Aprender com as Diferenças
Ana Paula Crosara de Resende Advogada, reside em Uberlândia, Ministra Aulas em Cursos de Extensão e de Especialização. Responsável pelo Quadro Semanal “De Igual para Igual”, as terças-feiras, das 11h às 12h, na Rádio Universitária da Universidade Federal de Uberlândia. O quadro faz parte do Programa “Trocando em Miúdos”, um jornalístico de entrevistas e debates sobre assuntos da atualidade e de interesse da comunidade. Site da Rádio: http://www.universitariafm.ufu.br/ e sua freqüência é 107, 5 MHz

Conhecer a legislação influi na prática de um mundo inclusivo - 17/07/2006
Ana Paula Crosara de Resende

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As pessoas com deficiência fazem parte do conjunto da população e também estão sujeitas, no Brasil, a todas as normas que regem a sociedade brasileira.

Entendemos que, antes de tratarmos sobre legislação para as pessoas com deficiência, é necessário, contextualizar e enfatizar os princípios legislativos que valem para todos, a fim de se buscar a plena cidadania e conseguirmos influenciar na prática de um mundo inclusivo.

Isso se justifica na medida em que não se separa este segmento social dos demais e se cria, no imaginário coletivo, a inclusão e a visualização de uma efetiva participação, sem distinções.

Muitas vezes somos desrespeitados por não sabermos ou não estarmos equipados com as mesmas garantias de todos os cidadãos. Por exemplo, quando um estabelecimento comercial não permite o acesso de uma pessoa com deficiência física em cadeira de rodas, por estar cheio de escadas, ele fere o direito da pessoa de ser tratada igualmente aos demais consumidores brasileiros, pois o problema é a escada e não a sua presença, além de estar impedindo o consumo de forma adequada.

Essa situação também é válida quando as pessoas com deficiência visual são consideradas incapazes de responderem por suas respectivas contas bancárias – isso é defeito no fornecimento do serviço bancário.

É claro que não estamos propondo "vivermos de indenizações", até porque, pessoalmente preferimos o caminho da Educação, mas a proposta é que as pessoas precisam saber quais são os Princípios Fundamentais do Estado Democrático de Direito do Brasil, para terem esta visão de conjunto, inclusive às pessoas que não vivem sob os efeitos de uma deficiência.

Com isso queremos ainda ressaltar que existem direitos e obrigações que são para todos, além de reforçar a tese que as pessoas com deficiência fazem parte de um projeto comum que é a busca de equiparação de oportunidades e do espaço individual de cada um, na condição de protagonistas de suas próprias vidas.

Especificamente, falando sobre o ordenamento jurídico brasileiro é importante esclarecer que todos os seus fundamentos estão registrados na Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, bem como nas Emendas Constitucionais posteriores.

Todas as demais normas federais, estaduais e municipais, sejam leis complementares, leis delegadas, leis ordinárias, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções, instruções normativas, atos administrativos, etc., não podem ser dela dissonantes.

Por termos uma Constituição Rígida, os procedimentos para sua alteração são rigorosos, exigindo-se, por exemplo, quorum qualificado e aprovação em dois turnos pela Câmara Federal e pelo Senado, mas no que tange aos direitos e garantias fundamentais as alterações são proibidas, nos termos do artigo 60, § 4o da Constituição Federal.

Quando lidamos apenas com os artigos que tratam das pessoas com deficiência limitamos nosso campo de visão/atuação, segregamos várias possibilidades e reforçamos preconceitos, posto que antes de termos uma deficiência, somos cidadãos brasileiros e a deficiência é mais uma característica dos seres humanos que somos.

Não queremos viver em guetos e da mesma forma a legislação não pode ser vista como compartimentos separados para cada situação, pois a base é (ou deveria ser) a mesma.

Portanto, quando formos analisar qualquer parte da legislação devemos começar pelos Princípios Fundamentais e os Direitos e Garantias Fundamentais, previstos nos artigos 1o a 5o da Constituição da República Federativa do Brasil.

No Art. 1º apresenta-se o nome completo do nosso país, qual seja a República Federativa do Brasil, determina a existência de uma democracia de fato, não só com eleições, mas com liberdade de expressão e com normas legais aplicáveis a todos.

Seus fundamentos são soberania; a cidadania – algo a ser construído como inerente aos direitos humanos; a dignidade da pessoa humana; uma vez que sem dignidade um ser humano não pode ser assim considerado e dignidade inclui respeito por suas peculiaridades; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e o pluralismo político.

Continua no parágrafo único assegurando que todo o poder, seja do legislativo, executivo ou judiciário, emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. – E esse povo somos nós, inclusive você.

Isto também significa que tudo o que for feito no Brasil tem que ter como alicerce esses princípios, sob pena de se tornar inconstitucional.

Já o Art. 3º diz que constituem objetivos fundamentais do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV – bem como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Com essa leitura fica fácil identificarmos muitas de nossas lutas específicas com e para as pessoas com deficiência e também quão inconstitucionais se tornam certas práticas que vivenciamos diariamente.

O Art. 5o determina:

Art. 5o – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Para a análise deste princípio constitucional, é importante salientar que o direito à igualdade é tido como regra de equilíbrio com relação às pessoas com deficiência, já que a realidade mostra que dificilmente se consegue equiparar as condições da vida de que tem uma deficiência, que vive em condições resultantes da mencionada deficiência.

É unânime o entendimento de que esse princípio atinge não só os cidadãos perante a lei, mas também a própria norma. Ou seja, o princípio está destinado tanto ao legislador quanto ao aplicador da lei.

Isso significa que as desequiparações fortuitas ou injustificadas, são, em virtude do princípio da igualdade, vedadas.

Sabemos que a igualdade entre as pessoas é uma ficção jurídica, pois no mundo dos fatos nenhum indivíduo é exatamente igual a outro.

No entanto, o caput do artigo 5° da Constituição da República Federativa do Brasil, ao determinar que “todos são iguais perante a lei”, deixa claro que os interesses, bem como as relações entre as pessoas, devem ser pautadas pelo equilíbrio entre elas.

Especificamente, o ordenamento constitucional em vigor, distinguiu as pessoas com deficiência para que as nossas necessidades específicas sejam consideradas, mas apenas no que se refere às características que nos distinguem dos demais cidadãos e depois de supridas estas necessidades, quaisquer diferenciações serão tidas como privilégio ou preconceito e ambos são proibidos.

Contudo, na prática, notamos que “uns são mais iguais que outros” mesmo contrariando os objetivos fundamentais da República.

Isso, porém, não significa que não exista norma válida, em vigor e com eficácia plena para a proteção e eliminação dessas desigualdades, basta organização, atuação e disposição da sociedade civil para concretizar a previsão legal e influenciar a implementação de políticas públicas.

E para isso, é fundamental a disseminação de informações, a um maior número de pessoas possíveis, para que o conhecimento seja um agente transformador de nosso tempo. Para que a História não nos cobre é que justificamos que a difusão das normas citadas, estejam à disposição da população.

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1 COMENTÁRIOS

1 DELIO PEREIRA JUNIOR - Governador Valadares/MG
Dois trechos do texto me chamou a atenção, principalmente pelas notícias veiculadas pela imprensa (escrita, falada e televisada), nos últimos anos. O primeiro trecho é: "Sabemos que a igualdade entre as pessoas é uma ficção jurídica, pois no mundo dos fatos nenhum indivíduo é exatamente igual a outro." e o segundo trecho é: "Contudo, na prática, notamos que “uns são mais iguais que outros” mesmo contrariando os objetivos fundamentais da República.". Em minha opinião, no Brasil, não há mais a "isonômia" e também a "igualdade" determinada pela Carta Magna vigente. Os iguais são tratados de acordo com as suas igualdades e os desiguais de acordo com as suas desigualdades, principio este previsto na mesma Carta, se não estou enganado. Veja que aos Deputados ( os "mais iguais que os outros") há aumento salarial de vinte e oito por cento e aos aposentados, que recebem valor maior que o salário minimo, apenas cinco por cento, como também aos servidores públicos foi concedido apenas zero virgula zero um por cento de aumento em seus salários, recentemente. Disse um dos Deputados (não me lembro o nome deste) que não se trata de aumento, mas apenas da "reposição das perdas". Ora e as perdas sofridas nos últimos anos pelos aposentados e servidores públicos, como ficam? Na hora de votar os aumentos a estes últimos, não se fala em "reposição das perdas", mas em aumento dos salários e dos valores a serem percebidos pelos aposentados. É uma bricadeira o tratamento oferecido pelos Deputados Federais aos brasileiros que os elegeram. Foi fazer uma referência à um ditado popular, porém com reparos: "Para mim tudo (Deputados Federais e Estaduais), aos brasileiros nada ou o que for possível". Devemos, pois, fazer o que trata o final do texto da Advogada Ana Paula, divulgar as normas vigentes para que a população passe a conhecer melhor seus direitos e com a finalidade de fazer faler tais direitos. Eis a minha opinião.
20/05/2007 12:22:05


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