A Semana - Opiniões
Erika de Souza Bueno Coordenadora Educacional da empresa Planeta Educação; Professora e consultora de Língua Portuguesa pela Universidade Metodista de São Paulo; Articulista sobre assuntos de língua portuguesa, educação e família; Editora do Portal Planeta Educação (www.planetaeducacao.com.br). E-mail: erika.bueno@fk1.com.br

Palavras que Encantam - 06/08/2012
Reflexão e Envolvimento de Carlos Drummond de Andrade

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“Quero que todos os dias do ano, todos os dias da vida, de meia em meia hora, de 5 em 5 minutos me digas: Eu te amo.

Ouvindo-te dizer “eu te amo”, creio, no momento, que sou amado. No momento anterior e no seguinte, como sabê-lo?

Quero que me repitas até a exaustão que me amas, que me amas, que me amas. Do contrário, evapora-se a amação, pois ao não dizer “eu te amo”, desmentes, apagas teu amor por mim.

Exijo de ti o perene comunicado. Não exijo senão isto, isto sempre, isto cada vez mais.

Quero ser amado por e em tua palavra. Não sei de outra maneira a não ser esta de reconhecer o dom amoroso, a perfeita maneira de saber-se amado: amor na raiz da palavra e na sua emissão, amor saltando da língua nacional, amor feito som, vibração espacial.

No momento em que não me dizes “eu te amo”, inexoravelmente sei que deixaste de amar-me, que nunca me amastes antes.

Se não me disseres urgente repetido “eu te amo, amo, amo, amo, amo”, verdade fulminante que acabas de desentranhar, eu me precipito no caos, essa coleção de objetos de não amor.”

Quero, Carlos Drummond de Andrade

Há pessoas que acham esses versos antiquados, pois, cercadas de belas palavras, acreditaram, confiaram e, infelizmente, iludiram-se em algum momento de suas vidas.

É fato que palavras desacompanhadas de ações que as comprovem tornam-se ineficientes, mas a família e a escola, também formadoras da sociedade, não podem deixar de abordar o encanto que elas exercem na vida das pessoas.

Em muitas circunstâncias, nossos filhos e alunos terão diante de si apenas um recurso ao próprio favor: as palavras.

Pesados no falar, sem saber tratá-las, desconhecendo os métodos de como desenhá-las para deixar o argumento mais belo, leve e possível de ser digerido pelo receptor, nossas crianças, num futuro cada vez mais próximo, poderão se ver em “maus lençóis”.

Assim como nas palavras de Drummond, o mundo em geral anseia por ter por perto pessoas que sabem aliar o conhecimento (e a disposição em usá-lo) aos encantos de palavras que o moldem, tal como matéria-prima nas mãos de um artista.

Acredite, de pouco adianta saber fazer muito, mas não saber apresentar esse conhecimento, as portas se fecham e as oportunidades, infelizmente, evaporam-se.

Há quem diga que as palavras são o toque final, o moranguinho que o confeiteiro usa para decorar um delicioso bolo de aniversário.

Contudo, as palavras são mais do que isso, elas são, no exemplo utilizado, a possibilidade que o profissional tem para conseguir permissão de mostrar o que sabe fazer.

Gírias fora de um contexto adequado ou palavras de baixo calão em qualquer contexto podem acabar, definitivamente, com a possibilidade que qualquer de nós teria de apresentar seus conhecimentos.

Provam isso aqueles que precisam ou, como muitos de nossos alunos e filhos futuramente, precisarão passar num processo seletivo para conseguir um emprego.

É indiscutível como um vocabulário regrado, bem-colocado pode favorecer um candidato a uma determinada vaga no competitivo mercado de trabalho.

Dessa forma, o contexto romântico apresentado por Drummond revela, entre tantas outras possibilidades de interpretação, a expectativa que o mundo tem de ser surpreendido por pessoas que saibam unir o abstrato e o concreto, o visível e o audível, a sensibilidade e a força.

Será que as famílias e as escolas têm conseguido encantar nossas crianças e jovens quanto ao bom trato com as palavras? Será que, como pais e professores, temos sido, de fato, habilidosos no uso da fala?

É necessário mais envolvimento, mais ternura e mais vontade, pois, do contrário, “precipita-se no caos, essa coleção de objetos de não amor”.

Assim, lance mão dos conselhos do poeta que, em outra ocasião, disse: “Penetra surdamente no reino das palavras. Lá estão os poemas que esperam ser escritos. Estão paralisados, mas não há desespero, há calma e frescura na superfície intata”.

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