O Regional: Quando
falamos em educação de crianças, qual
a melhor forma dos pais agirem?
Erika
de Souza Bueno: Sem
dúvida, pelo exemplo. Famílias que mandam de um
jeito e agem de modo diferente de suas instruções
à criança, certamente, tendem a não
ter sucesso em suas intervenções, pois
é um caminho ilógico que, a qualquer momento,
poderá despertar sentimentos de injustiça e
revolta nos próprios filhos. Se uma criança sofre
algum tipo de castigo por ter insultado um colega de classe, mas
vê as pessoas de sua própria família
tratando-se grosserias e falta de educação,
qualquer tentativa de corrigir esse mau comportamento dela
não terá o menor fundamento, ou seja,
não terá base sólida e,
consequentemente, poderá não surtir nenhum efeito
positivo. Se forem oferecidos às crianças
materiais incoerentes às boas e desejáveis
instruções que os pais lhes fornecem, eles
terão um inimigo muito grande dentro da própria
casa, um inimigo em cores, com brilho, glamour e tantos outros
atrativos. Ainda bem que todos nós tem
O
Regional: Bater
não educa?
Erika
de Souza Bueno: É
pior do que isso. A violência ensina muito a qualquer pessoa.
Nossos filhos, em especial, aprendem que ela é um meio
rápido de conter os ânimos de alguém
incômodo. Também podem aprender que ela
é usada quando falta capacidade de
argumentação, de humor ou compreensão.
Por isso e por tantos outros motivos, a família precisa se
certificar sobre o que estarão ensinando, de fato,
à criança se optarem pelo castigo corporal.
É como uma mensagem malpassada, na qual o
destinatário (a criança) não capta com
eficiência as informações do remetente
(a família). Como ensinamos pelo exemplo, não
fica nada bem agirmos de modo violento, mesmo se as
intenções forem as melhores. Além
disso, até quando os pais terão
condições físicas para conter seus
filhos por meio da força do próprio
braço?
O
Regional: O que as
agressões, mesmo que sejam leves, podem causar
psicologicamente nas crianças?
Erika
de Souza Bueno: Primeiramente,
uma agressão não é leve e nem pesada
no sentido literal da palavra, pois o que mais pesa é o
impacto psicológico que será causado. Um dos
grandes prejuízos causados à criança
se dá quando ela perceber as “armas” que
sua família usa para corrigi-la. Entre essas armas, a
criança poderá identificar a vergonha e a
humilhação, dado que são esses os
sentimentos que a invadem a cada novo castigo corporal. Longe dos pais,
no seu relacionamento com outras crianças ou adultos, ela
poderá ver-se diante de muitas
situações em desacordo com suas vontades e
desejos, o que acontece naturalmente todos os dias. Nesses momentos, a
criança sentirá os reflexos
psicológicos do que ficou em si ao ter apanhado de seus
pais, podendo adotar comportamentos muito semelhantes ao que vive
dentro de casa. É importante pontuar que violência
física também causa medo e traumas, sentimentos
estes que inibem e contêm muitas pessoas. Contudo,
não é bom para ninguém que nossas
crianças utilizem esses métodos, mas que aprendam
a defender-se também pela
argumentação, uma ferramenta que pode ser usada
pelos pais no lugar do castigo físico.
O
Regional: Elas entendem que
isso realmente é para que não façam o
que os pais não querem?
Erika
de Souza Bueno: Existe,
nesse ponto, um porquê, ou seja, a criança que
apanha de seus pais entenderá que não
é mais para agir de um determinado modo PORQUE, caso
contrário, vai apanhar novamente. Contudo, essa
razão que a motiva a não repetir uma birra, uma
“arte” ou algo semelhante não
é suficiente para promover uma
educação adequada a elas. Queremos acreditar que
as orientações aos nossos filhos vão
com eles em todos os lugares e tempos, mas, infelizmente, tendemos a
não querer pensar que castigos físicos demasiados
também podem deixar marcas seríssimas que eles
poderão carregar por toda a vida.
O
Regional: Quando falamos em
violência e, hoje em dia, os pais estão muito
preocupados com o comportamento e as possibilidades dos filhos
futuramente agirem com desrespeito a outras pessoas ou partirem para o
mundo do crime, por exemplo, existe algo que pode ser feito enquanto
são pequenos? Algo que eles possam carregar pela vida toda?
Erika
de Souza Bueno: Busque
conseguir ter tempo de qualidade com seus filhos. Faça
diferente da maioria e marque um bate-papo semanal com cada um deles,
momento em que você poderá identificar os
pensamentos que eles têm tido a tempo de poder
“aparar as arestas”. Lembre-se que, como pais,
não somos perfeitos e podemos cometer erros a qualquer
momento. Por isso, não deixe acumular dentro de seus filhos
palavras que foram proferidas equivocadamente. Dialogue, argumente,
leia sobre os assuntos que seu filho gosta, de modo a ter
conteúdos para tentar se aproximar mais deles. O Regional -
Qual o papel da escola na educação de
crianças?
O
Regional: Pergunto isso
porque muitos pais acreditam que a educação
é só na escola e não tem a
obrigação de orientá-los.
Erika
de Souza Bueno: A escola
é o lugar em que a educação recebida
em casa é percebida com mais clareza, mas não
seria correto dizermos que somente a família é a
responsável, pois muito do comportamento da
criança ficará evidente apenas no contato com o
meio escolar, ocasião em que a escola também
fará seu papel de orientação
também nesse quesito.
O
Regional: Problemas
familiares, principalmente entre os pais da criança, podem
interferir na educação?
Erika
de Souza Bueno: Toda
criança tem sua família como seu maior exemplo de
vida. Há algumas medidas que podem ser tomadas para
não manchar essa belíssima fase da vida humana, a
infância. Mesmo separados, os pais podem entrar em acordo
quanto à educação dos filhos em comum.
Se isso não for possível, pelo menos uma das
partes terá que adotar uma atitude mais madura e consciente,
tentando sempre estabelecer uma ponte segura entre um e outro. Logo,
falar mal do pai ou mãe da criança não
é uma atitude louvável, bem como discutir
agressivamente na presença dela. Além disso, as
frustrações oriundas do fracasso do
relacionamento não podem ser transferidas aos filhos, dado
que eles ainda anseiam e necessitam ter pai e mãe, mesmo que
separados, como sua maior referência de vida.
O
Regional: Como evitar a
violência, seja pela televisão ou jogos infantis
que a estimulam, sem privá-los do direito de conhecer, ter
acesso a estes meios de integração tão
normais em qualquer sociedade?
Erika
de Souza Bueno: Em primeiro
lugar, toda família precisa ter consciência quanto
à faixa etária expressa em novelas,
séries, filmes e jogos de videogame, bem como em revistas e
afins. Observada essa primeira orientação, a
família também terá que respeitar os
limites de seus filhos, sabendo que eles, principalmente diante de
muitas novelas e filmes, estarão sendo manipulados a todo o
momento. Prova disso é o que acontece conosco mesmo ao
assistirmos a um episódio em que o vilão age
negativamente contra o protagonista, fazendo arder em nós
desejos de justiça a qualquer preço, mesmo que
esse preço seja ver o personagem do mal sofrendo os piores
castigos que se pode imaginar. Se nós, como adultos,
já nos deixamos influenciar a esse ponto com algum
estímulo externo como nesse exemplo, imagine o que ocorre no
subconsciente da criança, dos nossos filhos. Impedi-los de
assistir a algo inapropriado à idade deles é uma
atitude de respeito, mas, no dia a dia, eles vão viver
situações que, dependendo da
intervenção da família, podem
prepará-los ou não para a vida. Assim, sempre que
possível, dê atenção a tudo
o que seu filho fala, bem como nas brincadeiras e nos
conteúdos que ele está buscando na Internet,
televisão e videogame. A partir dessa
identificação, antes de simplesmente proibi-lo de
continuar se expondo a tais materiais, faça perguntas do
tipo “o que você acha disso?”,
“acha que o personagem x agiu de modo correto?”,
“por que o personagem do jogo matou o outro?”,
entre tantas outras possibilidades. Com esse contato, você,
como pai ou mãe, aumenta seu cuidado com a
segurança de cada um de seus filhos.
O
Regional: Como lidar com a
quantidade de informações que recebem por meio da
internet?
Erika
de Souza Bueno: Há
alguns recursos tecnológicos que você pode usar
para filtrar o que seu filho está tendo acesso por meio da
Internet, mas, apesar de eu os considerar eficientes, eles
não substituem os cuidados quanto à
orientação que todos nós, como pais e
professores, precisamos oferecer às nossas
crianças. Impedir por completo o uso da Internet
não tem muito sentido, pois ela é apenas o
reflexo do que acontece no mundo e, cedo ou tarde, a criança
poderá ter contato com alguém que, infelizmente,
age de um modo que vá contra aos bons conceitos que queremos
que ela tenha. Dessa forma, a melhor forma para lidar com tudo isso
é pelo caminho do contato, da
aproximação. Uma família que
está atenta à educação de
seus filhos não terá grandes dificuldades para
perceber qualquer mudança no comportamento deles.
Fonte da Entrevista:
http://www.oregional.com.br/portal/detalhe-noticia.asp?Not=298539
Fonte
do artigo que motivou a entrevista: http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=2404