Tente outra vez - 05/06/2006
Reclame menos, trabalhe mais
No último final de semana voltei às aulas. Tive um recesso forçado, pois quebrei a mão e não podia trabalhar em virtude de licença médica. Estava com saudade da sala de aula. Sinto que toda vez que entro em férias, no finalzinho desse período, vem aquela vontade de voltar ao centro das atenções na escola, trabalhando conceitos, idéias, práticas e propondo aos estudantes que estudem, cresçam, se aperfeiçoem e também que nos ensinem muitas coisas...
Dei aula no sábado. Não dentro dos cursos regulares nos quais atuo, mas numa substituição dentro de uma disciplina de pós-graduação. Levei para esses estudantes um pouco da minha experiência e dos estudos que tenho desenvolvido no uso do cinema e das tecnologias de informação na sala de aula.
Para a realização desses encontros utilizei filmes, apresentações em PowerPoint, trechos de textos selecionados, músicas e estabeleci um diálogo com os estudantes para que pudéssemos aproveitar o máximo possível a oportunidade que tínhamos pela frente.
Queria deixá-los animados com as informações que trazia comigo. Mesmo sabendo que essas questões têm sido discutidas pelo Brasil afora em maior ou menor grau, acredito que possa dar uma contribuição interessante a partir dos conhecimentos que tenho obtido em meus estudos e também relacionados às minhas práticas de ensino e trabalho em educação.
O professor é a principal força de renovação da educação. Se ele não se
dispuser a realizar essa transformação do trabalho nas escolas é
quase certo que a educação continuará a mesma...
Apesar de se mostrarem cooperativos e até mesmo de participarem com algumas afirmações e opiniões, tive a impressão de que o grupo estava um pouco desanimado. Pensei que talvez o assunto em questão não fosse tão pertinente aos seus olhos relativamente ao curso que faziam. Imaginei que poderia estar deixando a desejar com minhas explanações e com o desenvolvimento das atividades previstas (apesar de estar me sentido confiante e preparado para esse encontro).
Como esses estudantes estão no último módulo do curso, entregando trabalhos finais e terminando os compromissos assumidos para esse período de um ano e meio de aulas, presumi que talvez estivessem um pouco cansados...
Logo após o encerramento do primeiro tempo desse encontro, tive a oportunidade de conversar com alguns deles num breve intervalo antes do reinício das atividades no período da tarde (estivemos juntos de manhã quando apresentei a eles a relação entre o cinema e a escola e voltamos à tarde para discutirmos o uso das tecnologias de informação no contexto educacional).
Nesse bate-papo informal os estudantes apresentaram algumas queixas e se mostraram insatisfeitos com o andamento do curso. Reclamaram que não tiveram o retorno que esperavam. Disseram que as aulas não estiveram à altura daquilo que previam mediante o investimento (de tempo, dinheiro e empenho) que fizeram.
Perguntei a eles se haviam conversado sobre o tema com os professores do curso ou com os organizadores. Disseram a mim que não sentiram que haveria receptividade para suas queixas e reclamações. Argumentei então que os professores devem (ou pelo menos se espera isso) sempre estar prontos para ouvir os alunos, quanto aos problemas do curso e também no que se refere aos eventuais elogios. Complementei dizendo que para que a conversa seja produtiva em casos como esses é necessário que os argumentos sejam sólidos e representativos.
Se a dúvida existir devemos nos manifestar. Se há percalços e problemas,
temos que demonstrar nosso descontentamento. O diálogo deve imperar
na sala de aula e na escola como um todo, caso contrário não há
possibilidades reais de crescimento para a educação.
Também conversei com alguns dos professores do curso sobre o assunto. Queria ouvir os dois lados e, se possível, ajudar de alguma forma. Quem sabe um olhar externo, de visitante, pudesse auxiliá-los...
Ao escutar os professores tive a sincera impressão de que tentaram fazer o melhor que podiam. Não acharam justas e corretas as críticas recebidas dos estudantes. Pensam que faltou aos alunos um pouco mais de comprometimento com o curso. Era o que esperavam de pós-graduandos, vindos de outras cidades, que tinham uma jornada dura de trabalhos sendo realizadas durante os finais de semana...
Fiquei com a certeza de que era necessário um diálogo mais freqüente entre professores e alunos, extrapolando as questões relativas aos conteúdos trabalhados no curso. Pensei também a respeito da necessidade de revisão de posturas pessoais por parte dos educadores e dos estudantes. Acredito que isso seja muito importante.
Mudar nesse caso significa ser capaz de receber críticas e reclamações com menos resistência. A propósito, é de fundamental importância que ambos os lados envolvidos nessa, ou em qualquer pendência dentro do ambiente educacional, devem se posicionar, apresentar suas dificuldades, sentir-se a vontade para falar sobre os problemas da sala de aula e dos cursos em que estão envolvidos.
Em educação devemos atuar como numa equipe esportiva. Há os treinadores
e os atletas, todos objetivam a vitória e se entre eles não houver diálogo
e compreensão é pouco provável que o pódio seja atingido.
Todos têm que remar na mesma direção, de forma sincronizada...
Podemos e devemos criticar. Não há nada de errado nisso. O que não devemos deixar de fazer é tentar outra vez, redirecionar nossas ações, modificar nossos planos. Não podemos deixar de fazer a nossa parte, seja criticando ou mudando nossas posturas pessoais e profissionais.
Se o curso em que você está matriculado não condiz com aquilo que você esperava, faça as devidas críticas, reclame a quem tem que ouvir suas queixas, cobre mudanças e atitudes novas dos organizadores do curso e dos professores também. Não deixe apenas que os deslizes ou descaminhos do curso sejam perpetuados porque você também se acomodou e prefere apenas falar dos erros a se mobilizar em relação a eles...
E quando falo em mobilização penso não apenas na formalização da reclamação ou da queixa. Faça sua parte, trabalhe mais (mesmo porque os erros dos outros demandam da sua parte atitudes renovadoras e propositivas, capazes de superar falhas alheias). Estude mais, leia mais, pesquise muito mais. Procure alternativas nas bibliotecas, na Internet ou converse com outros professores. Não deixe que a sua formação seja prejudicada se você não concorda com a forma como as coisas estão sendo conduzidas...
Tive que fazer isso em relação a algumas disciplinas de minha graduação em História. Em alguns casos específicos tive que literalmente “correr atrás” de referências e materiais relativos a disciplinas importantes daquele curso, como História Antiga ou História do Brasil Republicano. Parte do prejuízo do curso teve que ser compensado no exercício profissional, com estudos sendo realizados na estruturação e planejamento de minhas próprias atividades como educador.
Fiz, em companhia de meus colegas da graduação, as críticas que achávamos consistentes e necessárias para o aperfeiçoamento do curso diretamente aos nossos professores. Em alguns casos tivemos melhorias significativas, em outros pouca coisa ou nada mudou. Em todos eles notamos, entretanto, que a postura madura dos alunos fez a diferença com a compensação das perdas através de leituras, grupos de estudo ou outras estratégias adotadas individualmente.
No caso dos professores, acredito que sempre temos que rever nossos planos de trabalho e estratégias. Não devemos nos acomodar mesmo quando atingimos resultados muito expressivos e satisfatórios em nossas práticas pedagógicas. Ao nos acomodarmos estamos entrando num estado de “coma” quase profundo, pois nos imobilizamos, desprezamos os avanços ao nosso redor, fingimos desconhecer as diferenças entre os grupos de estudantes com os quais trabalhamos...
Como dizem, chegar ao topo é difícil, muito mais complicado é se manter lá em cima...
Aos professores compete a renovação da educação. E esse exercício é uma constante. Renovar não significa desprezar tudo aquilo que foi construído e trabalhado. Não, não é isso. Sopros de renovação acontecem mesmo quando usamos o que nos parecem ser fórmulas clássicas. Ocorrem por que damos ao passado novas roupagens, mais adequadas ao que nos é contemporâneo. E, ao mesmo tempo, temos que estar abertos para que a essas releituras se juntem os frutos de nossa criatividade e de nossa capacidade de recriar o mundo...
É, espera-se muito de nós professores...
Tanto estudantes quanto educadores têm que sempre se dispor a arregaçar as mangas, trabalhar mais, reclamar quando for necessário, mas fundamentalmente superar as expectativas ao afirmar sua presença pela capacidade de não apenas proferir palavras que maculam imagens e projetos e sim de sempre tentar outra vez em busca daquilo que seja melhor para si e também para todos...
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