O que pensar das avaliações de sistema, externas? - 04/09/2013
Marcelo Nogueira
No último ano comecei a estudar e entender um pouco mais sobre sistemas e avaliação, avaliações externas (como queiram chamar) através do curso de Fundamentos da Avaliação de Sistemas e de Unidades Escolares da Faculdade de Educação da USP. O Professor Ocimar Munhoz Alavarse está propondo aos alunos – onde estou inserido – deste curso discussões em sala de aula e textos dos mais diversos ângulos e pensamentos sobre avaliações de sistema, sendo estes sugestões de leitura com o intuito de fundamentar mais sobre este tema que, ainda hoje, há muitos questionamentos de todas as instâncias envolvidas, sendo elas, alunos, professores, gestores escolares, avaliadores, órgãos públicos e privados entre outros.
Antes desse curso meu conhecimento sobre o tema avaliação estava na vivência diária dentro das escolas municipais de Taboão da Serra como Professor de Informática Educacional para alunos do fundamental I. Como estava inserido em um conteúdo complementar da grade curricular do município e não estava burocraticamente ligado à avaliação dos alunos, possuía uma visão mais externa de como os professores avaliavam os alunos e como os sistemas de avaliações se colocavam dentro da escola. Não presenciei ações diretas após o resultado de alguma avaliação externa, nem mesmo avaliações internas.
Segundo Nevo (1995) "[...] os avaliadores externos executam melhor a função de avaliação somativa", ou seja, é uma avaliação após os conteúdos trabalhados, para verificação do conteúdo aprendido. "Os avaliadores internos executam melhor a função de avaliação formativa", ou seja, há uma possibilidade de fazer correções durante o processo. Pode ser também que não tenha presenciado pelo fato de ter até aquele momento uma visão muito mais de aluno para esses processos do que professor propriamente dito.
Ainda trabalhando na Planeta Educação, uma empresa que vende soluções em educação, pude perceber que a avaliação dos programas comercializados para os clientes são muito importantes, pois como os clientes são em sua maioria prefeituras, os resultados quantitativos expressam politicamente bons retornos para a sociedade principalmente pelas avaliações de sistemas que estão bastante nas mídias. Com a teoria proposta no curso é possível agora entender um pouco mais da visão das instâncias envolvidas e a discussão de alguns educadores sobre esse tema.
Oliveira (2008) esclarece os conceitos de avaliação e medida. "O que temos no Brasil, com estas testagens são medidas de proficiência em algumas disciplinas. A avaliação consiste em um processo mais amplo que pode tomar a medida como uma de suas dimensões, mas se associa à elaboração de juízos de valor sobre a medida e a proposição de ações a partir dela." Percebi tal diferença na EMEF Amorim Lima, pois eles consideram, por exemplo, o Ideb – relação direta com a Prova Brasil – como um índice que não tem representatividade direta da proposta metodológica. Porém por ser uma escola ainda hoje em evidência, esse índice serve para vários educadores como uma avaliação, boa ou ruim, da metodologia adotada.
Alavarse (2011) traz a nós uma definição básica sobre avaliação educacional "[...] como um julgamento sobre algo – um objeto de avaliação – baseado em alguns critérios, com determinadas implicações, sendo possível identificar, [...] um conjunto de contribuições polêmicas relativas ao que se denominou avaliação de aprendizagem, via de regra, se está relacionada ao processo que resulta na produção de uma síntese avaliativa para cada aluno, [...]". Portanto dou certa razão à EMEF Amorim Lima, pois acredito que essas avaliações são uma síntese, o que não é possível definir se a escola é "boa" ou não. Primeiramente precisamos ter a ciência do que realmente estas avaliações de sistema indicam para assim, discutirmos como a escola entende os critérios da avaliação educacional, sendo eles relevantes ou não para ela.
Por outro lado, temos que ter conhecimento que algumas destas avaliações educacionais possuem técnicas para medir a proficiência do aluno. Por exemplo, existe a Teoria da Resposta ao Item (TRI) que, segundo Andrade (2010), "é um conjunto de modelos que relacionam a probabilidade de um aluno apresentar determinada resposta a um item com sua proficiência e com as características (parâmetros) do item." Há também o modelo de Rasch que, (Andrade 2010) "[...] o modelo logístico de dois parâmetros, e quando todos os itens possuem o mesmo parâmetro de discriminação temos o modelo logístico de um parâmetro [...]".
Quando tomamos conhecimento que estas avaliações de sistema são cuidadosamente pensadas (hoje consigo acreditar mais nisso) para que a medição seja a mais fidedigna do que se está medindo podemos, de fato, fazer uso para avaliar o objeto em questão. Porém Oliveira (2008) ressalta que "a primeira dificuldade para que tal processo se efetive decorre de uma questão de entendimento. As escalas elaboradas a partir das ferramentas mais modernas, [...] são incompreensíveis para os profissionais da educação." Sendo assim, apesar da Prova Brasil, por exemplo, existir desde 2005, estas avaliações de sistema ainda decorrem de dúvidas e desconfianças para as aplicações e resultados sempre que são apresentados, ou por razões políticas ou pelos exemplos citados acima.
Existe também outra razão dessa discussão que é de aplicar a mesma avaliação para alunos de diferentes classes sociais, ensino público ou privado, estrutura familiar, etc. Aqui no Brasil o regionalismo é considerado outro fator pertinente para essa "padronização" de avaliação. Alguns desses fatores podem influenciar direta ou indiretamente nos resultados, mas num artigo da além-mar – parceria com a revista portuguesa A página da Educação – (presença pedagógica – 2012) escrito por David Rodrigues, discute o conceito de equidade educativa e de como este conceito está diretamente ligado ao que chamamos de excelência na educação. Este artigo ressalta que "[...] se um sistema procurasse a qualidade teria que menosprezar a equidade e que, os sistemas educativos que valorizavam a equidade não poderiam atingir níveis de excelência." Observando mais uma vez as técnicas que possuem as a criação das avaliações o artigo ressalta que o PISA (Programme for International Student Assessment) consegue levantar informações dos países com os melhores índices são os mesmos que tem a maior equidade educativa. É uma informação interessante ao passo que o artigo conceitua três aspectos para essa equidade sendo: equidade no acesso, equidade de oferta educativa e equidade de resultados. A primeira trata, em linhas gerais, da inclusão e de locais menos assistidos pelos governos. A segunda é ofertar a mesma oportunidade para todos quanto ao currículo assim como estratégias e oportunidades de aprendizagem semelhantes e a terceira (a mais interessante) é de não se conformar que a escola terá insucessos, mas de tentar o possível para que se consiga, não na igualdade de resultados, mas sim na igualdade de desenvolvimento das suas capacidades múltiplas.
Trazendo a segunda equidade para o cenário brasileiro, há quem acredita da necessidade de uma padronização do currículo nacional para a educação básica. Por exemplo, Priscila Cruz escreveu um artigo para o Jornal Folha de São Paulo (09/2012) onde "O currículo nacional é o conjunto de aprendizagens que devem ser comuns a todos os alunos, seja porque são universais (a aritmética, as leis básicas da natureza, etc.) ou porque dizem respeito a nossa identidade brasileira (o estudo dos ecossistemas brasileiros, a nossa história, etc.)".
Por outro lado, observando a dimensão do Brasil, ter um currículo nacional pode promover a injustiça ao tratar o diferente como igual e, assim torná-lo também desigual. Oliveira (09/2012) afirma que "É com a liberdade de cada escola elaborar seu projeto pedagógico, acolhendo os sujeitos que dela participam, que a educação vai se tornando ato de liberdade e instrumento da democracia".
Acredito numa educação democrática onde a gestão escolar, juntamente com a comunidade escolar (através dos seus conselhos de escola), possa promover o que acreditam ser a melhor proposta e metodologia educacional. Mas também um norte, um padrão mínimo precisa ser estabelecido regionalmente ou nacionalmente, para podermos assegurar basicamente um currículo que possa atender a necessidade do aluno e a necessidade da sociedade.
Fischer (2011), em seu artigo no jornal O Globo, ressalta a questão entre currículo e a avaliação externa que hoje serve também para ingresso nas universidades, o Enem. "O que cai no vestibular entra no programa de ensino da escola; o que não cai, deixa de existir, com raríssimas exceções". Hoje é possível perceber que o processo está invertido. As avaliações externas estão determinando os currículos das escolas. Fischer destaca a literatura cobrada no Enem que, a seu ver, iguala poemas de Drummond a uma reportagem de jornal. Ou seja, estamos apenas tratando o currículo como uma proposta técnica de aprendizagem e não a sua essência ao qual foi desenvolvida ao longo dos anos. Assim sendo, entendo que o prazer por conhecer o que é desconhecido ou pouco explorado acaba a partir do momento que se torna uma obrigação para um acesso ao ensino superior, por exemplo.
Oliveira (2012) presidente do Instituto Alfa e Beto destaca em seu artigo para o jornal o Estado de São Paulo quatro lições importantes de reformas educativas internacionais. Uma delas é assegurar a alfabetização dos alunos até o final do 1º ano. Pensando que hoje na educação brasileira em geral os alunos do 1º ano tem 6 anos, assegurar isso é um pouco agressivo e, complementando com a ideia de Fischer, desde os primeiros anos da vida escolar, já estamos ignorando o tempo e o processo, consequentemente, o prazer por querer aprender.
É verdade que percebemos um aumento considerável nos investimentos do governo para a educação. Na última década tivemos um aumento de 57% de recursos para a educação, mas ainda os índices não são os esperados. E não alcançaremos se ainda continuarmos tratando os resultados das avaliações como as principais metas, e esquecermos que nosso objeto de avaliação são alunos, seres humanos, tão complexos como nós, os julgadores dos resultados que encontramos. (Nevo 1995) "Provavelmente, a escola jamais será um bom cliente da avaliação, a menos que comece a fazer a avaliação, tornando-se um parceiro igual no diálogo para o aprimoramento escolar. [...] alunos, professores e administradores escolares devem transformar-se em participantes ativos dos diálogos de avaliação, em vez de continuarem sendo recipientes passivos das descrições e dos julgamentos oriundos das avaliações.".
Se entendermos que já estamos achando o norte para uma qualidade na educação, mas que para isso precisamos principalmente, saber trabalhar e usar as informações que coletamos, sejam elas de qualquer meio, e estabelecer verdadeiros diálogos com essas informações de cada envolvido nesse processo, será uma consequência melhorarmos esses índices e, de fato, melhorarmos a qualidade e a notoriedade que queremos.
Referências Bibliográficas
ANDRADE, Dalton Francisco de. A Teoria da Resposta ao Item (TRI). Avalia em Ação: ensinar com qualidade e valores, São Paulo, n. 3, p. 26-27, 2010.
ALAVARSE, Ocimar Munhoz. Avaliações internas e externas na educação básica: características e possíveis articulações. Trabalho apresentado no Curso para Formação de Tutores da Rede Estadual de Goiás. Goiânia. 12 dez. 2011.
CRUZ, Priscila. OLIVEIRA, Dalila Andrade. O Brasil deve adotar um currículo nacional único para a educação básica? Folha de São Paulo, São Paulo, p. A3, 15 set. 2012.
FISCHER, Luís Augusto. Não cai no Enem. O Globo, Rio de Janeiro, p. 8, 13 ago. 2011.
JIMENES, Gabriele. E a conta não fechou. Veja, São Paulo, p. 100, 19 set. 2012.
NEVO, David. Avaliação por diálogos: uma contribuição possível para o aprimoramento escolar. In: TIANA, Alejandro (Coord.). Anais do Seminário Internacional de Avaliação Educacional, 1 a 3 de dezembro de 1997. Tradução de John Stephen Morris. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), 1998. 165 p. p. 89-97.
OLIVEIRA, João Batista Araújo e. Prova Brasil: novos resultados, velhas mazelas. O Estado de São Paulo, São Paulo, p. A2, 03 set. 2012.
OLIVEIRA, Romualdo Portela de. Avaliações externas podem auxiliar o trabalho pedagógico da escola? In: EDUCAÇÃO: fazer e aprender na cidade de São Paulo. São Paulo: Fundação Padre Anchieta, 2008. 240 p. p. 230-237.
RODRIGUES, David. Equidade educativa: em busca da excelência para todos. Presença Pedagógica, Belo Horizonte, v. 18, n. 104, p. 34-36, mar./abr. 2012.
# Artigo: CONAE 2014: onde estamos e onde precisamos chegar!
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1 João Carlos Reginaldo Nogueira - São Paulo
Educação com qualidade
12/09/2013 22:42:34
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