Mais reflexão, menos medicamentos - 20/03/2015
Wanda Camargo
Os tempos atuais convidam a uma absurda medicalização da vida. Parecemos ter perdido a capacidade de enfrentar desde uma simples insônia, até as frustrações, tristezas, lutos ou perdas sem recurso ao uso indiscriminado de fármacos “anestésicos”.
Embora boa parte de nós reúna condições físicas e mentais de viver de modo pleno, estamos frágeis e não suportamos as dores, infelizmente parte natural da vida.
Cabe, nesse contexto, uma reflexão sobre as pessoas em formação escolar infantil ou juvenil que apresentam as chamadas dificuldades de aprendizagem, desatenções, agitação ou incapacidade de concentração, e que são apressadamente classificadas como portadoras de algum distúrbio psiconeurológico. Muitas vezes, sem a indispensável intervenção de um médico ou psicopedagogo, esses jovens recebem remédios desnecessários, que apresentam efeitos colaterais perigosos ou provocam dependência. O contrário também acontece, ou seja, adolescentes extremamente necessitados de cuidados médicos são taxados de difíceis, ou rebeldes, e abandonados à própria sorte; mostrando que identificar o problema não significa realizar um bom diagnóstico, atividade exclusiva de profissionais.
A percepção de um problema partirá mais comumente do professor, porem, diferenciar um sintoma passageiro de uma síndrome merecedora de cuidados não é para leigos. O que chamamos de dificuldades de aprendizagem abrange um largo espectro de ocorrências, dentro de um grupo heterogêneo de desordens durante a fase escolar: da aquisição e uso da fala, da audição, leitura ou escrita, envolvendo desde as deficiências mentais ou sensoriais, alterações emocionais passageiras ou graves, diferenças socioculturais, ou mesmo a simples ausência de oportunidades educativas.
Os desajustes de aprendizagem somente começaram a ser estudados nos anos 1960, e muitos deles ainda não são suficientemente compreendidos, principalmente os de origem não verbal, pois, no início, as pesquisas estiveram focadas na linguagem, com centro nas desordens da comunicação, voltadas a crianças com problemas na leitura ou nas operações aritméticas.
Os distúrbios de raciocínio, como transtornos de déficit de atenção e hiperatividade, são intrínsecos ao indivíduo, presumivelmente por disfunções do sistema nervoso central, merecem atenção clínica e tratamentos ao longo da vida; quando menos intensos, envolverão bom uso de material didático, metodologia de ensino adaptada a cada caso e acompanhamento constante dos progressos. Alguns deles, mais graves, serão atendidos por equipes multidisciplinares em instituições especializadas.
Embora muitos programas educacionais tenham sido eficientemente desenvolvidos para atender algumas especificidades, é indispensável ter consciência de que a empreitada é de longo prazo, e a assistência parental é fundamental; sabe-se hoje que muitos dos problemas podem ser originados inclusive pelas falhas de contato entre familiares e as crianças.
É importante lembrar que mesmo alunos com bom potencial intelectual podem revelar inabilidade para a aprendizagem numa determinada área, sem necessitar atenção especial para as demais, e que são muitos os desafios a serem vencidos para obtermos a completa inclusão dos jovens ao mundo do trabalho e da convivência social.
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