Habemus Linguistics II - 11/09/2015
Rodolfo Mattiello
A internet tem sido a ferramenta responsável por trazer à superfície tudo que acontece de novo no mundo contemporâneo. As notícias pipocam instantaneamente e só fica alheio quem realmente opta por ficar desse jeito ou quem não brinca na rede. Por isso temos a sensação de que a internet é a culpada por estragar a língua. Ela é o veículo que nos faz perceber como a língua é mutante e como essa mutação é rápida, as novidades sempre chegam rápidas também.
Vamos fazer o seguinte trabalho de imaginação (bem fértil, por sinal): imaginem que milhares de décadas atrás já existia internet. Nossos ancestrais conseguiam avisar todos os reinos e tribos quando iria ter um ataque de animais selvagens, quando chegasse a época de colheita ou quando alguém tivesse desenvolvido uma maneira de escrita que atendesse a todos. Com certeza iriam culpar a tal da internet também por estragar qualquer que fosse o tipo de comunicação usado na época. Ao que estudos indicam, as escritas mais antigas eram pictoriais, ou seja, eram desenhos que representavam coisas e ações. Eram como se fossem os emojis que todos usamos hoje em dia. Será que os homens das cavernas também reclamaram do surgimento dessa língua pictografada dizendo “esses desenhos nas pedras estão arruinando os grunhidos que usamos para nos comunicarmos, uga buga”? Acho que não. Os emojis também não podem ser considerados inimigos da língua, eles devem ser utilizados como forte aliados inclusive no ensino de inglês, pois serviriam de ponte de transferência de significado, conectando a representatividade que o emoji passa com a língua inglesa.
Já ouviram falar de semas? São traços exclusivos de um léxico que determinam o seu significado. Difícil? Um pouquinho né. Pensem na palavra smartphone. Se eu pedisse pra você descrever pra mim essa palavra, você usaria um conjunto de características que juntas dão significado à palavra. Pois isso é um sema. Todas as palavras, expressões idiomáticas e sentenças carregam significado e têm poder atuante quando falados e os emojis não são diferentes. Eles têm ainda uma vantagem: são altamente visuais, ou seja, não dependem de uma imagem virtual da capacidade cognitiva para compreenderem o significado. Vocês se lembram do primeiro artigo dessa série? Pois falamos como a internet tem ajudado a informar as mudanças linguísticas e também como ela têm influenciado nessas mudanças. As redes sociais e os serviços de mensagem instantânea requerem objetividade na comunicação pois oferecem espaço reduzido para se escrever. No raciocínio de nossos alunos, não vale a pena usar espaço de caracteres para se escrever I love you, da maneira canônica e a fonética tomou partido e então passamos a encontrar I luv ya, luv ya e também luv u.
Agora temos os emojis para dizer aquilo tudo. Um coraçãozinho ou uma carinha apaixonada já tem valor semântico igual ao de uma frase e precisamos saber utilizar esse recurso para nos auxiliar no ensino de língua inglesa afinal de contas, muitas vezes, principalmente quando ensinamos novos vocábulos, os alunos sabem a definição, utilizam-se dos semas para transmitir a mensagem, mas não conhecem a palavra designada. Para apresentar novas palavras também podemos utilizar os emojis e a carga semântica que eles representam numa atividade que simula o envio de uma mensagem de Whatsapp, por exemplo. Além de facilitar a compreensão de significado, emojis estão integralmente inseridos no contexto dos nossos alunos. Segundo a professora Wyvyan Evans, Bangor University, 40% dos britânicos enviam mensagens inteiramente de emojis. Parece que aquela máxima “uma imagem vale mais do que mil palavras” está mais em alta do que nunca e de fato tem lógica. Na internet ou por mensagens de celular fica muito difícil de se transmitir emoções, entonação, etc, e isso também faz parte da línguagem. Mostrar aos alunos como fazer isso num mundo em que eles são parte integrante vai motivá-los e engajá-los e quando fizermos a transição para uma escrita menos informal, eles se sentirão mais confortáveis.
Portanto, está evidente que a tecnologia e a internet está enraizada na sociedade e em nossas gerações de alunos que estão e nas que estarão dentro de nossas salas de aula. Nós professores temos que ficar cada vez mais interados nos avanços tecnológicos e nos modismos que encontramos online porque esse modismo só vai ganhar corpo por causa dos feedbacks positivos da molecada e isso vai, como Bakhtin diz, moldar a produção linguística deles, pois a internet faz parte do ambiente dos nossos alunos. Por isso, vamos entender de uma vez por todas que a língua não é estática e que a internet está enriquecendo e nos trazendo essa riqueza de bandeja.
# Artigo: Com mudança pedagógica, o celular pode ser o melhor aliado do professor
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