Ensinar e aprender na sociedade digital - 06/09/2016
João Luís de Almeida Machado
“Influentes universidades americanas estão investindo em atividades online para seus alunos, mesmo em cursos presenciais. Documento do MIT (Instituto Tecnológico de Massachussets) projeta que, até 2020, a escola vai desenvolver e implantar em um modelo que mescla atividades presenciais e virtuais. Segundo o documento, a opção vai permitir que os cursos fiquem mais interessantes e menos caros.” (Disponível em http://porvir.org/garimpo/ensino-on-line-avanca-em-faculdades-nos-eua-modelo-deve-chegar-ao-brasil/20141222)
Não há dúvidas, a educação mudou e, se ainda não efetivou a mudança de forma tão marcante, atingindo contingentes realmente expressivos de estudantes, se mostrando presente em redes de ensino públicas ou privadas, acontecendo tanto em países desenvolvidos quanto em nações mais atrasadas, é porque mudar não é fácil, exige investimentos e, em especial, que se modifique a cultura vigente.
Lidamos com modelos educacionais estabelecidos há mais de 100 anos. A sala de aula conhecida por todos é produto de uma sociedade industrial, recém-saída de processos revolucionários que estabeleceram a burguesia como força dominante, necessitada de mão de obra e de pessoas obedientes aos princípios e regras que passaram a estar em vigência, ainda no século XIX.
Não é à toa que a sala de aula define uma prática que faz com que os alunos fiquem sentados por horas, a ouvir seus professores, provedores do conhecimento humano, de forma segmentada, ou seja, divididos em caixas onde cada área e matéria pertence a um dono, responsável por transmitir os saberes específicos da matemática, das línguas, das ciências ou das humanidades.
Disciplina é o que se busca, tanto o conteúdo quanto o comportamento. Temos que saber, sem saber ao certo quem definiu o que deve ser conhecido, os motivos que nos levam a estudar isso ou, mais importante ainda, como isso irá ser aplicado na nossa vida. Temos que aprender a nos comportar de acordo com os modelos vigentes, os parâmetros, as regras, as leis estipuladas pela vontade coletiva.
E assim foi, desde que a educação a se tornou regra desta vida em sociedade, a partir da influência dos iluministas franceses, em especial da contribuição de Rousseau e de sua clássica obra, “O Emílio”. Vieram os pedagogos especializados, suas diferentes teorias, linhas de ação metodológica, alguns revolucionários como Dewey, Wallon, Emília Ferrero, Piaget, Vigotsky, Paulo Freire e outros expoentes do pensamento educacional, preconizaram mudanças, se aprofundaram quanto à educação, propuseram uma escola mais crítica, realizaram ações e estudos que instigaram realizadores aqui e acolá a criar instituições diferenciadas sem que, no entanto, isso virasse regra.
Com o advento da tecnologia as coisas mudaram. Os anos 1990 e a internet modificaram o acesso a informação, ofereceram ferramentas poderosas que permitem a todos processar dados, criar materiais, compartilhar recursos, trocar ideias, compor em diferentes mídias, disponibilizar cursos, cruzar os quatro cantos do mundo em um estalar de dedos.
Empresas de diferentes segmentos, a começar pelas instituições financeiras e comerciais ou de serviços, também indústrias e até mesmo o setor primário (agricultura, pecuária e extrativismo) ou a área de mineração logo se apoderaram destas ferramentas e implementaram seus processos produtivos e de gestão. A educação demorou um pouco mais para adotar a tecnologia. E esta adoção foi bastante tímida e pouco inovadora no início.
A adoção de laboratórios de informática foi a primeira resposta da educação ao advento destas tecnologias na vida em sociedade. Ensinar a usar os computadores, a operar softwares ou aprender a programar para aqueles que tinham interesse mais específico fizeram parte deste princípio de ações com computadores e internet nas escolas. Em muitos casos, no Brasil, os laboratórios ficavam fechados a chave, com horários marcados para uso coletivo, sem ainda a compreensão de que tais recursos poderiam se tornar elementos de aprendizagem tutorada, associada a projetos ou mesmo para que os alunos, por iniciativa própria buscassem o conhecimento.
Alguns anos depois, já no século XXI veio à tona o conceito de informática educacional, ou seja, aquela na qual não se aprendem mais conceitos operacionais das máquinas, linguagem de programação ou como se deve utilizar um processador de textos ou uma planilha eletrônica. Nesta nova proposta os computadores e a internet, ainda em seus primórdios, ou seja, no que ficou conhecido como Web 1.0, pouco interativa, a proposta era pesquisar pelo computador, buscar informação em sites, agregar dados para compor trabalhos ou tarefas escolares.
Mais recentemente, pois esta história tem pouco mais de 20 anos, alterou-se novamente a forma como as tecnologias de informação e comunicação poderiam ser usadas nas escolas, passando-se a focar mais na interatividade, no uso dos recursos que permitem a publicação de produções por conta própria, usando elementos de redes sociais, agregando pelos buscadores mais evoluídos e pela ampliação da banda de acesso à web a possibilidade de ter acesso a bancos de dados inacreditáveis, pertencentes a grandes instituições de ensino, cultura ou mesmo a governos, corporações, particulares, pesquisadores, artistas...
A educação foi então percebida por grandes corporações e por empreendedores que criaram suas startups como segmento de grande potencial para seus negócios e investimentos têm sido feitos para que ferramentas, métrica (de acordo com parâmetros preconizados pelo Banco Mundial para a educação no planeta desde a metade dos anos 1990), recursos que possibilitem o estudo individualizado, ações com base em projetos, uso de estratégias que mesclam o presencial e o virtual ou mesmo cursos totalmente oferecidos a distância com base em ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) ou nos MOOCs (Massive Open Online Courses).
Blended Learning, Flipped Classroom, Fusion learning, gamificação, personalização dos estudos e outras estratégias ou metodologias passaram a ser propostas e utilizadas experimentalmente, mas ainda não se tornaram regra, ou seja, não atingem grandes redes e nem se sabe ao certo se realmente são aplicáveis em tão larga escala ou se os professores saberão ao certo como implementar tais fórmulas.
O que se percebe, no entanto, é que a educação tende a ter espaços cada vez mais compartilhados, entre o real e o virtual, entre o livro e o e-reader, entre o tablet e a aula expositiva, entre o estudo individualizado e personalizado e os projetos envolvendo grupos.
E é nesse interim que instituições como o MIT (Massachussetts Institute of Technology), Stanford, a Unicamp e várias universidades de ponta, de olho no futuro muito próximo, que pode ser amanhã, entendem que a escola não irá prescindir dos professores e dos espaços presenciais de aprendizagem, tampouco dos livros e das bibliotecas, dos laboratórios ou das quadras. Sabem, também, que a tudo isso, cada vez mais, as escolas terão que adicionar aulas a distância como complementos, utilizando o EAD não de forma estanque e solitária, mas complementar e enriquecedora, requisitando maior comprometimento e outra postura, mais disciplinada, por parte tanto de alunos quanto de professores para que isso funcione de forma efetiva.
Ensinar e aprender na sociedade digital, estão concluindo os especialistas, utiliza a palavra, a presença, o carisma, a experiência, o conhecimento pedagógico e outras qualidades inerentes a educação presencial numa mescla ou fusão cada vez maior com as tecnologias, suas possibilidades múltiplas e seu fascínio.
# Cidadania Digital: O mundo virtual em busca de harmonia e respeito
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