A Semana - Opiniões
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Os nós que estrangulam a Educação Brasileira - 10/08/2009
Paralelos entre São Paulo e Nova York

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Artigo publicado pela revista Veja São Paulo (edição de 12 de Agosto de 2009) apresenta apreciação feita por especialistas acerca de medidas tomadas em Nova York que melhoraram de forma realmente espetacular os resultados dos alunos daquela rede estadual de ensino nos Estados Unidos.

Pensei em utilizar a expressão “melhoraram de forma considerável” para expressar a evolução da educação nova-iorquina, mas considerando-se que desde 2002, quando perto de 40% dos alunos daquela rede de ensino atingiam níveis considerados satisfatórios ou avançados até os resultados atuais, de 2009, quando 82% dos estudantes obtêm estes resultados em matemática e 69% em inglês, não há como deixar de exaltar tal crescimento.

Apenas a título de comparação, vale lembrar que a projeção do MEC para que no Brasil cheguemos a ter avaliações nacionais com média 6 (seis), tornando-nos equivalentes a média atual de países europeus, vislumbra apenas a ainda distante década de 2020...

De qualquer forma, esta apreciação dos especialistas, entre os quais o atual secretário de educação de São Paulo e ex-ministro da educação do governo Fernando Henrique, Paulo Renato Souza, ocorreu a partir de visita de Chris Cerf, subsecretário de educação de Nova York, a capital paulista.

Cerf veio a convite do Instituto Fernand Braudel e da Fundação Itaú Social e destacou, entre outras ideias, aquela que considero, pessoalmente, a mais importante, que em Nova York decidiu-se “colocar as crianças em primeiro lugar”. Ideia aparentemente simples, mas que, em se considerando as atuais condições da educação brasileira, demonstram que tal princípio não é prerrogativa básica por aqui...

E, ainda em se levando em conta tal base de ação (“as crianças em primeiro lugar”), tendo em vista os resultados obtidos, que falam por si próprios e permitem aos estudiosos, analistas, executores de políticas públicas, gestores de redes e escolas, empresários do segmento e comunidade em geral realmente considerarem as ações e ideias de Nova York, é possível perceber que não se trata apenas de discurso político...

Mas, voltando às propostas e realizações de Nova York, veremos que a partir delas tomamos consciência de que os nós que estrangulam a educação brasileira são bastante parecidos. Mais importante ainda, podemos ver alguma luz no fim do túnel também para nossas crianças e escolas a partir de soluções que não se mostraram tão complexas e tampouco caras demais que não possam ser implementadas por aqui...

O que salta aos olhos de todos é que, o mais importante para realizar tais ações é a necessidade de vontade política para empreender tal “metamorfose”, utilizando termo que, segundo Edgar Morin, supera atualmente o conceito de “revolucionar”, desgastado demais por mau uso, para caracterizar as reformas essenciais para que efetivemos a tão sonhada educação de qualidade.

No estado de Nova York foram definidos como principais pontos de real estrangulamento da educação as seguintes situações:

1- Cada unidade escolar, apesar de suas particulares necessidades, próprias de seu contexto e público, era tratada com os mesmos “remédios” e soluções pelas autoridades.
2- Não existia um diagnóstico prévio da situação da educação e de cada escola, especificamente, quanto a recursos, resultados, trabalho...
3- Os educadores não demonstravam preparo para trabalhar por metas.
4- A estabilidade na carreira de diretores gerava acomodação e pouca ou nenhuma inovação destes na gestão das escolas.
5- Poucos eram os pais que acompanhavam de perto a vida escolar de seus filhos.
6- A violência provocada por estudantes, tanto dentro quanto fora das escolas, estava aumentando.
7- A sociedade mostrava-se pouco interessada e envolvida no debate acerca da educação.
Envolver a sociedade e, principalmente, fazer com que os pais participassem mais da educação de seus filhos ocorreu, em Nova York, a partir da efetivação de funcionários em cada escola que realizassem a ponte entre os pais e os educadores, tornando-a cada vez mais frequente. Outra medida importante foi o estabelecimento de parcerias com ONGs e instituições privadas que permitiram que as escolas se aproximassem mais da realidade social, do mercado de trabalho e dessem aos estudantes, maior compreensão dos motivos e da importância do ato de estudar.

A partir deste trabalho e, ensejando desde então considerável melhoria no processo de ensino-aprendizagem (arejado com o contato com outras instituições e promovido a partir das cobranças da sociedade que levaram a revisão de métodos e recursos), a violência arrefeceu. Foi igualmente decisivo compreender que tais ações violentas não constituem caso de polícia e, sim, de educação de melhor qualidade. Aulas melhores, mais sintonizadas com a realidade, propositivas e desafiadoras para os professores e alunos criam maior vínculo, despertam mais vocações e, certamente, geram melhores resultados práticos associados a uma maior compreensão quanto à ética e cidadania...

Respeitar a diversidade de contextos e realidades nas quais se encontram inseridas as escolas foi desafio um pouco maior, tendo-se em vista que a tendência a uniformizar tudo é grande dentro do modelo socioeconômico em que vivemos. Esta uniformização também deve ser combatida no espaço mais direto de ensino-aprendizagem, a sala de aula. Compreender e efetivar tais mudanças torna o trabalho educacional mais difícil, sem dúvida alguma, mas certamente constituem necessária mudança para que as escolas e os estudantes se sintam realmente mais acolhidos e respeitados em seus processos formativos...

O mais complicado de tudo, no entanto, é modificar a mentalidade vigente, a cultura que impera entre aqueles que fazem o trabalho educacional mais direto, ou seja, os professores e gestores das escolas. Superar tais questões passa por brigas trabalhistas feias e prolongadas, em especial, aquelas relacionadas às questões de estabilidade de carreira, salários, premiações e punições.

A criação de sistemas de avaliação dos resultados e do rendimento de alunos e escolas (no Brasil através do Enem, da Prova Brasil, do Saresp) e o estabelecimento de metas para a educação (como é o caso do Ideb e do Idesp) constituem-se como importante e decisivo trabalho para que isto aconteça. Neste sentido, o diagnóstico das redes e escolas quanto as suas características, particularidades, problemas, bons resultados, práticas e metodologias constituem realmente aquilo que torna possível cobrar mudanças e promover ações corretivas...

Michel Foucault teve como título de uma de suas principais obras, “Vigiar e Punir”, o que talvez seja a visão de muitas pessoas ligadas à educação quanto ao estabelecimento destes elementos de avaliação e o estabelecimento de metas... Não se trata, entretanto, apenas de “Vigiar e Punir”, mas sim de “reconhecer, propor, monitorar, corrigir, implementar, premiar e também punir”...

Troquemos o “vigiar” por termos como reconhecer (ou identificar), propor (ou pensar coletivamente e chegar a conclusões e medidas a serem aplicadas), monitorar (acompanhar de perto, dando os sentidos de auxílio, socorro, ajuda) e corrigir/implementar (superando o discurso e aplicando as soluções pensadas coletivamente).

Adicionemos ao “punir” a ideia do “premiar”... E por que não apenas premiar, como já estão fazendo algumas redes de ensino públicas (como as escolas estaduais paulistas)? “Punir” parece tão medieval, não é? Em instituições privadas a não obtenção dos resultados previstos em planejamento pode ocasionar até mesmo a demissão...

A não consecução das metas gera perdas que vão além do indivíduo e, por conta disso, é necessária maior responsabilidade individual quanto ao trabalho. Diminuir as faltas de professores, acabar com os atrasos, realizar aulas mais interessantes e motivadoras, renovar o discurso e as metodologias, utilizar novos recursos e algumas outras práticas são essenciais para a carreira dos educadores...

Não apenas para melhorar a educação, os resultados de seus alunos, a performance de sua escola, mas até mesmo para que sua autoestima suba e que, como contrapartida, ele deixe de ser responsabilizado pelo fracasso escolas e se perceba artífice do sucesso... Ao invés de se preocupar com as punições, ele passaria a contabilizar os benefícios previstos na meritocracia, como os bônus e aumentos salariais...

De qualquer forma, estados ricos e importantes em seus países, São Paulo e Nova York também se mostram próximos quanto a questões sérias relacionadas à qualidade de seus sistemas educacionais. Os americanos já estão à frente, de novo... Cabe aos paulistas e, também a todos os demais brasileiros, desatar os nós que estrangulam a educação nacional o quanto antes para que possamos ocupar lugar de maior destaque e prosperidade no cenário internacional...

Obs.: Tenho abordado com frequência o tema “educação de qualidade” e, os 7 (sete) temas destacados quanto aos problemas de Nova York (aparentados das questões brasileiras) a partir da fala de Chris Cerf, já foram trabalhados em vários textos da coluna “Editorial da Semana” e também em nosso novo portal, o Escola de Alto Desempenho, em que destacamos materiais provenientes de vários autores. Fica o convite para que esta reflexão seja expandida com o apoio dos textos correlacionados ali existentes e que vêm sendo publicados desde 2003.

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1 COMENTÁRIOS

1 Lucas Augusto Monteiro de Castro - PirangaMG
Pensei que o site fosse mais democrático e publicasse pontos de vista contrários ao status do editorial. Pude perceber que este espaço não é o ideal para o debate nacional que a educação tanto necessita ... Como nos ensina Paulo Freire, estamos todos aprendendo uns com os outros ... Viva Paulo Renato !!
17/09/2009 20:10:19


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