Danilo
Prado, jornalista da Universidade Anhembi Morumbi, entrevista Leonardo
Campos Cerqueira. Leonardo é Formado em Letras, na
Universidade Federal da Bahia, é Pesquisador nesta mesma
instituição e atua na área de Cinema,
Cultura, Literatura e Mídia.
1- Você acredita que o cinema nacional passou a ser mais
valorizado após
o grande sucesso de Tropa de Elite , em 2007?
Sim. Tropa de Elite
é um marco no que tange à
estética e à performance do elenco. O grande
público, fã de produções
hollywoodianas de ação, valorizou o filme e este
ganhou mais visibilidade. Tropa de Elite é um sucesso de
crítica e de público, merecido, por sinal.
José Padilha acertou em cheio na fórmula e, assim
como outros diretores do nosso cinema, como Fernando Meirelles e Walter
Salles, já vislumbra o mercado internacional.
2-
Na sua opinião, os nossos roteiros estão se
destacando assim como os do cinema europeu?
O cinema brasileiro dos anos
90 tem ganhado muito destaque na
produção mundial, com muitos roteiros
interessantes, como Estômago, O Céu de Suely, Como
fazer um filme de amor, Era Uma Vez e outros. Não sei se
seria como o cinema europeu, mas estão de destacando sim,
isso é fato.
3-
As nossas produções chegaram poucas vezes a ser
indicadas ao Oscar. Como marco, temos O Pagador de Promessas (1964), O
Quartrilho (1995) e Central do Brasil (1998). Você acredita
que isso aconteceu por conta de pouco investimento entre as
décadas de 60 a 90?
Não. O Oscar
é uma
premiação da indústria estadunidense.
O foco são as produções deles. Os
filmes estrangeiros são um caso à parte. Vidas
Secas (não indicado, só comparado aqui), por
exemplo, foi um filme com pouco investimento, se comparado
às grandes produções do cinema
contemporâneo, mas digno de indicação
ao Oscar ou a qualquer outro prêmio. Não acredito
que o Oscar seja parâmetro de análise.
Aliás, prêmio nenhum. Claro que os filmes
indicados e ganhadores do prêmio têm lá
o seu valor estético, mas não estão
preocupados com o que se produz aqui. Essa é a minha leitura
do assunto.
4-O
filme Terra em Transe pode ser considerado uma grande
superação de Glauber Rocha na época da
ditadura?
Depende do ponto de vista.
Eis o meu: Terra em Transe é uma
das produções mais interessantes do nosso cinema
nacional. Pelo menos entre as que tive oportunidade de estudar mais
profundamente. Sugiro conferir o filme através do DVD
original lançado pela Versátil. Além
do filme, há um segundo disco que traça um
panorama da produção de Terra em Transe, desde a
busca por investimentos até a exibição
do filme em festivais. A Ditadura, como se sabe, foi um
período de muita dificuldade na
produção cultural no Brasil. Glauber consegue se
superar na estética, num misto de crítica social
e delírio visual, tamanho os significados das cenas do
filme, muito rico, mas também de difícil
compreensão. É preciso, sem sombra de
dúvida, um olhar bem atento para assisti-lo.
5-
O que é Cinema Novo? E qual filme se destacou desse
movimento?
Em suma, o Cinema Novo foi
uma fase revolucionária do cinema
nacional. Glauber Rocha e Nelson Pereira dos Santos são dois
representantes do movimento, que quebrava com uma série de
características do cinema em estúdio, valorizando
as cenas em espaços naturais, ao ar livre. Naquele momento,
no mundo, surgia uma série de Cinemas novos, como na
Alemanha, por exemplo. O Neorrealismo italiano e a Nouvelle vague
influenciaram o Cinema Novo no Brasil. Havia muito de
crítica social, mas com a pressão da Ditadura
militar, os filmes foram perdendo este foco, ampliando as suas
narrativas para outros contextos menos revolucionários, como
Garota de Ipanema e O Padre e a Moça (este, por sinal,
apesar de não fazer parte da fase rebelde do movimento,
trazia leves críticas sociais em seu enredo). Acho que Deus
e o Diabo na Terra do Sol é um destaque do Cinema novo.
6-
Atualmente, o cinema brasileiro tem investido muito no gênero
comédia, seguindo a linha hollywoodiana. Como exemplo, temos
os recentes A Mulher Invisível, Se eu Fosse Você 2
e Cilada.com. Você acredita que esse gênero
desvaloriza o nosso cinema?
Não. Apesar de
achar Cilada.com e A mulher
Invisível como alguns dos piores filmes que já
vi, não acredito que as comédias desvalorizem o
cinema nacional. A predileção pelo drama, em
detrimento da comédia é uma questão
antiga e profunda que não caberia explanar neste curto
espaço de conversa que temos. Tanto não prejudica
que os filmes que você citou são sucessos de
bilheteria e permitiram a produção de
continuações. Já no que tange
à crítica, os filmes surgem, sim, como
retrocessos: são produções
pífias que ainda pensam que o espectador é bobo o
suficiente para suportar tanta bobagem exibida entre uma hora e meia a
duas horas de projeção. Este Cilada.com
é um dos exemplos de como não se fazer filme.
Chega a ser constrangedor de tão ruim. Vergonha alheia e
desperdício de dinheiro. Há tantos roteiros
esperando investimentos para ganhar as telas dos cinemas e os
produtores nos forçam a ver bobagens deste quilate.
7-
Em sua opinião, quais os atores brasileiros que mais se
destacaram nos últimos anos?
Sem dúvida, Wagner
Moura e Lázaro Ramos. E acho
que o destaque seja merecido. São dois ótimos
profissionais, que começaram as carreiras no teatro e se
adequaram bem ao audiovisual (cinema e televisão). Conheci o
início da carreira de ambos na peça Cuida bem de
mim, em Salvador, nos idos de 1998. Hoje, os atores são
destaques no mercado de cinema brasileiro, mesmo que no
início das suas carreiras tenham topado participar de
produções questionáveis, como
Lázaro Ramos em Cinderela Baiana, cinebiografia trash da
então dançarina de axé Carla Perez.
8-
Dentre os diretores da nova geração, quais
você acha que têm grande potencial?
Acredito que Andrucha
Waddigton seja um dos melhores, com muito
potencial para comandar filmes de alto ou baixo orçamento.
Gêmeas (2000), adaptação do conto
trágico de Nelson Rodrigues já mostrava o
potencial do jovem diretor, que conseguiu sair da acunha de marido da
Fernanda Torres e se estabelecer como um cineasta lúcido e
que entende muito bem do que faz. Eu, Tu, Eles, Casa de areia e os
documentários sobre Maria Bethânia provam esta
minha afirmação. O seu filme mais
recente, Lope (2010), foi bastante criticado, mas o problema maior
estava no roteiro, não na eficiente
direção de Waddigton.
9-
Quais os melhores cursos de cinema no Brasil?
O curso de cinema na UFRB
(Universidade Federal do Recôncavo
Baiano) tem ganhado bastante notoriedade nos últimos tempos,
mas não posso responder a esta pergunta com mais afinco,
visto que atuo na área de linguagens, mídia,
estudos do Brasil na mídia contemporânea, tudo
isso no campo do curso de Letras, minha formação,
a minha base acadêmica.
10-
Em sua opinião, qual foi o melhor filme nacional de 2011?
Essa pergunta é
engraçada porque, na verdade, mal
encerramos o ano, mas, dentre os assistidos, destaco a qualidade
técnica de Bruna Surfistinha, de Marcus Baldini. Apesar de
não ser muito favorável ao alvoroço
midiático em torno da imagem da real Bruna Surfistinha
(há personalidades muito mais interessantes para ganhar uma
cinebiografia), acredito que o filme seja uma
produção bem- realizada e que consegue levantar
discussões diversas no que diz respeito ao
público de cinema no Brasil, abrindo espaço para
discussões no âmbito acadêmico
também, como a escrita de si e autobiografia.