Lisbela e o Prisioneiro - 12/03/2004
Rir para não chorar
O Brasil é um país divertido e os brasileiros sabem muito bem disso. Tanto é que é comum rirmos de nós mesmos. É mais que usual que satirizemos nossas próprias deficiências e que façamos de nossa suposta esperteza alvo de uma caricatura por vezes muito cruel. Acredito que até mesmo essa nossa capacidade de contar piadas e dar muitas risadas de nossos próprios infortúnios é comprovação de que somos abençoados por Deus.
Em que outra parte do mundo existem histórias tão deliciosamente marotas quanto “Lisbela e o Prisioneiro”? Tudo no filme parece alegórico, tudo soa falso e, apesar disso, nos vemos na tela.
Percebemos o Brasil nas cidades por onde anda Leléu (Selton Mello, comprovando mais uma vez seu grande talento cômico). Sentimos que a mocinha Lisbela (Débora Falabella, em atuação exemplar) se parece tanto com nossas filhas, irmãs, primas ou sobrinhas (especialmente se elas moram no interior e Têm como características toda aquela candura, aquela ingenuidade).
Quantas não são as histórias de matadores de aluguel (como o sanguinário Frederico Evandro, vivido pelo ótimo Marco Nanini) que já lemos nos jornais de nosso país. Até a polícia, satirizada na pele de alguns personagens, não parece muito diferente daquilo que vemos em pequenos povoados interioranos.
É nesse ponto que percebemos que o maior mérito do filme reside na capacidade incrível que temos de contar histórias, de divertir, de ensinar a partir da observação do cotidiano. Guel Arraes, mais conhecido por suas produções para a televisão, retorna aos cinemas e novamente faz sucesso contando a história de gente simples, de pequenas cidades do interior de nosso país, apaixonadas pela vida, freqüentadoras de cinemas, que sonham de olhos abertos diante das imagens projetadas nas telas.
Guel já havia nos dado outra grande contribuição para o rico momento que vive o cinema nacional com “O Auto da Compadecida” (também estrelado por Selton Mello, Marco Naninni e Virginia Cavendish); também é dele a produção “Caramuru – A Invenção do Brasil” (onde repete a parceria com Selton Mello).
Se você carrega consigo a essência da brasilidade, com certeza irá se identificar com “Lisbela e o Prisioneiro”, além disso, irá se divertir muito, dando boas gargalhadas com a trama. Mais um gol de placa do cinema nacional!
O Filme
Leléu (Selton Mello, impagável) é um notório malandro e trapaceiro que circula por pequenas cidades do interior do nordeste aplicando pequenos golpes e seduzindo muitas mulheres. Trafegando com sua equipada caminhonete, entra em determinados vilarejos como vendedor de tônicos que recuperam a virilidade dos homens, em outras como um místico que prevê o futuro ou ainda como artista mambembe, levando adiante encenações da “paixão de Cristo”.
Lisbela (Débora Falabella) é uma jovem e sonhadora moça do interior, filha de um delegado e noiva de um falastrão com sotaque carioca. Seu maior prazer é ir ao cinema, onde todas as semanas acompanha as comédias, dramas, romances e filmes de suspense que entram em cartaz. Tem tamanha ligação com cinema que é capaz de deduzir as tramas a partir de suas generalizações. Espera que sua vida seja como um dos vários filmes românticos que já assistiu.
Seus caminhos se cruzam quando Leléu passa pela cidade de Lisbela e estabelece uma atração exótica (Monga, a mulher-gorila) junto ao parque local. É o local onde seus destinos se cruzam e se entrelaçam para sempre. Nenhum obstáculo será capaz de impedir que o romance entre eles se desenlace, para sempre...
O problema é que entre eles há um casamento marcado, um matador corneado enfurecido (Frederico Evandro, vivido por Marco Nanini), uma outra mulher apaixonada por Leléu (Inaura, personagem de Virginia Cavendish), a força policial da cidade e alguns outros contratempos.
Além da trama muito bem costurada, da história engraçadíssima e dos atores inspiradíssimos em seus papéis, o filme tem ainda trilha sonora caprichada (a música título é de autoria de Caetano Veloso), edição qualificada e, o paralelo entre o que acontece na história de Lisbela e Leléu com os acontecimentos dos filmes assistidos pela personagem principal ao longo dos 105 minutos de projeção.
Para ser visto e revisto!
Aos Professores
1- Há na literatura nacional vários títulos que utilizam o humor como referência para falar sobre a realidade de nosso país. Alguns autores, de forma irônica, utilizam figuras marginalizadas de nossa sociedade como malandros, prostitutas, matadores, vendedores ambulantes ou artistas de rua como narradores ou protagonistas de histórias que esclarecem para os leitores o cotidiano de nossas cidades. Realize leituras e pesquisas utilizando obras de alguns desses mestres de nossa literatura e trace comparações com a idéia trabalhada em “Lisbela e o Prisioneiro” (baseado na obra de Osman Lins, peça teatral de grande sucesso).
2- Convide seus alunos para criar uma adaptação do filme para ser encenada na escola. Essa atividade pode ser feita com a obtenção do roteiro do filme ou com o texto original da peça teatral. Uma atividade como essa seria muito interessante, pois faria com que os alunos tivessem que ler os textos referentes à produção cinematográfica, selecionar cenas, preparar figurinos, montar cenários, roteirizar sua própria produção,...
3- Peça aos alunos que obtenham fotos, textos, relatos de moradores ou artigos de jornais relativos a histórias que fazem parte do folclore das pequenas cidades do interior. Casamentos, enterros, crimes, acidentes, personagens insólitas,... Conte as histórias de sua cidade, permita que os alunos vejam que o Brasil tem muitas histórias para contar e que há várias cidades como aquelas que são apresentadas no filme “Lisbela e o Prisioneiro”.
4- Façam levantamentos quanto aos crimes de aluguel. Procurem em jornais artigos relacionados a crimes praticados por matadores contratados para eliminar juízes, delegados, políticos, padres, líderes sindicais,... O Brasil se parece ou não com o filme de Guel Arraes? Há ou não há semelhanças entre o filme, essas notícias e o “Faroeste Caboclo” de Renato Russo? De que formas a violência pode ser combatida em nosso país? Monte um debate, envolva outros professores, abra a discussão para a participação da comunidade...
Ficha Técnica
Lisbela e o Prisioneiro
País/Ano de produção: Brasil, 2003
Duração/Gênero: 105 min., Comédia
Direção de Guel Arraes
Roteiro de Osman Lins, Guel Arraes e Pedro Cardoso
Elenco: Selton Mello, Débora Falabella, Marco Nanini, Virgínia Cavendish, Bruno Garcia,
André Mattos, Tadeu Mello, Heloísa Perissé, Paula Lavigne.
Links
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http://epipoca.uol.com.br/filmes_detalhes.php?idf=6426
- www.adorocinemabrasileiro.com.br/filmes/lisbela-e-o-prisioneiro/lisbela-e-o-prisioneiro.asp
1 aloisio rodrigues - rio de janeiro
meu caro amigo joao luis almeida machado sei que ja se passaram muito tempo, mas eu acabei lendo seu relatorio, sobre o filme lisbela e o prisioneiro e o que me deixa triste e saber que entre todos os comentarios que li a respeito do filme nada se fala sobre as pinturas de artes que fiz no filme lamentavel...
21/02/2009 15:13:09
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