Educação para o Pensar
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

ENEM: Números revelam perfil social dos candidatos - 24/01/2018
João Luís de Almeida Machado

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educação, políticas públicas

Levantamento realizado pelo jornal O Estado de São Paulo publicado no dia 14 de janeiro de 2017 apresenta dados sobre os candidatos ao ENEM de 2016 e demonstra resultados melhores dos homens em relação as mulheres entre aqueles que atingem as notas mais altas. A proporção, conforme demonstrado na pesquisa é de, aproximadamente, 7 notas altas para os jovens do sexo masculino em cada 10 avaliações auferidas. Em dados percentuais os resultados firmam que 72% das 1000 melhores notas do ENEM são deles enquanto somente 28% foram obtidas por elas.

O dado é ainda mais relevante quando ficamos sabendo que as mulheres são maioria no exame, equivalendo naquele exame a 57,4% do total de participantes que, na totalização dos números do exame de 2016 constituíam um montante de 2,7 milhões de jovens do sexo feminino. Os homens, naquela edição do ENEM, foram 2 milhões, que representavam 42,6% do total de participantes.

Exames similares aplicados em nações como Finlândia e Estados Unidos já não apresentam diferenças significativas de rendimento entre homens e mulheres. Isso ocorria no início da aplicação destas avaliações, por volta da virada do século, quando se tornaram regulares em diversos países, mas a constatação da diferença de rendimento fez com que estes países passassem a oferecer ações e programas que tinham como objetivo permitir as meninas que fossem melhorando seus resultados nas áreas em que apresentavam maiores dificuldades.

Quando o recorte feito nesta pesquisa foca na diferença de rendimento por áreas do conhecimento o que se percebe é que a menor variação acontece em Linguagens e Códigos, quando as notas deles atingem o patamar médio de 529 pontos e o delas fica muito próximo, na casa dos 524,4 pontos.

Por outro lado, em Matemática é que o rendimento é o mais desigual, com a diferença de pontuação chegando a 41,8 pontos. Eles obtêm, em média, 495,2 pontos contra 453,4 pontos delas.

Em Ciências da Natureza e Humanidades as diferenças ficam na casa dos 20 pontos. A média dos meninos em Física, Química e Biologia atinge 479,5 pontos contra 455,2 das meninas. Um desnível de 24,3 pontos. Em História, Geografia, Sociologia e Filosofia os estudantes do sexo masculino atingem uma média de 552,9 pontos contra 531,3 obtidos pelas concorrentes do sexo feminino.

A pesquisa enfocou, também, as diferenças de resultados obtidos por etnia, comparando os resultados de brancos e negros e, detalhando ainda mais este quesito ao avaliar também esta variável a partir do gênero dos participantes.

Em todos os casos os piores resultados médios foram aqueles obtidos pelas jovens negras. Em Matemática foi verificada a pior diferença, de mais de 81 pontos, entre os estudantes brancos do sexo masculino em relação as jovens negras do sexo feminino. A menor variação obtida foi constatada em Linguagens, com 29 pontos separando novamente os mesmos participantes, ou sejam, meninos brancos de meninas negras.

A pesquisa constatou, ainda que os estudantes que obtiveram as melhores notas do ENEM em 2016 estudaram em sua maioria em escolas particulares (86,5% do total) enquanto poucos entre estes se formaram em instituições públicas (8,1%). Alguns tiveram formação mesclada, ou seja, estudaram em escolas privadas e públicas ao longo de sua jornada educacional (4,4%).

Poucos estudantes que fizeram o ENEM e obtiveram resultados tão expressivos, entre os 1000 melhores do país em 2016, estavam trabalhando (somente 5,9%), alguns já haviam trabalhado, mas na época da prova não estavam empregados (7,8%) e, a maioria só estudava (86,3%).

Um fator bastante relevante percebido neste levantamento se refere ao fato de que a escolaridade da mãe, levantada juntamente aos melhores participantes da prova do ENEM, no caso de 75,7% deles, era de nível superior (40,9%) ou pós-graduação (34,8%). Entre os demais, 19,1% tinham mães com Ensino Médio completo e, somente 5,2% com escolaridade inferior a estes patamares. O incentivo da família ao estudo e o acesso à cultura são, portanto, elementos fundantes, conforme se pode perceber com tais dados, para uma formação mais plena e forte dos participantes.

Este mapeamento realizado pelo Estadão revela, portanto, as diferenças sociais brasileiras como elementos marcantes e definidores dos melhores e piores resultados obtidos por nossos estudantes num dos exames com maior participação do mundo e que, por suas características, acaba se tornando uma fonte de dados bastante confiável tendo em vista a democratização de acesso dada por tal prova nacional.

Não se pode, em hipótese alguma, ao avaliar tais dados, pensar os resultados como sendo variáveis que definem qualquer tipo de superioridade real de homens em relação a mulheres ou de brancos em relação a negros. Isso não existe na prática. Todos são capazes de resultados expressivos. O que se percebe é que as condições oferecidas são desiguais, o contexto é definidor de atrasos ou possibilidades de avanço, a família participativa e informada é um grande vetor favorável a rendimento melhor dos estudantes, o acesso a recursos – como se percebe em relação ao grande número de melhores alunos oriundos de escolas privadas – faz diferença considerável para a aprovação ou reprovação nos melhores e mais concorridos cursos.

Os dados são importantíssimos e mais do que simplesmente sua coleta e organização devem ser considerados para que políticas públicas efetivas que promovam entre as comunidades, escolas, famílias e estudantes a possibilidade real de tornar igual ou próxima a disputa entre os participantes não apenas do ENEM, mas das oportunidades da vida real, se efetivem. O que foi feito nos EUA, Finlândia, Suécia ou Rússia que melhorou e equilibrou o rendimento dos homens e das mulheres? O que pode ser feito para que o desnível entre brancos e negros diminua ou desapareça? Perguntas como estas devem surgir e nortear planos e ações em prol do fim desta desigualdade verificada. Somente assim a régua dos exames nacionais, como o ENEM, poderá atingir um nível de equilíbrio, respeito e criação de oportunidades para todos, conforme se preconiza para as democracias, por meio da educação, no Brasil.



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