Universo Escolar
Wanda Camargo é educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil.

Doentes, médicos, docentes - 29/08/2013
Wanda Camargo

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Foto de borboleta doente

A vinda de médicos cubanos ao Brasil gerou reações variadas: o justo alívio das populações desassistidas por médicos de qualquer nacionalidade, a preocupação legítima com as credenciais desses profissionais, a preocupação não tão legítima com a manutenção de um imenso mercado em reserva. Independente da opinião que se tenha, assoma o tema incontornável da legalidade da contratação e da forma de pagamento.

O governo cubano receberá pagamento por meio de uma triangulação com a Organização Pan-americana da Saúde, repassará aos médicos um valor entre 25 e 40% do recebido, apenas após o retorno e pelo menos dois anos de trabalho; segundo alega, isso seria para compensar a formação gratuita recebida. Familiares dos médicos não poderão acompanha-los, ou mesmo visita-los, permanecendo na ilha como garantia de que a saudade impedirá veleidades de solicitar asilo político. Precaução excessiva, pois o governo brasileiro já afirmou que não concederá tal asilo, esquecido de que é falta de educação negar o que ainda não foi pedido.

Apesar de apenas agora estar em destaque, a questão é antiga, há pelo menos vinte anos professores cubanos trabalham no Brasil em regime semelhante; geralmente tem doutorados de qualidade, e agregam valor acadêmico significativo às escolas que os recebem. As instituições mais solidárias cobrem suas despesas com moradia e parte da alimentação, mas isso não é regra geral. Os colegas brasileiros convivem harmoniosamente com eles, constatando as dificuldades que enfrentam para sobreviver em outro país com apenas uma ínfima parcela do salário. A afirmação de que a remuneração é “igual à que recebem em Cuba” chega às raias da ofensa, como se o gasto aqui fosse idêntico ao de lá.

Ilustração de coração O tema chega agora à discussão, em grande parte por dizer respeito aos médicos, mas é importante que se considere também professores e outros profissionais; afinal o Brasil tem uma legislação trabalhista que deve garantir os mesmos direitos a todos, independente da nacionalidade. O fato atual parece ter mais visibilidade, provocando um debate que há muito precisava ser enfrentado pelos brasileiros, independente de possibilidade da vinda deste momento poder ter sido orquestrada há muito tempo ou não: é indispensável saber se direitos, trabalhistas e humanos, são ou não para valer. Já faz tempo, a suspeita é de que o discurso parece bonito, recoberto com fina camada de verniz, a qual, levemente arranhada, revela apenas marketing sem embasamento na realidade.

Quanto aos profissionais do magistério, inúmeros pesquisadores, tal como o educador português António Nóvoa, desde muito alertam para a necessidade de que estejam mais presentes nos meios de comunicação, levando a público os problemas e necessidades que enfrentam. Sem voz, o professor não será ouvido quanto à baixa qualidade da infraestrutura a seu dispor, em escolas sem equipamentos de lazer, muitas vezes sem sequer uma biblioteca.

Destituído do respeito da comunidade, professores perdem a autoridade em sala de aula, embora necessitem atuar no enfrentamento das graves questões sociais e familiares, cada vez mais terceirizadas para a escola. Deles se espera tudo, mas o que é oferecido em troca é quase nada.


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