Educação e Tecnologia
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Sobre livros, e-books, tablets e bibliotecas - 10/05/2016
João Luís de Almeida Machado

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computador simulando estante de livros

Substituir livros por computadores é algo que não devemos fazer.

Usar plataformas digitais para ler livros é algo que podemos fazer.

Analise as frases acima e perceba as diferenças que há entre elas. No afã e na febre tecnológica que por vezes domina o mundo e as pessoas, entre as quais também aquelas que trabalham em educação, o uso de computadores, tablets, smartphones e outros recursos parece destinado a ofuscar, eclipsar ou mesmo “detonar” os demais recursos usados regularmente pelas escolas.

Não é bem assim...

Tecnologias são muito bem-vindas nas escolas de todo o país e do mundo. Agregam valor, ajudam a compor ações, tem forte relação com a geração de nativos digitais, já possuem recursos de qualidade disponíveis para auxiliar nos trabalhos educacionais, monitoram ações e rendimento, informam usuários interessados no desempenho escolar, enfim, vieram para ficar por conta de todas as vantagens a elas relacionadas.

A substituição de recursos e metodologias, no entanto, não é automática, pelo contrário, depende de avaliação criteriosa, capaz de legar aos examinadores a plena condição de compreender o papel de cada ferramenta e a forma como são utilizadas juntamente aos alunos por seus professores para, então, validar alguma mudança, caso sejam possíveis ou cabíveis.

No caso dos livros e das bibliotecas, a substituição por recursos digitais, seja em qual plataforma for, pode ser pensada e proposta desde que em determinadas condições, como por exemplo:

- Permitir acesso a baixo custo por meio digital a obras de interesse a maior quantidade de escolas, professores e alunos;

- Problemas de espaço para armazenamento de obras em papel nas escolas;

- Agilidade na disponibilização de obras em meio digital que não possa acontecer com os livros;

- Dificuldade ou alto custo para envio de obras impressas para escolas distantes;

- Falta de novas edições em papel de determinadas obras, consideradas para trabalhos ou leituras nas escolas.

São alguns casos nos quais as circunstâncias podem ser determinantes para o uso de livros digitais. Há também outras questões a serem pensadas, relativas a situações como o peso excessivo nas mochilas escolares que poderia ser abrandado com o uso de e-books e também de e-textbooks, ou seja, de versões digitais dos livros adotados pelas escolas.

Em relação aos livros digitais há, no entanto, muitas dúvidas e dificuldades nas escolas, juntamente aos educadores, quanto à forma como os trabalhos podem ser conduzidos. Questões técnicas ou didáticas, acesso controlado a internet em sala de aula ou wi-fi liberado e contratos definindo as bases de uso, que aplicativos ou softwares podem ser utilizados, como os professores podem fazer uso efetivo e eficiente dos materiais digitais em sala de aula e outras dúvidas ainda prevalecem na cabeça da maioria das pessoas que atuam em educação.

O que não se pode perder de vista, no entanto, é que a adoção de livros digitais de forma exclusiva somente pode acontecer em situações muito específicas, como as mencionadas e que, sua plena utilização ainda depende de ajustes, preparo para seu uso regular, planejamento didático, estrutura de apoio em termos de redes, definição de parâmetros juntamente aos alunos...

Os livros em papel continuam sendo e, na visão dos especialistas, para sempre serão, materiais de grande valor que permanecem sendo muito úteis ao trabalho educacional e que agregam culturalmente para todos os usuários.

Há, evidentemente, também, o charme, o apego, o carinho de todos que apreciam os livros em relação ao papel, a possibilidade de folhear, de abrir as páginas e buscar trechos, ideias, frases importantes. Até mesmo o cheiro do livro novo, as páginas esmaecidas e amareladas pelo tempo ou o desgaste pelo uso e acesso regular a determinados materiais impressos encanta e seduz a maioria dos amantes da leitura.

A questão passa a ser, então, mais ampla ao abordarmos não apenas o livro em seu acesso individual, mas a existência das bibliotecas públicas e as escolares como locais nos quais, efetivamente, a leitura aconteça em moldes regulares, não apenas para atender as demandas dos professores, mas como local de apreciação das letras, dos tratados, das fórmulas e das ideias contidas nos livros.

Neste sentido o que se percebe é que as bibliotecas perderam espaço e nem mesmo a Lei das Bibliotecas Escolares, aprovada em 2010, que previa a ampliação deste espaço no âmbito das escolas públicas brasileiras ajudou a melhorar a situação.

Escrevi artigo sobre este assunto no qual, a partir de pesquisas realizadas pelo projeto Todos pela Educação, no qual os números são decepcionantes e desanimadores para quem espera a ampliação das bibliotecas no país:

“De acordo com um levantamento realizado pelo movimento Todos pela Educação baseado no Censo Educacional Brasileiro de 2011, seria necessário, em esforço contínuo, até 2020, que fossem construídas 34 novas bibliotecas escolares diariamente no país. Temos um déficit de 130 mil bibliotecas escolares. Os dados apontam para uma realidade em que apenas 1 em cada 4 estabelecimentos de ensino da rede pública nacional tem bibliotecas (o índice é de 27,5%). Os dados de 2011, confrontados com informações de 2008, mostram que nesses anos foram construídas 7.284 novas escolas públicas no país e que, ainda assim, apenas 19,4% delas foram contempladas com bibliotecas em suas dependências”.

A situação é um pouco melhor nas escolas privadas, nas quais as bibliotecas continuam sendo consideradas importantes para a formação e fazem parte de uma maior quantidade de instituições, como reforço a seguir, no mesmo artigo sobre o tema:

“Na rede de ensino privada, os dados são menos alarmantes, o índice de escolas com bibliotecas se mantém quase sempre superior a 60%”.

Ainda que tenhamos mais computadores, tablets, redes wi-fi e estrutura suficiente para que os livros digitais ampliem sua entrada nas escolas não podemos ou devemos abrir mão das bibliotecas e dos livros em papel. Carecemos ainda de um trabalho firme no sentido de ampliar o interesse espontâneo dos alunos em relação a leitura. Os esforços no sentido de ampliação da leitura, da presença dos livros e das bibliotecas nas escolas deve ser instado a partir da educação infantil e prosseguir de forma perene e forte até o final do ensino básico para consolidar a apreciação e o exercício da leitura entre as novas gerações. Nosso imortal Monteiro Lobato, de tantas obras fenomenais, como o Sítio do Pica-Pau Amarelo, já dizia que “um país se faz com homens e livros” e, o grande escritor argentino Jorge Luis Borges destacava a importância das bibliotecas ao afirmar que, a partir de seu ponto de vista, o céu deveria ser uma grande biblioteca.

Obs. O artigo de minha autoria mencionado neste texto tem como título “O Brasil e suas escolas sem bibliotecas” e foi publicado na área exclusiva do portal Edros, do Sistema de Ensino Poliedro.



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