Brasileiros
dedicados à pichação foram convidados
para apresentar-se em atividade didática na Bienal de
Berlim, que tem como título de sua sétima
edição “Forget Fear”
(esqueça o medo).
Levando a sério o nome e finalidade, envolveram-se em
confusão com os organizadores, da qual resultou a
pichação do próprio curador da mostra.
A mostra berlinense pretende caracterizar-se pela ousadia de sua
curadoria, mas se esquece de que, segundo a palavra dos brasileiros,
“pichação só acontece pela
transgressão e no contexto da rua”.
O fato nos remete à questão do modelo
passível de inspiração do jovem, ideal
no seu processo educativo, e a grande crise de autoridade em que nos
encontramos hoje.
Por características inerentes à
própria faixa etária, as novas
gerações tendem a rejeitar comportamentos e
valores do “mundo adulto”; seu desejo juvenil de
autonomia, igualdade e liberdade opõe-se à
manutenção da ordem social.
A cultura dominante não é a sua e esta realidade
molda suas expectativas de certo e errado, vindo a constituir as
representações e sentidos do mundo que o cerca.
No entanto, o senso de respeito pela autoridade é um dos
pilares da convivência comunitária.
Quando o entorno parece valorizar muito mais a esperteza que a
inteligência, a sorte que o estudo, o jeitinho que a
dedicação, os confrontos entre os limites
teóricos ou práticos da
transgressão só podem mesmo explodir em tinta.
Normalmente, é no âmbito da escola que esta
oposição apresenta sua face mais contundente,
já que o professor costuma ser identificado com todo o
autoritarismo vigente; educadores são considerados
– e com razão – representantes da
cultura estabelecida, e advém disso serem também
julgados porta-vozes de valores antiquados, quando não
hipócritas.
É indispensável ver o jovem como produtor de
conhecimento e subjetividade, um ser em formação
que merece respeito e consideração; no entanto,
educadores, com certa frequência, sentem-se fragilizados e em
situações de conflito.
A crescente ignorância das regras básicas de
convivência social, a agressão verbal por parte
dos seus alunos e a dificuldade de compartilhamento de
códigos têm levado alguns a temer pela
própria integridade física, provocando seu
afastamento emocional do processo educativo, tornando-os meros
ministrantes de conteúdos pelos quais muito poucos
demonstram qualquer interesse.
Diante do oferecido pela internet, mídias sociais ou
até pelas ruas, em instalações muitas
vezes com má estrutura física e
pedagógica, com magistério desvalorizado e
desmotivado como profissão – em que pesa ainda
existirem alguns ótimos professores –, a escola
deixa de ser uma boa opção para a
formação.
Em outros tempos, possivelmente a construção da
identidade do jovem seria feita pelo trabalho, e a
transgressão seria mantida no campo mais conceitual.
Atualmente, os jovens reclamam para si uma maior parcela de prazer e a
infração à regra torna-se mais
literal, mais concreta, o que obriga a autoridade educacional a
legitimar-se por meio de projetos menos ingênuos e mais
refletidos. Esquecer o medo não é apenas um
sugestivo slogan.
Wanda
Camargo é
educadora e presidente da Comissão do Processo Seletivo das
Faculdades Integradas do Brasil (UniBrasil).