Missing - O Desaparecido -
Nos porões da Ditadura
A América Latina dos anos 1960 e 1970 foi palco de grandes pesadelos. Os atentados contra a liberdade ocorriam todos os dias. A Democracia viveu seu ocaso, jamais fora tão desprezada quanto naquela época. Os setores politizados e conscientes de cada um dos países afetados por ditaduras brutais como o Brasil, a Argentina e o Chile, lutavam como podiam, na maior parte dos casos na clandestinidade ou no estrangeiro. Os que continuavam a pleitear abertamente seus direitos em seus próprios países eram perseguidos, torturados e mortos. Os porões das ditaduras desses países contavam com aparatos sofisticados que faziam com que declarações bombásticas e segredos fossem contados a custa de muito sangue, muita dor e grandes humilhações.
Os presos políticos que conseguiam escapar de toda a violência física e psicológica a que eram submetidos acabavam sendo perseguidos pelo resto de suas vidas pelos fantasmas relativos a todo o sofrimento pelo qual haviam passado nos dias em que estiveram nas garras dos órgãos repressores (Que tal dar uma lida no relato "Brasil Nunca Mais", há detalhes aterradores do que aconteceu a várias pessoas que foram submetidas a condições nefastas no cativeiro da ditadura brasileira; situações muito semelhantes ocorreram nos outros países da América do Sul). Seus parentes e amigos mais próximos, depois de semanas ou meses de medo e de falta de informações sobre o paradeiro de seus filhos, cônjuges, pais ou mães, carregavam consigo a insegurança e, na falta de opções, acabavam abandonando suas pátrias (Lembram-se do infame adesivo colado no vidro dos carros com os dizeres "Brasil, Ame-o ou Deixe-o"?).
Imaginem então como devem ter se sentido as Mães da Plaza de Mayo da Argentina. Elas não puderam viver o reencontro com seus filhos. Eles estão entre os desaparecidos. Essa mesma situação foi vivida por famílias brasileiras e chilenas naquela mesma época.
A premissa do filme do diretor Costa-Gravas, "Missing - O Desaparecido" é justamente essa. Os pais de um jovem norte-americano chamado Charles Horman (John Shea), que vivia no Chile de Salvador Allende deslocam-se para esse país a procura de seu filho, militante da esquerda, que desapareceu entre centenas de outras pessoas na época do golpe militar que colocou o general Pinochet no poder. O mais interessante é notar que não se trata de uma ficção, tentando nos apresentar o que de mais brutal aconteceu em uma das várias "republiquetas cucarachas" exportadoras de matérias-primas para enriquecer o Tio Sam. A história desse desaparecimento é verdadeira. E o desaparecido era um norte-americano.
Existem vários documentos que foram apresentados recentemente ao grande público através da imprensa internacional que comprovam a participação dos Estados Unidos nos golpes militares direitistas que ocorreram no quintal dos "Ianques". O que surpreende em relação ao caso relatado no filme de Costa-Gravas é o fato de um cidadão da pátria da liberdade ter sido vítima de uma conspiração programada e executada com o auxílio do próprio governo dos EUA.
Quando Ed Horman, o pai do desaparecido (Jack Lemmon, em um de seus grandes papéis) junta-se a jovem esposa Beth Horman (Sissi Spacek, atriz de talento reconhecido, que despontava para o estrelato) e retoma os caminhos que seu filho trilhou antes de desaparecer, busca assim fazê-lo contando com o apoio dos órgãos governamentais norte-americanos. Na medida em que esse apoio não é dado de forma adequada e, pelo contrário, o que deveria ser um ponto de apoio se torna um obstáculo, Ed começa a perceber que "há algo de podre no reino da Dinamarca" e que, há fortes indícios de que Tio Sam poderia ter contribuído para a subida de Pinochet e a queda do governo socialista de Allende.
A cada nova descoberta, novos indícios e o horror de se confrontar com um país em frangalhos, totalmente descaracterizado, com o povo amedrontado e o toque de recolher impondo as noites chilenas um autêntico ar de fim dos tempos. A visita ao Estádio Olímpico é arrepiante, Ed e Beth trafegando entre corpos em busca de Charles e tendo a oportunidade de sentir todo o terror que havia se instalado entre os chilenos constitui seqüência marcante desse grande thriller político. O desfecho dessa tocante história em que a família se confronta com o estado, confirma o destino trágico que se encerra em toda a brutalidade que envolve a história da América Latina dessa época. Vale cada minuto, tem que ser assistido!
Um filme como "Missing" é peça fundamental para que possamos entender um pouco do que viveram chilenos, argentinos e brasileiros (assim como todos os povos que tenham passado por ditaduras ferozes, de direita ou de esquerda); nos abre os olhos para a participação norte-americana nesses eventos; apresenta-nos a atmosfera da Guerra Fria, que se não detonou a destruição nuclear, atacou inocentes nas mais variadas partes do planeta para garantir "aliados" e mercados nem que para isso fosse necessário matar pessoas inocentes, acabar com as liberdades democráticas, separar famílias, destruir a cultura de certos povos e rasgar as leis locais (para não lembrar da dignidade dessas nações!).
Referência forte para aulas de história, geografia e filosofia, principalmente no tocante a discussão sobre os Direitos Humanos, "Missing" também pode ser usado em aulas de redação ou português como elemento de composição de idéias e argumentos. A título comparativo, vale a pena dar uma olhada em outros títulos disponíveis em vídeo como "Pra frente Brasil", "Chove sobre Santiago", "A História Oficial" ou ainda "O que é isso, Companheiro?".
Ficha Técnica
Missing - O Desaparecido
(Missing)
País/Ano de produção:-
EUA, 1982
Duração/Gênero:- 122
min., Thriller político/drama
Disponível em vídeo
Direção de Costa-Gravas
Roteiro de Costa-Gravas e Donald Stewart
Elenco:- Jack Lemmon, Sissi Spacek, John
Shea, Melanie Mayron.
Links
- http://us.imdb.com/Title?0084335 (em inglês)
1 Bernadete Meneghetti Pase - Porto Alegre RS
O filme que mais me marcou na vida. É de uma plasticidade, de uma delicadeza pra tratar de um assunto tão áspero: a Ditadura no Chile! Recomendo!
24/10/2012 17:44:45
2 Edson Geraldo Ferreira BarbacenaMG. - Barbacena / MG.
O melhor filme do genero . Fato Real .
14/11/2008 20:43:32
3 David - AL
Ótimo filme... nunca me canso de assistir... e ouvir o tema de Vangelis!
10/11/2008 15:27:22
4 marcos alonso - são paulo sp
Assistí o filme nos anos 80. É um dos raros filmes sobre o golpe no Chile. O diretor é um dos grandes mestres do chamado cinema político. Como eu posso fazer para locálo ou adquirílo.
29/09/2008 22:06:40
5 Alessandro de Andrade Silva - Osasco Sp
filme interessante
15/05/2007 11:23:34
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