Educação e Tecnologia
 

Só por hoje ficarei longe desse computador - 01/09/2009
Uma crônica sobre internet, tempo e espaço

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O corpo existe para segurar a espinha que segura a cabeça, que sustenta os olhos e o córtex cerebral e libera os braços que são para digitar e clicar. A internet não acompanha o expediente comercial nem fecha para almoço. Todos os dias são úteis. E isso mudou minha vida. Meus horários perderam os ponteiros. Não tenho hora para comer e, à semelhança de um bebê recém-nascido, não sei mais o que é dia e o que é noite. Às 4h da madrugada estou tão pilhada como se fosse às 4h da tarde. Pronta para mamar informações e evacuar ideias.

Meu corpo existe para segurar a espinha que segura a cabeça que sustenta os olhos e o córtex cerebral. E libera os braços que são para digitar e clicar.

Meus olhos estão além do alcance. Nem a alta miopia impede que eles estejam ora aqui, ora na China.

Vão me dizer que não é a mesma coisa que estar na China com os pés fincados lá. Mas o meu cérebro não sabe disso. Talvez porque nunca tenha ido à China. Talvez porque ele já não sabe distinguir os mundos de cá e de lá.

Eu, pelo menos, fico confusa. Na maior parte das vezes, sinto-me tão presente num quanto no outro. Na verdade não sei mais qual é a borderline. Quase sinto o cheiro, a temperatura e o sabor que vêm da tela.

Estar no lá era o sonho do personagem Cosme, da Vila Sésamo. Ele dizia: “Eu quero estar no lá”. E estava sempre no aqui. Mas isso foi antes da internet. Porque hoje estamos no lá e no aqui, simultaneamente. Cosme deve estar feliz agora.

A Física mudou.

Não tenho tanta necessidade de sair de casa como antes. Uma caminhadinha básica diária que é para o sangue circular. Porém, quando tenho alguma reunião na rua, dá aquela desanimada. Para que rua se há Skype? Com áudio, webcam e modo conferência? Com a vantagem de poder, a exemplo dos apresentadores de telejornais, me arrumar apenas da cintura para cima.

Minhas relações mudaram.

Converso com amigos que estão em outros países, durante horas, com a banalidade de um clique. Fico íntima de alguém que só vi uma vez, pessoalmente, quando muito. Conheço pessoas que jamais conheceria na minha rotina mundana. Falo com gente que não falaria. Mas e daí? É só desligá-las.

E o amor? Onde fica? Não sei. Não sei nem o que é o amor. Porque a referência do amor se perdeu na leveza e facilidades das relações. Mas não culpo a internet. Talvez porque eu a ame. E num relacionamento passional a gente nunca enxerga os defeitos do outro.

Nos finais de semana, eu tento sair de casa, mas a internet não deixa. Minha filha me puxa pelos braços. E como um membro dos Alcoólatras Anônimos eu digo: “Só por hoje ficarei longe desse computador”.

Mas se é para ir ao cinema, já vou eu para a internet ver a programação. E, em segundos, estou chamando minha filha para ver uma animação espetacular, hospedada no site de programações culturais. Uma animação leva a outra que leva a outra e… quando vemos, o filme na tela grande se foi…

A internet definitivamente mudou a concepção de tempo e espaço. Como um buraco negro, ela suga o que estiver ao seu redor para levar à outra dimensão.

Meu corpo reclama. A natureza não o fez para ficar parado tantas horas. Há muito o que evoluir. Ainda somos primitivos diante Dela. [Webinsider]

Cristiana Soares é publicitária e escreve no Blog Talk.

Fonte: Websinder (http://webinsider.uol.com.br/index.php/2007/11/26/so-por-hoje-ficarei-longe-desse-computador/)

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3 COMENTÁRIOS

1 Renata Gonçalves Silva - Bertioga/SP
Hoje em dia a interner é um dos mais poderosos instrumentos de comunicação e com isso sabemos das enormes consequências que ela nos oferece. Esta crônica é bem pertinente para nossa avaliação quanto o nosso uso desse meio de comunicação tão surpreendente e de fato, se deixarmos levar pela fascinante viagem ao mundo virtual passamos a ter mais contato com a máquina do que com o calor humano. Em suma, é um ótimo momento de leitura e reflexão para sabermos usufluir, com cautela, de uma série de opções impressionantes que a internet nos proporciona.
21/06/2010 20:28:43


2 Fatima Lucia Braga - Rio de Janeiro
Muito boa essa crõnica.Fezme analisar e avaliar minha vida após a entrada de um computador e da net na minha vida.Estou esquecendo de viver essa é a verdade
28/11/2009 18:06:40


3 Ana Paula dos Santos Trindade - Nova Iguaçu RJ
Nossa! Extremamente boa essa crônica!!! A autora ilustra muitíssimo bem a nossa atual situação perante a internet neste momento de nossa vida! Parabéns!
21/10/2009 18:11:45


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