Procedimentos, atitudes e conteúdos: Do Aprender a Fazer aos Fablabs - 07/04/2016
João Luís de Almeida Machado
A metodologia científica é assunto trabalhado de forma corrente somente no ensino universitário. Cursos de programação constituem o foco de escolas técnicas ou de cursos adicionais. Conhecimentos e aplicação de recursos relativos a softwares e aplicativos especializados como o pacote Office ou de edição de vídeos e fotos, trabalho com projetos em computadores e criação de produtos dependem igualmente de ações exteriores a escola. Ações em laboratórios ou criação de maquetes são também procedimentos que a educação básica - no ensino fundamental II e no ensino médio - tampouco valorizam ou realizam dentro de seu currículo básico de forma perene.
Tudo isso deve nos levar a um importante questionamento: Por que não são trabalhados procedimentos e ações de tal natureza, sempre de acordo com o nível de ensino e grau de maturidade dos educandos, já no ensino básico?
O trabalho e a avaliação de procedimentos não são o foco na educação brasileira ainda que especialistas advoguem a necessidade de valorizar nas salas de aula o foco nestes elementos.
Na realidade o conteúdo ainda é o fundamento de toda a ação educativa nas salas de aula do Brasil e, ainda que ações nacionais em prol de uma ampliação do leque, abarcando tanto os saberes específicos das diferentes áreas do conhecimento quanto procedimentos e atitudes sejam preconizados, tanto na rede pública quanto na privada, prevalece na prática didática nacional o ensino compartimentado em caixas de saberes especializados.
A educação bancária, tantos anos depois de denunciada por Paulo Freire e apesar de toda a releitura e contestação trazida por especialistas é o que temos para hoje e, diga-se de passagem, também para amanhã, depois e por um bom tempo ainda...
Tapar o sol com a peneira e não fazer a autocrítica é o pior cenário. O melhor neste momento é admitir as fraquezas existentes e trabalhar no sentido de realmente remodelar o trabalho nas salas de aula de todo o país.
Isso pode começar desde já com a preparação dos professores e gestores escolares para uma atuação que foque numa prática pedagógica que trabalhe e avalie tanto o conteúdo quanto o procedimental e o atitudinal de todos os alunos.
Neste sentido a preparação para a ação que enfoque numa formação mais ampla, prevendo e planejando para os procedimentos de sala de aula mais rigor, informação, prática e plena compreensão dos processos educativos como um todo é de fundamental importância.
O professor precisa aprender a orientar a ação e não apenas se restringir a dizer o que deve ser feito imaginando que o aluno já saiba realizar o que ele está requisitando. O docente não deve ser apenas voz de comando e, sim, alguém que sabe também como se procede, como se faz algo, dando sentido a perspectiva contida na obra de Jacques Delors, Educação – Um tesouro a descobrir - e nas prerrogativas da Unesco em relação ao “Aprender a Fazer” que, infelizmente, poucos ensinam e muitos não sabem, por conta própria, realizar.
Os procedimentos de metodologia científica relacionados a produção de artigos, conhecimento das normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), pesquisa de campo, diferentes metodologias aplicáveis, coleta de relatos, tabulação de dados, realização de entrevistas ou organização de referências é algo que não se domina nas escolas brasileiras entre os membros do corpo docente.
No seu processo formativo os professores, em licenciaturas, tiveram que realizar tais ações para fins de entrega de seus trabalhos finais, os chamados TCCs (Trabalhos de Conclusão de Curso). Daquele momento ao presente instante em que estão em sala de aula quantas vezes tais procedimentos foram retomados, estudados novamente, aprofundados e reutilizados por estes profissionais?
Exceto aqueles que continuam sua formação em cursos de pós-graduação, os demais raramente se defrontam com estes instrumentais. Ínfimos são aqueles que se aventuram e pensar na metodologia científica como algo a ser ensinado a seus alunos no ensino básico.
Há projetos em algumas unidades de ensino, de forma isolada, que se propõe a trazer para os alunos a estrutura lógica, de procedimentos científicos, conhecimentos tecnológicos, acesso a práticas que os permitam crescer e amadurecer no todo, transformando a escola numa constante de desafios que fazem com que estes alunos se interessem mais e mais pelos seus estudos, por ciência, tecnologia, arte ou cultura. Tais ações são, porém, incipientes e isoladas. Ainda que contando com o poder da rede mundial de computadores, não chegam as outras unidades educacionais nem mesmo de seus próprios municípios ou estados. Por vezes têm como vetores um ou outro docente ou gestor que pensam “fora da caixa” mas que ficam restritos a seus próprios espaços, sem ter como compartilhar de fato tais experiências.
Ações como os Fablabs trabalham na contramão do que ocorre nas escolas brasileiras ao propor projetos, estudos, trabalho em equipe, documentação, registro permanente das ações e, acima de tudo, conhecimentos que não se restringem aos conteúdos, passando necessariamente pela atitude que deve ser de consciência, respeito, compartilhamento, engajamento, ética e trabalho duro, ao mesmo tempo em que cobram dos alunos que aprendam e se apropriem dos necessários procedimentos para a efetivação dos projetos em que estão ativos.
A escola precisa aprender o básico e realizar isso de forma competente e consequente, como por exemplo o pleno domínio das linguagens, o que no presente momento em que vivemos não mais se restringe a saber português, inglês ou espanhol, também isso, mas aos estudantes devem ser ensinados os saberes relativos a programação, ao uso consistente e inteligente de softwares, a robótica, ao trabalho com impressoras 3D para a criação de produtos, enfim, dentro do universo tecnológico em que todos nos encontramos hoje inseridos.
Saberes procedimentais também quanto ao uso e participação em projetos relacionados a laboratórios de ciências da natureza ou ações relacionadas a arte e cultura são igualmente fundamentais e não apenas desejáveis ou recomendáveis caso a escola pretenda se manter viva entre os alunos que a frequentam tanto quanto para as comunidades e o mundo a que servem.
O somatório de tudo, ou seja, de projetos concatenados com ciências, matemática, humanidades, linguagens, artes e, ao mesmo tempo, contando com avaliações processuais e não apenas no final das realizações, tendo foco em procedimentos e atitudes é o que certamente garantirá a escola sua renovação e aceitação social plena.
# Muitas palavras e pouco o que dizer
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