A Semana - Opiniões
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

A educação em construção - 11/10/2006
A reforma começa nos alicerces...

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Não se começa a construir uma casa pelo telhado. Se não temos os pilares que irão sustentar o madeiramento, como poderemos erigir a cobertura do imóvel? E, por sua vez, para que os pilares e as paredes possam ser erguidos, temos que fazer a fundação e os alicerces. A construção das bases dessa edificação inicia-se com a preparação do terreno e a escavação da terra para que se criem sólidas colunas sustentadas por concreto preparado com materiais selecionados.

Antes de tudo isso começar ainda temos uma etapa prévia de fundamental importância em que se prevê a necessidade e/ou o desejo da construção para que, em seguida, se estabeleça todo um processo de estudos e planejamento. Qualquer obra que se inicia tem como princípio uma relação estabelecida entre pessoas. Definem-se interesses, referendam-se acordos, selam-se destinos...

Ao nos referirmos à educação e aos planejamentos na área, devemos pensar que qualquer acordo feito deve levar em conta que os interesses em questão mobilizam e afetam as vidas de inúmeras famílias (que compõem comunidades bastante amplas) e que, consequentemente, os destinos selados a partir desses investimentos e realizações definem não apenas a sorte dos indivíduos formados nessas escolas, mas também o futuro de todo o país...

As eleições permitem que pensemos e repensemos as possibilidades do sistema educacional estabelecido e que vislumbremos mudanças necessárias tanto quanto a manutenção das conquistas que nos valeram vitórias expressivas no setor.

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Temos que investir mais na base do sistema educacional.

Ao iniciarmos esse editorial abordando a construção de uma casa ou de um prédio, remontando as etapas necessárias a essa edificação no sentido oposto ao de sua ordem lógica, temos como propósito criticar os investimentos que estão sendo feitos em larga escala no 3º grau sendo que, como contrapartida desses gastos, somas aquém das necessidades são destinadas à educação infantil e ao ensino fundamental.

Sintetizando a comparação podemos dizer que estamos construindo as casas a partir do telhado no que se refere a educação. Ao destinarmos valores dez vezes maiores para o ensino superior em comparação com a educação infantil e o ensino fundamental estamos formando gerações que têm dificuldades para ler, escrever ou calcular e esperamos que (como num passe de mágica), em função dos nossos investimentos no 3º grau, nossas crianças e adolescentes se tornem profissionais competentes, sérios e capazes de competir em pé de igualdade com os países mais desenvolvidos.

Se a aprendizagem sofreu prejuízos nas etapas iniciais do processo educacional essas avarias causarão problemas futuramente tanto para quem as vivenciou quanto para todo o país. A equação é simples, basta apenas pensar que pessoas que lêem e escrevem pouco por não terem sido preparadas corretamente para o exercício dessas atividades dificilmente irão ter tempo, apoio, estímulo e chances de corrigir seu plano de vôo...

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Os investimentos e projetos em educação infantil e fundamental
têm que ter continuidade e estar acima dos interesses político-partidários.

Sempre hão de pensar tais pessoas penalizadas pela inversão das prioridades educacionais brasileiras que os ciclos de aprendizagem em que deveriam ter assimilado tais conhecimentos foram ultrapassados e que “correr atrás do prejuízo” em questão irá lhes tirar o foco quanto às prioridades do momento presente que estão vivenciando. Poucos são aqueles que se mostram propensos a dar um passo para trás para que possam logo em seguida dar dois para frente...

Aumentar o ciclo do ensino fundamental em mais um ano não irá resolver o problema. Colocar dois professores em sala de aula para dar um suporte ainda maior para os estudantes também não. Cargas horárias adicionais de mais duas, três ou quatro horas diárias igualmente não é a solução. Não se pode pensar em alternativas miraculosas que coloquem o Brasil no rumo certo da noite para o dia.

Investimentos em educação têm que ter continuidade e partir de estudos sérios e profundos da realidade, das possibilidades, dos exemplos vitoriosos, dos erros grosseiros e das perspectivas internacionais. Não é possível que os governos se alternem a cada quatro anos e que comecem tudo novamente do zero apenas porque as realizações do passado são atribuídas a outros governantes ou partidos políticos.

Acima de qualquer bandeira política devem ser prezados o Brasil e o futuro de sua população. As políticas educacionais devem estar acima de partidarismos e ter perenidade quando bem sucedidas sem que tal ou qual político possa faturar com os dividendos de suas realizações bem sucedidas na área educacional. Os governantes se sucedem e se vão com o passar dos anos enquanto os problemas nacionais não são solucionados e continuam a dificultar a vida de milhões de pessoas em nosso país.

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As famílias têm que auxiliar a escola no processo de
ensino-aprendizagem estimulando a leitura e o estudo ao
mesmo tempo em que acompanham e orientam seus filhos.

Podem dizer os astutos dirigentes políticos de nossa nação que a taxa de analfabetismo tem baixado, que a repetência diminuiu ou ainda que a evasão praticamente foi zerada. De que adianta tudo isso se o ensino não tem sido bom o suficiente para que nossos estudantes sejam efetivamente qualificados em matemática, português ou ciências? Estamos sempre entre os últimos colocados nos testes mundiais que avaliam o desempenho dos países nesses quesitos.

Não é à toa que a produtividade de coreanos, chilenos ou espanhóis é maior que a dos brasileiros mesmo quando comparados indivíduos que têm um mesmo grau de estudos. A base mal formada compromete de forma considerável a compreensão, análise, interpretação e desestimula a criatividade. Estudar para os brasileiros é, na esmagadora maioria dos casos, um fardo e não uma satisfação. Nem mesmo as famílias parecem dispostas a reverter essa negativa perspectiva quanto a educação...

Quando consideramos isso entendemos que há alguma coisa de errado e que, pintar a escola de azul ou vermelho, trocar carteiras e lousas, colocar computadores e livros nas escolas ou aumentar a quantidade de anos e horas de estudo são realizações inócuas, de pouco ou nenhum efeito.

Reformular a educação infantil e fundamental, dando a ela subsídios das práticas vitoriosas de escolas nacionais e internacionais é o passo inicial para que reformas reais ocorram nas escolas brasileiras. Professores bem remunerados, estimulados a atualizar seus conhecimentos e que sejam avaliados quanto a sua produtividade e realizações desde o trabalho nessas faixas etárias também é prática mais do que necessária.

O universo educacional na educação infantil tem que ser objetivo, prático e lúdico. Qualquer educador que se preze sabe disso e recorre a Piaget ou Vygotsky para referendar tais afirmações. O problema real é que temos que superar o discurso e implementar essa prática nas salas de aula. Diga-se de passagem que tais elementos inerentes à educação infantil (objetividade, ludicidade e praticidade) não devem ficar restritos a essa faixa etária. Podem e devem também ilustrar e orientar atividades e estudos no ensino fundamental e até no médio...

O aumento da carga horária e o acréscimo de um ano ao ciclo do ensino fundamental só passam a funcionar quando respaldados por profissionais que estejam mais e mais engajados no trabalho em sala de aula. Nesse sentido os educadores devem não apenas ir aos cursos que lhes permitam aperfeiçoamento, mas também têm que participar ativamente dos mesmos e se propor a utilizar os novos conhecimentos adquiridos nas escolas em que trabalham.

Como palestrante, vejo professores que estão nos recintos em que apresento oficinas e seminários apenas para cumprir as horas determinadas pelas secretarias de educação de seus municípios ou estados. De que adianta isso? Quem eles pensam estar enganando? Os reais lesados nessa situação são os alunos e toda a comunidade, para não dizer o próprio país...

Está na hora de efetivar políticas educacionais de longo prazo, a prova de interesses eleitoreiros, contando com o envolvimento mais intenso possível por parte dos educadores e da comunidade, respaldados por planos e estudos bem fundamentados e que contem com alicerces sólidos e duradouros. Só assim iremos erigir escolas para o futuro que não desabarão em função de qualquer pequeno tremor de terra...

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