Distância entre intenção e gesto - 01/12/2015
Wanda Camargo
Nós brasileiros somos com certeza um dos povos melhor intencionados do planeta. Basta ver a absurda disparidade entre as (excelentes) intenções expressas em nossas políticas públicas e os seus resultados concretos.
O governo brasileiro sancionou em 2014 o Plano Nacional de Educação – PNE, que estabelece as estratégias das políticas de educação para o Brasil para os próximos dez anos. Entre outras metas importantes, o PNE destaca a alfabetização de todas as crianças até o fim do terceiro ano do ensino fundamental e a erradicação do analfabetismo de brasileiros com 15 anos ou mais, e a inclusão de todas as crianças de quatro e cinco anos na pré-escola.
Infelizmente, em nosso país muitas iniciativas interessantes e necessárias não têm prosperado, embora propostas de boas intenções comunitárias tenham sido feitas, por governantes ou associações, ao longo dos anos.
Felizmente, quase todos os países garantem o direito à educação básica, pois este é um requisito mínimo de cidadania; embora a nossa legislação também contemple o tema, ainda não conseguimos efetivá-lo completamente; o número de analfabetos, embora decrescente ao longo das últimas décadas, ainda não está num patamar decente, se algum patamar é decente neste assunto.
Diversos documentos reconhecidos internacionalmente, inclusive, e não apenas das Organizações das Nações Unidas, como é o caso da Declaração Universal dos Direitos do Homem reconhecem e procuram assegurar estes direitos aos seus cidadãos.
Dentre eles, temos o documento de Jomtien, encontro de muitos países para garantir a universalização do ensino fundamental. Proposto em 1990, na Tailândia, pelos países mais populosos do mundo, até hoje não atingiu seu objetivo de garantir a todos o direito à educação.
Este documento foi considerado um dos mais importantes sobre educação, na tentativa de propor a satisfação das necessidades básicas de aprendizagem de crianças, jovens e adultos. E a forma mais eficaz de realizar este esforço ao longo do tempo. Desde os instrumentos essenciais para a aprendizagem: leitura, escrita, matemática, até os conhecimentos, habilidades, valores e atitudes necessários à sobrevivência e ao desenvolvimento pleno das potencialidades para viver e trabalhar com dignidade, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões.
No entanto, segundo as estatísticas, um terço dos adultos do mundo padece do chamado analfabetismo funcional, a incapacidade de ler ou de entender o que leu.
Outra preocupação expressa nesse documento era com a educação feminina, sempre deixada como última prioridade educacional de famílias do terceiro mundo, e mesmo do mundo desenvolvido; além dos óbices religiosos que o tema encontra em muitos países.
O planeta atravessa problemas que afetam praticamente todos os países, do crescimento da dívida pública à estagnação econômica, às guerras, epidemias, descontrole populacional, populações inteiras à deriva nos continentes, distribuição desigual de recursos e oportunidades.
O começo da solução passaria pelo que parece ser impedido pelos problemas, melhorar a educação básica e seu acesso para a maioria das pessoas. O paradoxo pode ser rompido apenas pela consciência e pela vontade dos povos, não apenas pela alocação de recursos para educação, mas pela sua gestão eficaz e garantia de uso correto e honesto, com rigorosa avaliação de resultados.
Fala-se que o otimista é apenas um pessimista mal informado, mas é indispensável ter otimismo num tema tão sério e tão abrangente para o próprio futuro da humanidade. Periodicamente são promovidos encontros, seminários, assembleias, mesas redondas, reuniões, em todos os níveis, buscando soluções para a universalização da educação; as intenções são boas, os palestrantes altamente qualificados, as conclusões as melhores possíveis. Os resultados costumam ser pífios face à enormidade do problema.
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