Ensino de Línguas
Rodolfo Mattiello é formado em Letras e mestre em Linguística Aplicada. Professor de língua inglesa desde 2002, em 2013 fundou a Mattiello Consultoria Acadêmica que oferece coaching especializado para professores de língua estrangeira.

Filler, mas não é pra encher linguiça - 29/05/2017
Rodolfo Mattiello

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diálogo, clareza, informação

Me lembro de quando era mais novo e os professores de inglês onde estudava constantemente diziam que pessoas que ficam pausando suas falas com "é", "hum", "ãm", etc, tinham a fluência atrapalhada. Algumas décadas se passaram, hoje estou do outro lado do espectro e posso dizer que aqueles professores se esqueceram de estudar um recurso muito interessante da fala. Os chamados fillers.

Fillers são um recurso linguístico que interrompem a fala, mas que geralmente são mal compreendidos ou utilizados em excesso, o que contribui para sua má fama. Porém, o que nunca paramos pra pensar é que esses fillers são características da proficiência de uma língua, isto é, tal qual a ordem sintática, escolha de palavras, sotaques, essa característica também mostra o nível de conhecimento linguístico que uma pessoa tem. Nós também temos fillers na língua portuguesa: "é", "hum", prolongamento da última sílaba (3).

(1) Ontem, é... eu fui ao jogo logo depois do almoço.

(2) Quando chegamos na praia, a gente... hum... tirou todas as malas do carro.

(3) O time não jogo:::u... não jogou muito bem.

Notem que em (3) o símbolo utilizado para prolongamento do som usado é o " : " e geralmente usamos esse e outros tipos de fillers para organizarmos nossa fala. Bem utilizado, mostra controle sobre aquele idioma é total, que o locutor apresenta ferramentas mais que suficientes para provocar expectativa, para transmitir sua mensagem da melhor maneira, para gerar comoção, humor, etc.

Além de ser parte integrante da fala para gerar as situações acima citadas, fillers também têm um papel importante para que uma conversa tenha continuidade (ou não).

(4) A: I also like:

B: I don´t like [this kind of food!]

A: [Italian food.]

A gente pode notar no diálogo de (4) que uma hesitação durante uma conversa pode fazer com que o interlocutor acabe "atravessando" a conversa e inicie sua fala acreditando que seu momento para tal tenha chegado. Isso acontece numa fala natural e, por isso, é importante trabalhar esse tipo de hesitação da fala para que a gente, professor de língua inglesa, ofereça aos alunos o modelo de fala mais natural possível. Ou seja, para que nossa fala não seja abruptamente interrompida quando a gente precisar dar uma organizada na nossa fala (e isso é comum), em vez de pausar a fluência com silêncio preencha essa lacuna com um filler como pode-se notar em (5). Além de ajudar na organização da fala de um jeito natural, eles têm função interessante em nossa pronúncia uma vez que os fillers adicionam uma vogal à palavra, contribuindo para que a curva de entonação se mantenha de acordo com o que a língua inglesa propõe.

(5) Last night was: erm.. different.

Mas como tudo que é em exagero dá problema, o uso desse recurso em excesso pode causar o efeito contrário àquele que geralmente os fillers oferecem. Isso quer dizer que se os inserirmos com uma frequência muito alta, a naturalidade se perde e, consequentemente, a fluência da fala, isto é, o uso excessivo dessa característica linguística faz com que nossa fala pareça não ter confiabilidade, que a gente sabe sobre o que estamos falando. Claro que isso é a última coisa que queremos.

Não estou dizendo que hesitar para organizar melhor as ideias é um péssimo negócio, pelo contrário, existem maneiras de se fazer isso sem parecer que está criando fatos ou que não há certeza naquilo que está sendo dito. Mais ainda, esse recurso faz, sim, parte da língua, ou seja não é errado nem podemos julgar a fala da pessoa que usa fillers como sendo ruim ou com falhas. Porém, tão importante quanto saber que é possível usar esse truque linguístico é não exagerar, não passar do tom para que a tão perseguidade naturalidade da fala não se perca.



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