Palavras que Encantam - 06/08/2012
Reflexão e Envolvimento de Carlos Drummond de Andrade
“Quero
que todos os dias do ano, todos os dias da vida, de meia em meia hora,
de 5 em
5 minutos me digas: Eu te amo.
Ouvindo-te
dizer “eu te amo”, creio, no momento, que sou
amado. No momento anterior e no
seguinte, como sabê-lo?
Quero
que me repitas até a exaustão que me amas, que me
amas, que me amas. Do
contrário, evapora-se a amação, pois
ao não dizer “eu te amo”, desmentes,
apagas
teu amor por mim.
Exijo
de ti o perene comunicado. Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez
mais.
Quero
ser amado por e em tua palavra. Não sei de outra maneira a
não ser esta de
reconhecer o dom amoroso, a perfeita maneira de saber-se amado: amor na
raiz da
palavra e na sua emissão, amor saltando da língua
nacional, amor feito som, vibração
espacial.
No
momento em que não me dizes “eu te amo”,
inexoravelmente sei que deixaste de
amar-me, que nunca me amastes antes.
Se não me disseres urgente repetido “eu te amo, amo, amo, amo, amo”, verdade fulminante que acabas de desentranhar, eu me precipito no caos, essa coleção de objetos de não amor.”
Quero, Carlos Drummond de Andrade
Há
pessoas que
acham esses versos antiquados, pois, cercadas de belas palavras,
acreditaram,
confiaram e, infelizmente, iludiram-se em algum momento de suas vidas.
É
fato que palavras
desacompanhadas de ações que as comprovem
tornam-se ineficientes, mas a família
e a escola, também formadoras da sociedade, não
podem deixar de abordar o
encanto que elas exercem na vida das pessoas.
Em
muitas circunstâncias,
nossos filhos e alunos terão diante de si apenas um recurso
ao próprio favor:
as palavras.
Pesados
no falar,
sem saber tratá-las, desconhecendo os métodos de
como desenhá-las para deixar o
argumento mais belo, leve e possível de ser digerido pelo
receptor, nossas
crianças, num futuro cada vez mais próximo,
poderão se ver em “maus
lençóis”.
Assim
como nas
palavras de Drummond, o mundo em geral anseia por ter por perto pessoas
que sabem
aliar o conhecimento (e a disposição em
usá-lo) aos encantos de palavras que o
moldem, tal como matéria-prima nas mãos de um
artista.
Acredite,
de pouco
adianta saber fazer muito, mas não saber apresentar esse
conhecimento, as
portas se fecham e as oportunidades, infelizmente, evaporam-se.
Há
quem diga
que as palavras são o toque final, o moranguinho que o
confeiteiro usa para decorar
um delicioso bolo de aniversário.
Contudo,
as
palavras são mais do que isso, elas são, no
exemplo utilizado, a possibilidade
que o profissional tem para conseguir permissão de mostrar o
que sabe fazer.
Gírias
fora de
um contexto adequado ou palavras de baixo calão em qualquer
contexto podem
acabar, definitivamente, com a possibilidade que qualquer de
nós teria de apresentar
seus conhecimentos.
Provam
isso
aqueles que precisam ou, como muitos de nossos alunos e filhos
futuramente, precisarão
passar num processo seletivo para conseguir um emprego.
É
indiscutível
como um vocabulário regrado, bem-colocado pode favorecer um
candidato a uma
determinada vaga no competitivo mercado de trabalho.
Dessa
forma, o
contexto romântico apresentado por Drummond revela, entre
tantas outras
possibilidades de interpretação, a expectativa
que o mundo tem de ser
surpreendido por pessoas que saibam unir o abstrato e o concreto, o
visível e o
audível, a sensibilidade e a força.
Será
que as
famílias e as escolas têm conseguido encantar
nossas crianças e jovens quanto
ao bom trato com as palavras? Será que, como pais e
professores, temos sido, de
fato, habilidosos no uso da fala?
É
necessário
mais envolvimento, mais ternura e mais vontade, pois, do
contrário, “precipita-se
no caos, essa coleção de objetos de
não amor”.
Assim,
lance
mão dos conselhos do poeta que, em outra ocasião,
disse: “Penetra surdamente no
reino das palavras. Lá estão os poemas que
esperam ser escritos. Estão
paralisados, mas não há desespero, há
calma e frescura na superfície intata”.
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