Universo Escolar
 

Educação: Fluidez e Complexidade - 31/07/2007
Coluna A voz do professor

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Nos anos 60 e 70, diversos autores procuraram dar conta das diversas mudanças na educação impelidas pela vertiginosa evolução da mídia. Os mídia-educadores (ou educomunicadores) vieram experimentar a mídia em sala-de-aula, ou em ambientes alternativos a ela, a fim de levar à educação o colorido que ela não teriam sabido acompanhar, tornando-se obsoleta.

Marshall McLuhan foi capaz de prever importantes mudanças na Escola, numa época em que ainda não se falava em uma convergência entre comunicação e educação. A visão do papa da comunicação chegou a perceber que as escolas dispensam, mais e mais, energias diversas, preparando os escolares para um mundo que já não existe. 

E antecipou que haverá um dia - talvez este já seja uma realidade - em que as crianças aprenderão muito mais - e muito mais rapidamente - em contato com o mundo exterior do que no recinto da escola. 

McLuhan também deu conta de que era necessário que a educação fosse permanente, abandonando a cultura do diploma, fechada num corpo de conhecimentos (LIMA, 1978). 

Felizmente, este educomunicador avant garde errou ao prenunciar que o professor desapareceria e que o livro daria lugar às publicações periódicas; mas é incontestável o quanto a informação abundante vem transformando o papel do professor e do livro.

Hoje, mergulhados no ciberespaço, estamos nos habituando à maneira de leitura não-seqüencial e fluida presente no hipertexto. A aparência do hipertexto pode, à primeira vista, ser fragmentada, mas devemos entendê-lo tomando a semântica o hibridismo internet (inter, do latim, reciprocidade; net, do inglês, rede). 

Segundo Pierre Lévy, a rede tem uma relação de interdependência, o que nos remete ao esforço de Edgar Morin e seu pensamento complexo. Morin defende que devemos abandonar o pensamento compartimentado, passando a fazer conexões (links) entre a parte e o todo, a buscar relações e inter-retro-ações entre cada fenômeno e seu contexto.

A ciência econômica é a ciência humana mais sofisticada e a mais formalizada - exemplifica Morin -; contudo, os economistas são incapazes de estar de acordo sobre suas predições, geralmente errôneas (MORIN, 2004). 

Tal erro acontece porque a economia é a ciência mais avançada na matemática e a mais atrasada humanamente. Morin quer, com seu pensamento complexo, reformar a cabeça cheia - aquela com o saber acumulado, empilhado, sem um princípio de organização e de seleção - e fazê-la bem-feita, dispondo ao mesmo tempo de uma aptidão geral para colocar e tratar os problemas e de princípios organizadores que permitam ligar os saberes e lhes dar sentido (Idem). 

A cabeça bem-feita esbarra num paradoxo para se efetivar como projeto global: para reformar o pensamento deve-se reformar a escola, mas como reformar a escola sem, antes, reformar o pensamento?

Um outro problema com a escola surge com aquela frase feita que diz: a escola prepara para a vida. O aluno que hoje deixa a faculdade, passou cerca de 20 anos de sua vida sendo preparado para um mundo que já não existe, pois é cada vez menor o período em que todos os conhecimentos são redesenhados. 

Esse anacronismo já foi apontado por McLuhan, que antecipou com sucesso o quadro de velocidade informacional que atingiria nossos dias, a celeridade das descobertas, das novidades tecnológicas etc.

Para as próximas gerações, necessitamos focar nossos esforços pedagógicos no processo, na busca de soluções comuns, na construção social do conhecimento e não mais nos conteúdos prontos, no conhecimento fechado. Focar no processo significa preparar o aluno para utilizar todos os mecanismos de pesquisa disponíveis e municiá-lo da memória rizomática da rede de computadores.

O sujeito, outrora centralizado, hoje fluido, passou a viver num processo contínuo de mutação, seja no relacionamento com o outro, seja na construção da própria identidade. E essa fluidez atravessa e é atravessada pela informática, que, conforme Pierre Lévy, não é uma tecnologia definida e sim um processo contínuo.

Essa metáfora da fluidez utilizada durante o texto foi criada pelo sociólogo Zygmunt Bauman para explicar o estágio presente da era moderna, designado por outros autores como pós-moderno.

Segundo ele a modernidade líquida se caracteriza pela extraordinária mobilidade e inconstância, pela ausência de dimensões espaciais claras. O sujeito educador precisa adquirir a dinâmica do mercúrio: encarnar uma forma mutável produtiva, que acompanhe a nova plasticidade mundial, mas com uma toxidez positiva, que contagie o aluno com o desejo e prazer pelo conhecimento em movimento.

Wendel Freire
Professor de Língua Portuguesa,
Especialista em Tecnologia Educacional e
Educomunicador de um jornal carioca.
E-mail: wendelfreire@gmail.com

Referências Bibliográficas
BAUMAN, Zigmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000.
LIMA, Lauro de Oliveira. Mutações em educação segundo McLuhan. 8ª ed, Petrópolis: Vozes, 1978.
MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.


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3 COMENTÁRIOS

1 Marcia R. S. do Vale - São Vicente
Gostei bastante do artigo e se me permitir irei usálo nos cursos de formação de professores. Um fato me chamou atenção, a bibliografia porque li praticamente todos os livros de Bauman e na sequência da Modernidade Líquida leia o Amor Líquido, é fascinante para entender o ser humano
07/05/2009 00:44:01


2 Amanda Santos - Rio de Janeiro
Parabéns, adorei o artigo.
16/08/2007 19:18:32


3 Wendel Freire - Rio de Janeiro
Leia-se, por favor, "teria sabido acompanhar" na quarta linha do primeiro parágrafo e "do hibridismo" na terceira linha do terceiro parágrafo.
03/08/2007 20:57:26


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