O Pequeno Príncipe - 03/02/2016
João Luís de Almeida Machado
Transformar um clássico, já previamente produzido para as telas, como filme e animação, em um sucesso de público e crítica é um grande desafio. Uma obra amada e cultuada por milhões de pessoas no mundo inteiro, constantemente citada por crianças e adultos como obra de referência, torna esta tarefa ainda mais complicada.
O cinema francês, no entanto, ao promover o surgimento de uma nova obra cinematográfica, dirigida por Mark Osborne, baseada no livro “O Pequeno Príncipe”, de Antoine de Saint-Exupéry, permitiu que a conhecida história viesse embalada numa modernidade que agradou, e muito, a nova geração de leitores e espectadores, afeitos aos elementos da cultura digital.
A conhecida história do príncipe loiro que reina solitário num pequeno planeta ganha novos contornos quando sua história é descoberta por uma menina do século XXI.
Neste contexto vivemos embalados pela velocidade do mundo contemporâneo associada as metas que orientam a busca pelo sucesso dos adultos mas que precocemente tem sido trazidas para o universo infantil. Estamos num mundo pastiche, onde o cinza predomina e as cores parecem algo tão distante quanto o planeta do Pequeno Príncipe e, com isso, o sabor desaparece e a vida fica pasteurizada.
E é justamente a busca pelo sucesso a qualquer preço, precoce, que leva a menina e sua mãe a morar num novo endereço, próximo a escola dos sonhos, aquela que garante a subida ao Monte Olimpo aos seus alunos.
Inicialmente a mãe acha estranho terem conseguido uma boa casa naquela localidade, sem perceber que ao lado de sua nova residência habita um ser estranho, um velho aparentemente tresloucado que irá mudar a vida de sua filha.
Neste momento da história, em que o Pequeno Príncipe ainda não é protagonista, ao entrarmos em contato com o vizinho da menina, ficamos nos perguntando quem é louco de fato neste mundo em que vivemos. Isso é algo que ultrapassa os limites do filme e que merece exame minucioso de estudiosos pois que, quanto mais o tempo passa, mais parecemos agir de forma insana na busca de metas que são cada vez mais distantes e difíceis de se atingir.
De qualquer modo, é o velhinho da casa ao lado que irá apresentar o mundo daquele Pequeno Príncipe a sua nova vizinha. Enquanto a mãe trabalha intensamente para pagar as contas e alimentar o sonho de sucesso de sua filha, que por sua vez cumpre extensa, cansativa e embrutecedora lista de tarefas para chegar lá, um pequeno acidente aproxima o velho escritor ou contador de histórias e a menina da casa ao lado.
Tudo é diferente na vida do velho. Sua casa não condiz com a vizinhança - hermética, incolor, neutra, com cortes simétricos ao extremo - enquanto seu lar tem cores, brinquedos, formas incongruentes e uma desordem que estimula os sentidos.
Se do lado de lá da cerca reina a ordem absoluta, atrás dos arbustos, criam-se sonhos embalados por planetas, raposas, rosas, pilotos de avião, aeroplanos, desertos, diálogos, sentimentos fortes e profundos.
O mérito todo da obra de Saint-Exupéry permanece intocado no filme, mas a ele se acrescenta uma modernidade que aproxima os nativos digitais daquilo que lhes tem sido negado, ou seja, o acesso a uma vida fora das redes sociais, das telas, da web e dentro de uma dinâmica que lhes permita perceber os arredores, interagir socialmente de forma mais intensa, sem intermediações de qualquer natureza, aproximando-se das rosas para perceber seu odor, suas cores, formas e a beleza infinita nelas contidas.
Deixar para trás cronogramas, metas, objetivos, sucessos a serem atingidos algum dia, dinheiro como mote para a vida e perceber que há planetas a serem conquistados, voos a serem realizados, desertos a serem descobertos e percorridos, pessoas a serem conhecidas, apreciadas e amadas.
Tecnicamente muito bem realizado, com traços fortes quando necessários para retratar o mundo cinza em que inicialmente vive a menina e mais leves e coloridos em momentos mais pueris associados ao Pequeno Príncipe propriamente dito ou ao velhinho contador de histórias, a animação ganhou os corações de velhos e novíssimos admiradores do clássico.
Assistir ao filme e ler o livro são grandes prazeres que precisam ser estimulados entre as crianças e que certamente podem se tornar caminhos para que se estimulem estes pequenos leitores e espectadores a viverem de forma mais intensa a sua infância.
Veja o trailer do filme
Ficha Técnica
Filme: O Pequeno Príncipe
País/Ano: França, 2015
Gênero: Animação
Direção: Mark Osborne
Roteiro: Bob Farchetti, baseado na obra original de Antoine de Saint-Exupéry
Elenco (vozes): Mackenzie Fox, Jeff Bridges, Rachel McAdams, James Franco, Riley Osboren, Benicio Del Toro, Marion Cotillard, Rick Gervais, Paul Giamatti, Albert Brooks.
# Selma – Uma luta pela igualdade
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