Aprender com as Diferenças
 

Posturas e Deficiência - 11/02/2011
Sonia B. Hoffmann

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Evidências demonstram o hábito recorrente de buscarmos definições e padronizações a partir das quais classificamos ou rotulamos os comportamentos, posturas e atitudes do ser humano. 

Posteriormente, sentenciamos suas formas de expressão em adjetivações como bom-mau, certo-errado, quase sempre na perspectiva da análise do efeito e não da origem da adoção do seu modo de ser, estar ou agir.

O comportamento e o controle motor, significantes de uma linguagem corporal manifesta na postura, oportunizam a informação e a leitura da presença ou não de dificuldades, compensações e ajustamentos pessoais à manutenção biomecânica do equilíbrio suficiente para a realização da atividade com o mínimo de esforço possível em uma determinada situação e condição motora. 

Logo, percebe-se que a postura envolve todo um jogo de equilibrações e desequilibrações dos diversos segmentos musculoesqueléticos e osteoarticulares, com a melhor distribuição do esforço e o favorecimento da mínima sobrecarga ou estresse destes segmentos durante a realização com eficácia de tarefas cotidianas.

Eficácia, no entanto, nem sempre implica ou possibilita harmonia e plasticidade do movimento, mas ajuste e adequação corporal necessárias ao alcance do objetivo do gesto motor e da manutenção da postura mesmo quando em posição estática. 

Este modo de percepção de postura não representa, obviamente, um convite para o abandono injustificado das concepções até hoje trazidas por diversos autores e pesquisadores deste tema, mas um indicativo da urgência em revisitarmos e analisarmos a rigidez de algumas definições estabelecidas e fixadas por tantos profissionais no que diz respeito à avaliação e ao processo postural.

O dia a dia mostra a presença e a circulação de inúmeras pessoas que, por este ou aquele motivo, não apresentam condições de envergarem uma postura academicamente definida. 

Muitas apresentam deformidades e alterações musculares, ligamentares e ósseas irreversíveis geradoras de grande ou total impossibilidade para a adoção e manutenção da verticalidade ou correção corporal enquanto realiza sua atividade. 

A exigência de uma postura conceitual, em muitos destes casos, pode significar a perda da funcionalidade da ação e a desmotivação para o convívio social por uma pessoa nesta condição; depois, simplesmente não existe mais espaço para perpetuarmos o mito do leito de Procusto.

Leo Buscáglia, em seu livro Os deficientes e seus pais, nos apresenta um exemplo bastante ilustrativo do quanto a inflexibilidade no entendimento do comportamento e da postura de uma pessoa pode causar consequências constrangedoras:

"Nunca esqueceremos o dia em que levamos nosso filho, Tom a um restaurante local para comemorar seu aniversário", conta uma família. "Ele fazia dez anos e todos estávamos vestidos com nossas melhores roupas e prontos para uma verdadeira comemoração!

Para usar um eufemismo, a paralisia de Tom não faz com que uma refeição seja o acontecimento mais organizado, mas aprendemos a conviver com esse fato, e ele parece já não ter mais importância. O que importa é que ele pode comer sozinho e isso é uma grande coisa.

Exceto por sujar a boca e o queixo com a comida e por um babar pouco, ele se sai muito bem. Bem, nesse dia ele estava se comportando particularmente bem, e estávamos nos divertindo muito. Então, a certa altura, quando saboreávamos o prato principal, as pessoas na mesa próxima à nossa se levantaram e marcharam para a saída do restaurante. 

Ao passar pela mesa onde estávamos, a mulher olhou diretamente em nossa direção e cuspiu: REPUGNANTE! Ouvimos enquanto ela saia resmungando: "Como se espera que pessoas decentes comam vendo isso?" "Quando por fim veio o bolo, as velas não pareciam tão brilhantes e Tom não se deu ao trabalho de apagá-las. Esse foi o seu décimo aniversário!" (p.116-117).

Contudo, se por um aspecto existe esta referida rigidez conceitual de postura por muitos profissionais atuantes na área do movimento, notamos a persistência de um posicionamento condescendente e generalizante quanto a adoção de atitudes posturais e motoras, chegando-se as raias da estereotipização principalmente de um grupo de pessoas que apresentam o mesmo tipo de deficiência. 

Um exemplo clássico é encontrado na referência e descrição da postura de pessoas cegas feita por alguns autores. Segundo sua opinião, tipicamente, elas apresentam flexão de cervical, tronco e joelhos; retrações da musculatura posterior das coxas; ptose ou queda da musculatura abdominal e flacidez dos músculos paravertebrais; marcha de pouca amplitude e passo não fisiológico.

Ora, esta é a descrição postural de alguém sedentário e não necessariamente de uma pessoa cega, que sabemos ser hoje cada vez mais participante das diversas modalidades de manifestações esportivas, educacionais, laborativas e dos movimentos e ritmos sociais. 

Se algumas alterações em sua postura possam ter continuidade mesmo após sua educação ou reeducação postural, como a inclinação anterior ou lateral da cabeça, por exemplo, devemos então pensar que este seja talvez o ajuste encontrado para captar e decodificar com mais nitidez, funcionalidade e exatidão sons e falas diante da impossibilidade de uma leitura labial ou fisionômica ou na presença de um ambiente sonoramente poluído.

Com estas reflexões, percebemos a extrema necessidade de uma análise mais profunda do significado de boa ou má postura, pois como vimos tanto o alinhamento quanto o desalinhamento dos diferentes segmentos corporais podem causar dores, entraves e perda da funcionalidade do gesto e da expressão postural em algumas situações nas quais devamos então nos referir a posturas mais, pouco ou menos adequadas.

Sonia B. Hoffmann é Fisioterapeuta - CREFITO 6159 F, Doutora em Ciências do Desporto e Educação Física. Disponível em http://www.diversidadeemcena.net

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