares
como: TOF, PIC, Mão na Massa, Formação
de Matemática, Orientação Sexual,
entre outros.
Como resultado do trabalho desenvolvido nas EMEEs , apresentamos nossas produções no livro” Projeto Toda Força ao 1º Ano – Contemplando as especificidades dos alunos surdos” ( www.educacao.prefeitura.sp.gov.br ).
Considerando essas especificidades do aluno surdo ressaltamos a
importância de que o processo de
alfabetização e letramento e
conseqüentemente o ensino da Língua Portuguesa na
modalidade escrita difere em muitos aspectos do aluno ouvinte uma vez
que para o surdo esse processo é
metalingüístico por
comparação e não
auditivo/sonoro.
Isso implica que há diferença na forma de ensinar a Língua Portuguesa para surdos e para ouvintes. A Língua Portuguesa e a Libras são línguas distintas com estruturas próprias e não podem ser usadas simultaneamente ou sobrepostas.
Deve-se considerar que a presença do intérprete não garante o sucesso do surdo no processo de alfabetização e letramento, pois somente a tradução da explicação do professor não é suficiente para que o surdo elabore hipóteses sobre a construção da Língua Portuguesa.
Na bibliografia apresentada no documento não foram citadas
referências aos trabalhos de pesquisa científica,
inclusive os subsidiados pelo governo, realizados nos
últimos 10 anos, na área da
educação de surdos.
O decreto 5626/2005 prevê no artigo 22 a organização de escolas e classes de educação bilíngüe, o que não foi considerado na elaboração deste documento.
A educação especial teve uma
trajetória semelhante à da
educação em geral, considerando-se sempre o que
é melhor para o educando conforme o momento social,
pesquisas e as teorias que fundamentam nosso trabalho.
As escolas de surdos estão trabalhando pela educação inclusiva, mas uma inclusão responsável e criteriosa que traga de fato benefícios e APRENDIZAGEM para TODOS.
Ana
Claudia Fossati Mota
Ana Cristina Camano Passos
Ana Luiza Pedroso de Lima
Ana Maria Reichert Zemann
Flavia Francisca Damascena