Cinema na Educação
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Casanova e a Revolução(A Fuga de Varennes) - 09/06/2004
Quando tudo mudou por completo...

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A Revolução Francesa mudou a forma como o mundo se organizava de forma tão radical que poucos são aqueles que conseguem entender perfeitamente como era a vida no mundo antes da Queda da Bastilha. A mudança para o mundo contemporâneo não foi, porém, uma mudança ocorrida da noite para o dia. Como toda e qualquer alteração significativa, a Revolução foi produzida a partir da ruína progressiva e da ambição desmedida da nobreza instalada no poder nos principais países europeus entre os séculos XV e XVIII.

Querer simplificar o discurso a ponto de estabelecer as causas da revolução como originárias de falhas e erros de análise da nobreza significaria desmerecer estudos clássicos e recentes que tem esmiuçado a teia complexa de acontecimentos ocorridos antes e depois de 14 de julho de 1789.

Que tudo mudou muito, não há como negar. Idéias fundamentais que até aquele momento pareciam apenas teorias destinadas a mofar nos livros e nas estantes das ricas bibliotecas do clero, da nobreza ou da burguesia foram incorporadas ao cotidiano.

Como podemos negar, por exemplo, que Montesquieu está vivo nos sistemas políticos que adotaram sua proposta de três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário?

Como deixar de perceber que os privilégios concedidos a religiosos e nobres (como a isenção de impostos ou o acesso exclusivo a cargos públicos) são combatidos nas leis da maior parte dos países do mundo ocidental?

De que forma podemos ignorar que o conhecimento tem sido cada vez mais divulgado mundo afora a partir da proliferação dos meios de comunicação de massa, do crescimento do setor editorial e das pesquisas realizadas por laboratórios e universidades de diversos países, conforme haviam preconizado os vários autores que colaboraram para a elaboração da primeira “enciclopédia”, organizada sob a tutela de Diderot e D’Alembert?

Será possível viver atualmente sem o resguardo dos contratos sociais defendidos ardorosamente por Rousseau em sua clássica obra iluminista? Ou ainda que a educação pública não seja prioridade na maior parte dos países do dito mundo civilizado, de acordo com idéias do próprio Rousseau apresentadas em seu clássico título “O Emílio”?

Isso certamente nos permite dizer que somos contemporâneos desses pensadores e, particularmente, graças ao esforço dos revolucionários de 1789 que persistiram até 1799 em sua luta e que viram, ao longo desse período a traição do rei da França, Luís XVI, tentando fugir para a Áustria. Pois é essa sensacional história que nos é contada no cultuado filme do diretor italiano Ettore Scola, “Casanova e a Revolução – A Fuga de Varennes”. Confiram!

O Filme

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Paris, 6 de dezembro de 1791

Eles tomaram a ponte e o segundo salão. Nós obstruímos os portões, mas não pudemos segurá-los por muito tempo.
O Chão treme, tambores e mais tambores nas profundezas. Não podemos escapar. Uma sombra se move contra nós. Não podemos escapar. Eles estão vindo. Desta forma a Bastilha foi tomada pelo povo.

Será que isso acontecerá novamente, mas desta vez, contra nós?

Paris, 29 de dezembro de 1791

Você não sabe o que se sucede em nossas vidas! Ouvi boatos que o rei está fugindo daqui, está partindo em busca de apoio da Áustria. Acredito estarmos caminhando em direção a queda do império. E nossos privilégios? E nossos nomes? Ouvi dizer que o povo se rebelou contra nós. Eu não entendo o motivo de tanta reclamação, estou bem do jeito que vivo!
Estamos planejando partir rumo a Varennes. Receio que desta vez, a revolta do povo será tão grande que seria conveniente que partíssemos, antes que seja tarde demais.

Paris, 30 de dezembro de 1791

Escrevo ainda como se estivesse em Paris, pois saímos de viagem de madrugada e não temos a noção de onde estamos.
Os oficiais carregaram minha bagagem até a carruagem, porém fiz questão de levar eu mesma um pacote de extremo valor pessoal.
No momento em que estávamos todos prontos para partir, um senhor de baixa estatura, já de cabelos grisalhos nos abordou, justificando que também gostaria de partir conosco, seu nome era Bretonne de La Retiff. Um tanto quanto desagradável, perguntou o que eu carregava em minhas mãos. Eu, ofendida, lhe respondi que não lhe dizia respeito.
E assim, prosseguimos nossa viagem. Sem tal pessoa a nos acompanhar.

Paris, 31 de dezembro de 1791

Ao amanhecer de nosso segundo dia de viagem, acordamos ao pararmos numa cidadezinha de nome desconhecido, onde estamos? Num estábulo trocando os cavalos, para que nossa viagem prosseguisse mais rapidamente.
Ao continuarmos nossa jornada encontramos na estrada diversas caixas e, mais à frente, uma carruagem quebrada. Seu proprietário estava na companhia do Sr. Retiff. Ficamos comovidos com tal situação e decidimos oferecer uma carona a eles.
Mais tarde descobri que o nome do senhor que o acompanhava era famoso entre as mulheres, se tratava de ninguém menos que Casanova. Este roubou meu coração e nunca mais devolveu.
No decorrer de nossa jornada nos deparamos com vários camponeses, que ao nos ver, começaram a nos insultar, acreditando que o rei estava junto a nós.

Paris, 1° de Janeiro de 1792

Hoje, dia primeiro de janeiro, é o dia mais infeliz de minha vida. Por ironia do destino, o rei foi preso na divisa da França com a Áustria. Descobriram que ele era o rei por ter mãos tão delicadas (trabalhador de verdade tinha muitos calos em suas mãos), mais lisas que seda.

Paris, 2 de janeiro de 1792

Fui ao encontro de meu rei; somente pude ver seus pés, mas para mim, já era suficiente. Ao sair de lá, fui surpreendida com tanto desespero do povo. Eles me agarraram. Onde já se viu, um sangue azul ser tocado por pessoas de tão baixo nível, sujas...
Sai dali o mais rápido que pude. Fui direto para uma casa onde permitiram que eu ficasse durante algum tempo, pelo menos até que aquela multidão saísse das ruas.
Em respeito a meu rei, revelei o que trazia no pacote: seu traje e adereços. Vesti um manequim com suas roupas e, com orgulho, o reverenciei.
Tudo agora estava acabado. Como será, a partir de agora, a nossa vida? Já que seremos forçados a mudar o nosso modo de vida...

(Carta produzida por estudantes do 1º ano do ensino médio do Colégio Cecília Caçapava Conde
tendo como referência o estudo da Revolução Francesa e objeto de análise o filme
“Casanova e a Revolução – A Fuga de Varennes”, do diretor Ettore Scola).

Aos Professores

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1- Que tal verificar na prática a aplicação dos conceitos defendidos pelos filósofos iluministas?

a) Incentive os alunos a verificar como anda a educação pública. Para esse trabalho incentive-os a conhecer a realidade de outras escolas do município onde moram, preferencialmente em regiões rurais ou afastadas do centro. Entrevistas com professores, diretores, alunos; descrição dos ambientes e levantamento dos recursos disponíveis; fotografias das escolas visitadas (se possível); e consulta a revistas especializadas – são encaminhamentos interessantes para esse levantamento.
b) Programe visitas a câmara municipal e a prefeitura para que os alunos possam fazer anotações e entrevistas que elucidem o funcionamento dos poderes legislativo e executivo; Tentem também entrar em contato com a realidade do judiciário a nível local.
c) Examinem a constituição do nosso país para verificar direitos e deveres fundamentais. Divulguem para as outras turmas da escola as idéias consideradas primordiais pelos estudantes levantadas após essa pesquisa.

2- Montem um grupo teatral e proponham a transposição da história contada no filme de Ettore Scola para uma peça a ser montada e realizada pelos alunos com a supervisão e o apoio dos professores de áreas relacionadas (história, filosofia, sociologia, português, literatura e artes).

3- Depois de apresentar o filme aos alunos peça a eles que criem cartas (como documentos daquela época) em que contem detalhes da viagem imaginando-se como personagens da produção de Ettore Scola. Não deixe de alertar os estudantes quanto à visão diferenciada dos personagens, de acordo com a sua origem social (como pudemos ver no texto relativo ao filme, produzido por alunos do Ensino Médio, em que as autoras se colocaram no papel de uma das condessas em fuga).

Ficha Técnica

Casanova e a Revolução – A Fuga de Varennes
(La Nuit de Varennes)

País/Ano de produção: França/Itália, 1982
Duração/Gênero: 130 min., Drama
Direção de Ettore Scola
Roteiro de Catherine Rihoit e Sergio Amidei
Elenco: Marcello Mastroianni, Harvey Keitel, Hanna Schygulla, Jean-Louis Barrault,
Jean-Claude Brialy, Andréa Ferreol, Michel Bitold, Laura Betti, Pierre Malet.

Links

- http://www.imdb.com/title/tt0084423/ (em inglês)
- http://www.historianet.com.br/main/mostraconteudos.asp?conteudo=484

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2 COMENTÁRIOS

1 washington - teresina
vcs podem enviar este filme para o meu enderreço? e para um trabalho da escola. eu preciso muito o nome do filme e A Fuga de Varennes.
17/09/2010 09:11:25


2 Crisgaleote - S.Paulo
Gostei do comentario sobre o filme.
29/08/2007 14:11:09


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