A Semana - Opiniões
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Rankings educacionais: medir para quê? - 17/06/2015
João Luís de Almeida Machado

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“No ano 2000, o Pisa nem existia, e perceba como em 15 anos as expectativas da opinião pública sobre as avaliações mudaram tanto. As pessoas ficaram ávidas por comparar como seu país está no ranking e o que tem sido feito para melhorar os resultados.” (Prof. Dr. Francesc Pedró, chefe do Conselho de políticas, informação e comunicação da Unesco)

Os rankings educacionais foram criados para mensurar a evolução da educação no mundo tendo como objetivo a elaboração de planos e a realização de ações, baseadas nos dados auferidos, que permitam aos países melhorar a qualidade do trabalho realizado em suas redes de ensino.

Sendo assim, que sentido tem a afirmação do professor Francesc Pedró, da Unesco, proferida durante o “Painel de Avaliação: educação e tecnologias digitais”, promovido pela Fundação Telefônica Vivo, a Unesco e a Consultoria Move, em São Paulo, no último dia 12/06?

O uso dos rankings relaciona-se as ações do Banco Mundial, a partir dos anos 1990, como parte de políticas públicas aplicadas em âmbito mundial, visando melhorar a educação a partir de estratégias e metodologias aplicadas ao mundo corporativo.

A relação entre as empresas e a educação, apesar de clara e evidente, associada em especial a necessidade destes empreendimentos quanto a oferta de mão de obra especializada e capacitada para enfrentar os desafios da nova economia, ficou sempre subjacente aos processos engendrados, ou seja, não foi evidenciada pois sempre existiu o temor de que isso fosse mal interpretado pela sociedade.

Diferentes ideologias ainda estavam em choque, em especial o embate entre a esquerda e a direita no mundo, ainda que naquele momento o mundo socialista estivesse vivendo seu ocaso, com o fim da União Soviética, a queda do Muro de Berlim e a adequação da China desde os anos 1980 ao modelo de produção e consumo capitalista.

Mesmo assim existia o receio entre os gestores do Banco Mundial quanto a repercussão de políticas públicas mundialmente recomendadas por esta instituição e por outros organismos a ela associados, de que a esquerda, em especial, resistisse a ideia de que expedientes do mundo produtivo capitalista fossem aplicados a ações e empreendimentos de cunho social, em particular, a educação.

Neste sentido, as iniciativas que ocorreram, num primeiro momento, foram sendo apresentadas publicamente como necessárias para que a educação, como um todo, a partir de pesquisas e levantamentos que buscavam auferir dados de aspectos variados do universo educacional (da infraestrutura a didática; do uso de tecnologias a qualidade dos livros usados nas escolas; da formação dos docentes aos salários e benefícios dos servidores da área; da relação com as famílias a gestão da educação) pudessem indicar caminhos e, em assim sendo, suscitar as necessárias discussões e debates que ensejariam o surgimento de projetos e planos de ação.

Não há nada que, a princípio, desabone tais ações, ainda que para algumas pessoas, os patrocinadores de tais iniciativas, assim estivessem agindo em benefício próprio e não nos conformes do bem maior, de caráter social, agregado as finalidades da educação. Ainda que pensassem em suas empresas, negócios e lucros a serem auferidos, as mudanças poderiam proporcionar ao final uma educação de melhor qualidade e, isso, em suma, reverteria em prol dos indivíduos e do corpo social. Tais ações fariam com que, inclusive, os beneficiários de uma educação de melhor qualidade, se tornassem mais críticos, éticos, politizados e, em assim sendo, capazes de agir em prol de um modelo sócio-político-econômico mais humano e justo.

Aumentar a produtividade das empresas e, ao mesmo tempo, oferecer meios para a uma possível criticidade seriam ganhos possíveis neste processo ou o andamento das ações ocasionada pelas pesquisas e rankings estaria limitado a um ou a outro viés?

O surgimento do PISA, como principal meio de comparação da qualidade da educação em diferentes nações, possibilitaria perceber os motivos que levam alguns países a atingir um grau de desenvolvimento e maturidade social, econômica e política maior que os demais em se considerando os resultados de seus alunos em avaliações internacionais. Será? E, ainda, em se considerando quais critérios especificamente?

É evidente que os dados auferidos não apenas no PISA, que se concentra de forma mais imediata em resultados dos alunos em avaliações de línguas, matemática e ciências, mas em informações colhidas a partir de outras pesquisas sobre a disponibilidade de recursos, a formação dos docentes, a forma como são geridas as escolas, o nível de interação entre as famílias e a escola ou quantos computadores e livros estão ao alcance dos professores e alunos, constitui valioso arsenal de dados para que se constituam as políticas públicas que legitimamente persigam a educação de qualidade que todos desejam.

A contextualização das informações e a compreensão das diferenças culturais e históricas não pode, no entanto, ser desprezada. Não que com isso possamos aceitar o fato de que o Brasil, ainda que ciente de estar há anos entre os últimos colocados do PISA e por isso ter ao longo dos últimos anos vivenciado iniciativas do MEC e das autoridades educacionais em seus estados e municípios visando melhorar a educação no país, continuar frequentando as derradeiras posições nestes levantamentos. Os dados do PISA e de outras pesquisas devem mobilizar tanto o MEC quanto todos os envolvidos diretamente no segmento educacional quanto a própria sociedade civil para que ações mais efetivas aconteçam e ajudem o país a sair do atoleiro em que se encontra no que tange a educação.

O que o professor Francesc Pedró levantou como questão importante sobre a qual temos que pensar e agir, destacado na frase que abre este texto, é que de tal modo os rankings ganharam força e presença nas últimas 2 décadas que estão sobrepujando seus motivos iniciais e, de certo modo, direcionando as políticas públicas educacionais a buscar, ansiosa ou até mesmo desesperadamente, resultados que qualifiquem seus países nesta corrida global.

Ganhar a corrida é consequência. Chegar entre os melhores é meta plausível. Não é este, no entanto, o grande propósito da ação educacional. É neste sentido que Pedró destacou a “avidez” das pessoas em comparar o desempenho de seus países com o de outras nações ou ainda como o surgimento do PISA mudou “as expectativas da opinião pública”.

Dados, métrica e rankings são apenas instrumentos. Devem orientar as discussões, permitir que com base nas informações disponíveis seja possível perceber quais são as ações mais prementes, as questões mais críticas e os projetos mais necessários para que a educação de fato melhore. As ações não podem, no entanto, se afastar da ideia de que o principal é, de fato, formar para a vida e não apenas para o mercado de trabalho, para a produtividade. O que se almeja é a formação que permita a criança, ao adolescente, ao jovem ou ao adulto perceber-se protagonista no mundo em que vive, no contexto específico de seu país, seja em que âmbito ou situação estiver, em casa, no trabalho, na sociedade.


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