Diário de Classe
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Repensando a recuperação escolar no final do ano letivo - 07/12/2015
João Luís de Almeida Machado

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aluna preocupada com livros sobre a mesa

Quando chega o mês de novembro os alunos que estão com notas baixas entram em desespero. Não têm mais como atingir as notas necessárias para fechar o ano e passar para a próxima etapa de suas formações escolares.

Contas e mais contas são realizadas pelos alunos juntamente a coordenação, a orientação e aos professores para ver se há ainda alguma esperança. Para alguns, em escolas que estipulam notas mínimas ou quantidade máxima de matérias para entrar em recuperação o fim da linha já parece decretado, a reprovação está próxima. Para outros, cujas escolas são mais flexíveis ou então para aqueles que estão com problemas localizados em uma ou outra matéria ou área do conhecimento, o que resta é se preparar para as provas finais e depois encarar a recuperação final.

Mas a recuperação final realmente recupera alguém? Este expediente utilizado há anos pelas escolas é eficiente no que se propõe, ou seja, no sentido de oferecer aos estudantes que estejam nesta situação a possibilidade de rever os conteúdos não aprendidos e, em curto período, compreender, assimilar e atingir o necessário preparo para o próximo ano letivo? Ou é uma formalidade através da qual o intuito claro e principal é oferecer chance aos alunos despreparados para que “passem de ano”?

Creio que não há mistério quanto a isso para ninguém, seja para os profissionais da educação ou para o restante da comunidade, pais e alunos atendidos pelas escolas. Da forma como funciona hoje a recuperação final é apenas um artifício criado com o intuito de validar a aprovação dos alunos e nada mais.

Aprendizagem neste momento do trabalho educacional é algo que se não é impossível, dependerá essencialmente da força de vontade e dedicação do aluno e, em contrapartida, de aulas muito bem estruturadas e trabalhadas por seus professores na revisão dos conteúdos exigidos.

O problema é que na recuperação do final de ano o normal é que as escolas criem listas de conteúdos que incluam a matéria do ano todo ou então os tópicos principais de cada bimestre.

Se o aluno não aprendeu quando o conteúdo foi trabalhado com tempo, minúcias, atividades focadas, tarefas e projetos, fica difícil imaginar que com poucos dias (normalmente 2 semanas, sendo que uma delas é dedicada as provas da recuperação) e tantos saberes a serem “recordados” ou “aprendidos”, podemos dizer que a recuperação final é uma grade farsa, uma peça de ficção encenada há anos nas escolas sem que pedagogicamente tenha real repercussão.

Na melhor das hipóteses neste período ocorre aquilo que o grande mestre Rubem Alves falava a respeito dos vestibulares, ou seja, “aprende-se” o conteúdo somente para o momento específico da prova e depois, como a água do macarrão, usando a analogia deste grande educador brasileiro, tudo escorre pelos canos da pia, sem utilidade, desperdiçado...

O pior de tudo é que este processo não é nem sequer questionado, apenas reproduzido, ano após ano, tábua de salvação de alunos despreparados que, com base neste recurso, no ano seguinte sofrem com novos saberes para os quais não aprenderam pré-requisitos básicos ensinados no ano letivo anterior.

O que fazer então? Não dar mais esta oportunidade para os alunos e com isso aumentar os dados relativos a reprovação? Para o estado, como provedor da educação pública em suas diferentes instâncias (municipal, estadual ou federal) isso representa grandes custos. Para as famílias além dos custos há o psicológico dos filhos e todas as consequências relativas a uma reprovação. Para os alunos há o tempo perdido, entre outros revezes que se acumulam quando se repete de ano.

Para se alterar este quadro é preciso modificar não apenas a recuperação, mas o próprio processo avaliativo.

Avaliações pautadas apenas em provas, por exemplo, precisam ser revistas. Deve-se considerar o global da participação do aluno na escola, com a observância de suas ações em sala de aula, associadas a atuação em projetos, realização das tarefas, provas em diferentes formatos e com diferentes propostas, habilidades e competências que vão além dos conhecimentos básicos normalmente trabalhados nas escolas, criação de portfólios dos alunos com o compartilhamento de dados entre diferentes professores, avaliadores múltiplos a validar as ações e resultados dos alunos nas escolas e por aí afora.

No que tange a recuperação, especificamente, o ideal é que ocorra de forma continuada, ao longo de todo o ano, com a oferta de aulas de apoio e revisão dos conteúdos em que os alunos demonstrem maior dificuldade ocorrendo nos contraturnos, com o apoio dos próprios docentes ou de professores auxiliares (uma alternativa interessante seria contar com grupos de estudantes que estão na graduação e que apresentem bom rendimento, para lhes oferecer a oportunidade de já estar na escola, contabilizando conhecimento e horas de estágio).

Desta forma, no mínimo é possível oferecer meios e recursos para que os saberes não consolidados possam ser retrabalhados juntamente aos alunos com dificuldades, focando realmente na aprendizagem ao longo do processo.

E a recuperação final?

O processo de trabalho ao longo do ano iria demonstrar quais os pontos nevrálgicos quanto aos conteúdos e indicariam, desta forma, uma seleção mais focada de saberes a serem trabalhados nesta etapa de recuperação final. Neste sentido já teríamos uma carga menor de conhecimentos sendo trabalhados e, de fato, somente aqueles que precisam de maior reforço.

Outra medida importante é estender o prazo da recuperação final para todos os alunos que já estiverem em situação difícil a partir do 3º bimestre ou ao final do 2º trimestre. Terminados os ciclos de avaliação relativos a estes períodos e contabilizados os resultados, os alunos com problemas poderiam contar com aulas e atividades adicionais obrigatórias nos contraturnos para recuperar o conteúdo não aprendido. Deste modo, quando forem para a recuperação final não teriam apenas alguns poucos dias para entender e aplicar os conceitos não aprendidos.

As 2 semanas da recuperação final ficariam para reforço pontual e aplicação de provas, certamente com muito maior eficácia para a aprendizagem destes alunos se compararmos com o modelo em vigência atualmente, que prioriza apenas a obtenção de notas e a oficialização da aprovação destes alunos, independentemente da aprendizagem ou não dos saberes propostos para tais estudantes.



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