De Olho na História
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

20 anos de internet no Brasil: E se a web fosse um cidadão de carne e osso, como seria sua breve história? - 06/05/2015
João Luís de Almeida Machado

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Imagine se a internet fosse como um ser humano, a incorporar ao longo dos anos as marcas do tempo, boas ou ruins, a sua jornada. Após 20 anos, pensando neste indivíduo hipotético como sendo brasileiro, o que poderíamos contar numa breve linha do tempo biográfica sobre este “cidadão”?

Antes do nascimento da web no país, entretanto, é importante salientar alguns passos preliminares, a saber: A ação conjunta da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), juntamente a organização norte-americana Bitnet, em 1981, foi um embrião das ações relacionadas a troca de informação eletrônica no país. Foi esta parceria que em 1990 deu a Fapesp papel importante no processo que daria ao país acesso à rede mundial de computadores. É também em 1990 que surge o WWW, ou a World Wide Web, criação de Tim Berners Lee , que mudaria totalmente o cenário do mundo virtual como o conhecíamos até então. No Brasil expandiu-se a ação com a entrada do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), no Rio de Janeiro neste início de década. Em 1992 já eram 11 capitais brasileiras atendidas por esta rede, de caráter científico e acadêmico, limitada principalmente ao envio de dados via e-mail. A mudança veio a partir de 1995, como veremos a seguir:

Registrou-se em 1º de maio de 1995 o “Nascimento” da Internet brasileira, que já veio ao mundo com aproximadamente 50 mil usuários, que antes circulavam por BBS (sigla para Bulletin Board System, antecessor deste novo cidadão). Além dos usuários de sistemas anteriores, 15 mil pretendentes a ter acesso a internet já haviam se cadastrado juntamente a Embratel (somente 250 foram inicialmente selecionados), responsável pela disponibilização deste novíssimo serviço.

Este nascimento foi assim percebido pela grande mídia naquela época, como podemos ver no trecho destacado deste artigo publicado pela Folha de São Paulo:

"Embora desconhecida pelo grande público, a rede Internet é responsável por um progresso científico considerável. Unifica dados e agiliza a colaboração entre universidades de muitos países. A relação de computador a computador possibilita o contato imediato entre cientistas que muitas vezes não teriam oportunidade de fazê-lo." (Conexão com o futuro. Editorial publicado pela Folha de São Paulo em 1º de maio de 1995).

Naquele movimentado mês de maio de 1995 entrou em uso o registro de endereços na internet brasileira, que apresenta o br ao final, como por exemplo em www.planetaeducacao.com.br. É como se tivesse ocorrido o registro em cartório do nascimento de uma criança, que deve ser feito poucos dias após ocorrido o parto.

Daqueles milhares de usuários iniciais que quiseram já em 1995 utilizar a internet no Brasil passamos hoje para um contexto em que perto de 120 milhões de brasileiros acessam a rede mundial de computadores.

Dos primeiros meses e anos, até o advento da banda larga em 2007, a internet funcionava apenas com conexão discada, conhecida como dial-up, que em seu princípio operava na velocidade máxima de 56 Kbps. O custo era por minuto e para baixar filmes (o que não ocorria no início pois estes serviços não estavam disponíveis), por exemplo, a demora seria superior a 24 horas!

Atualmente o serviço de internet no Brasil conta com tecnologias como a fibra ótica que permitem velocidades que são quase 60 vezes superiores ao início das ações da web no país. Ainda assim a rede brasileira está mal posicionada entre as diferentes provedoras de serviços no mundo na 89ª posição e a velocidade operacional muitas vezes (a maioria delas) não é aquela prometida pelas empresas que atendem a população brasileira.

Ainda em Maio de 1995 foi criado o CGI Br, ou seja, o Comitê Gestor da Internet no Brasil, órgão que conta com participantes da sociedade civil, empresas, 3º setor e governo com o intuito de regular a utilização da web no país. Seria como, na vida de uma criança, ter uma babá inicialmente e um tutor posteriormente a ajudar nos primeiros passos e na formação desta criança recém-nascida, em sua infância, adolescência...

Apesar do caráter livre da rede mundial de computadores, sem que ninguém possa ou deva interferir na comunicação, troca de ideias e ações gerais realizadas no mundo virtual, a criação do CGI Br teve o propósito de permitir que houvesse um acompanhamento saudável da internet no país. Mesmo em se considerando esta liberdade a que relacionamos a internet, o surgimento do WikiLeaks, os incidentes com o norte-americano Edward Snowden e até mesmo as desculpas do governo dos EUA em relação ao monitoramento da rede jogam por terra a compreensão de que o mundo virtual é totalmente livre como se pensava, seja onde for, inclusive no Brasil. Isso sem que pensemos, ainda, na ação deliberada de hackers e crackers a invadir sistemas, redes e computadores por conta própria ou contratados para tais fins por quem quer que se interesse por estes dados ou o monitoramento de dados via Big Data executado por empresas como o Google, a Amazon, a Apple, a Microsoft e tantas outras.

Ferramentas essenciais para que a internet pudesse ser lançada em escala comercial, como os navegadores e os comunicadores instantâneos estavam igualmente sendo pesquisados e desenvolvidos. Do Mosaic, passando pelo Netscape, Explorer, Firefox e chegando ao Chrome a evolução foi grandiosa, mas sem os primeiros programas que permitiam a navegação em rede e a troca de mensagens e arquivos, não seria possível estabelecer as bases da web no mundo e no Brasil.

Hoje prevalecem na comunicação via web no país o uso de dispositivos móveis que, em algumas regiões, como no Norte do país, utilizando as redes 3G e 4G (onde disponível), os smartphones são a principal via de comunicação pela internet para os brasileiros.

De qualquer modo, a incorporação da internet ao cotidiano do país fez com que se mudassem hábitos, formas de se relacionar, o modo como se estuda, o trabalho e tudo o que há ao nosso redor. Criaram-se inclusive, diferenciadores para caracterizar pessoas que nasceram antes e depois do advento da internet comercial. Quem nasceu a partir de 1995 é chamado de Nativo Digital. Pessoas que nasceram antes deste ano são conhecidas como Migrantes Digitais.

Este “cidadão”, como nestas linhas identificamos a internet, que está a completar 20 anos no Brasil, incorporou ganhos e também dificuldades, associadas principalmente ao excesso de uso e as dificuldades de sociabilidade. Está ainda sendo entendida e incorporada a vida de todos e, neste sentido, há muito o que aprender e fazer. O que sabemos é que daqui para frente será praticamente impossível, assim como irreversível, viver off-line, sem estar, em algum momento, de braços dados com a web.


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