A Semana - Opiniões
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Escola em tempo integral: O feijão e o sonho - 06/03/2017
João Luís de Almeida Machado

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Plano Nacional de Educação, PNE, 	reforma do ensino médio

Os governos de Lula, Dilma e Temer elegeram o ensino em tempo integral como uma de suas metas primordiais no que se refere a educação básica no Brasil. Há pelo menos 10 anos há estudos e projetos sendo realizados quanto a isso e, procurou-se garantir, na prática, que ao menos ¼ das escolas públicas viessem a disponibilizar vagas dentro desta proposta. Estamos, portanto, parafraseando a obra clássica de Orígenes Lessa, diante do sonho...

Vamos então aos números para ver a quantas anda o feijão...

Segundo pesquisa realizada pelo Inep – Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais Anísio Teixeira – temos hoje 2,8 milhões de brasileiros entre 4 e 17 anos, em dados relativos a 2015, fora da escola. Em 2014 eram 3 milhões. Em termos absolutos, analisando-se friamente os números, são 200 mil estudantes deste contingente etário a mais matriculados. Isso parece satisfatório diante de um quadro de crise e retração econômica como o que o país vive desde 2014. Não há como fugir, no entanto, do dado real, ou seja, há um enorme contingente de brasileiros ainda fora da escola, o equivalente a população de uma metrópole como Fortaleza. Como resolver esta equação? Porque ainda temos tanta gente fora das escolas? Onde estão estas crianças e adolescentes? O que as escolas podem e, mais importante, estão fazendo, com apoio governamental, para que estes brasileiros possam ser também matriculados e frequentar as escolas do país?

Quanto ao Ensino Fundamental em período integral (com carga horária de 7 horas por dia), do 1º ao 9º ano, em 2015, as matrículas caíram 46%, de 4,6 milhões de alunos em 2014 para 2,4 milhões no ano da pesquisa. Há, portanto, pouco feijão nesta panela e nem o acréscimo de água irá garantir alimento para todos como desejado... O que ocasionou este decréscimo nas matrículas? Foi a crise econômica que ceifou investimentos e recursos para bancar a educação em tempo integral? Ou foi a própria organização deste projeto e seu andamento que não estimularam os estudantes a buscar esta educação? A propósito, cabe um exame de como funcionam as escolas em tempo integral buscando informações sobre sua estrutura, componentes curriculares, cursos adicionais extracurriculares, corpo docente e tudo o que é necessário para que esta oferta atinja seus objetivos. Ficar horas a mais numa escola que, para muitos alunos, não é estimulante em sua grade básica (o que, por si só, já exige mudanças no que tange a filosofia, projeto político-pedagógico, metodologia, didática, currículo, estrutura e recursos), para cumprir as metas políticas de oferecer uma escola de tempo integral não tem o menor sentido. Num projeto como este é preciso oferecer alternativas reais de crescimento, estudo, aperfeiçoamento, ludicidade e recursos (humanos e materiais) que comportem esta carga horária adicional e complementem o que é oferecido no ciclo regular.

A proposta do Plano Nacional de Educação, o PNE, quanto as escolas de tempo integral, é a de que se chegue a 25% das vagas ofertadas em redes públicas atendendo o Ensino Fundamental em tempo integral. O percentual, porém, entre 2014 e 2015 caiu de 19,4% para 10,5%. Estamos caminhando na contramão. Se é prioridade, ainda que o crescimento fosse residual, com metas de crescer e atingir o objetivo maior de ¼ das vagas oferecidas em tempo integral até 2020, por exemplo, as necessárias condições para que isso aconteça devem ser criadas mesmo diante de um quadro econômico adverso. Até porque é somente com uma educação mais qualificada que nos tornaremos realmente capazes de crescer em nossa economia, como ocorreu em nações como a Coréia do Sul ou a Finlândia, cujos investimentos nos anos 1970 e 1980, continuados posteriormente, tiraram tais países de patamar semelhante ao do Brasil naquelas décadas e os colocaram num grau de desenvolvimento equivalente ao das mais ricas e prósperas nações do mundo. O Ensino Médio, na contramão das quedas verificadas no EF, teve crescimento de 8,8% nas matrículas em escolas públicas de tempo integral. Também foi verificado crescimento neste segmento entre as escolas particulares, de 5,6% neste caso. Isso é positivo e, certamente, o estímulo do estado está ajudando no sentido de levar mais estudantes brasileiros a prosseguir seus estudos além do ensino fundamental, de olho numa formação mais condizente com o que se espera deles no mercado de trabalho.

A reforma do ensino médio, encaminhada ao Congresso e aprovada, conforme explicitado em artigo sobre o tema, pode contribuir para que o país melhore a qualidade da educação neste segmento, em especial a partir de escolas de tempo integral, se geridas de forma adequada e com um projeto político-pedagógico consistente. Não há garantias, no entanto, de que isso irá ser efetivado, o que depende da vontade política dos envolvidos, desde os governantes até, principalmente, os gestores e professores que estão nas escolas.

O que é fato, no entanto, é que as escolas de tempo integral ainda estão aquém, como projeto e realização, daquilo que delas se espera, em todo o ensino básico, inclusive no Ensino Médio. Há muito o que fazer e melhorar. Quedas acentuadas nas matrículas, conforme verificado nos dados auferidos pelo Inep, demonstram que andamos para trás e que, recuperar o tempo perdido irá custar muito a todos os envolvidos e ao país, seja em dinheiro ou tempo.



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