Educação de Qualidade começa bem cedo - 15/06/2009
Prêmio Nobel de Economia destaca ações de educação de qualidade
“Uma criança de 8 anos que recebeu estímulos cognitivos aos 3 conta com um vocabulário de cerca de 12 000 palavras – o triplo do de um aluno sem a mesma base precoce. E a tendência é que essa diferença se agrave. Faz sentido. Como esperar que alguém que domine tão poucas palavras consiga aprender as estruturas mais complexas de uma língua, necessárias para o aprendizado de qualquer disciplina? Por isso as lacunas da primeira infância atrapalham tanto.” (James Heckman, Economista da Universidade de Chicago, ganhador do Prêmio Nobel, em entrevista a Revista Veja, Edição 2116, 10 de junho de 2009)
Se alguém tem dúvidas ou questionamentos quanto à importância da educação nos primeiros anos de vida, nada melhor que dados e números para comprovar este fato. Partindo desta premissa, ou seja, a de que dados e estatísticas comprovam ações e práticas em educação e programas sociais, o economista James Heckman, defende não só a importância da Educação Infantil e dos primeiros anos do Ensino Fundamental, mas também o valor da participação, incentivo e proximidade da família no processo de formação das crianças.
A afirmação de Heckman que dá início a este artigo, por exemplo, ao transportar para o mundo dos números a diferença que os estímulos dados a uma criança de 3 anos fazem quanto à riqueza de seu vocabulário aos 8 anos, é apenas um dos indicadores que evidenciam e atestam seu pensamento.
A diferença existente entre uma criança estimulada, e neste caso é preciso considerar como bases de estímulo tanto à escola quanto à família, equivale a possuir um acervo de palavras que é, no mínimo, três vezes maior do que aquelas que não tiveram igual incentivo em seus lares e escolas. E este vácuo criado entre crianças que tiveram diferentes origens em seus processos de ensino-aprendizagem dificilmente será tirado mais tarde ou, se isto ocorrer, acontecerá a um custo que pode 60% mais caro para a sociedade, conforme dados do próprio economista.
“A educação é crucial para o avanço de um país – e, quanto antes chegar às pessoas, maior será o seu efeito e mais barato ela custará. Basta dizer que para sedimentar num adolescente o tipo de conhecimento que deveria ter sido apresentado a ele dez anos antes sai 60% mais caro. Pior ainda: nem sempre o aprendizado tardio é tão eficiente.” (James Heckman, Economista da Universidade de Chicago, ganhador do Prêmio Nobel, em entrevista a Revista Veja, Edição 2116, 10 de junho de 2009).
O preparo qualificado nas escolas, apoiado pela família, permite que a criança cresça mais rica quanto as suas bases culturais ao mesmo tempo em que lhe garante melhor saúde (emocional e física) e, certamente, repercute em suas condicionantes sociais, melhorando sua capacidade de se relacionar com as outras pessoas a seu redor. Desenvolve-se, conforme observa Heckman, não apenas as capacidades cognitivas, aquelas relacionadas ao QI (o Quociente de Inteligência), mas também as sociais e emocionais.
Sabe-se hoje que, do mesmo modo que é importante conhecer a caixa de ferramentas e utilizá-la do modo mais eficiente e hábil possível, cabe também a todos desenvolver-se quanto às habilidades relacionais, de interação social. São elas que garantem as pessoas o acesso ao trabalho, a expansão de possibilidades profissionais e sociais, o bom relacionamento em todos os ambientes que as pessoas freqüentam, a capacidade de motivar-se para desafios, o controle pessoal em situações diversas...
E é também por isso, que o papel das famílias é enfatizado por Heckman. A escola complementa o trabalho de lapidação e polimento da pedra preciosa que é uma criança ao lhe dar subsídios sociais e culturais que a inserem na sociedade em pé de igualdade com os demais seres humanos. Cabe a família, no entanto, o crucial papel de fazer com que seus filhos tenham bases de ação, pensamento e moral que lhes permita entrar na escola, literalmente, pela porta da frente. Isto significa que, se não há um trabalho de incentivo e educação anterior e paralelo ao trabalho escolar realizado pelas redes de ensino regulares por parte da família, o prejuízo para as crianças, as famílias e a sociedade como um todo é grandioso.
Reduzir este raciocínio a números pode parecer mesquinho demais, mas foi a forma encontrada para demonstrar a todos o quanto custa a um país ter uma educação desqualificada em suas bases. Em termos do mundo real, poderíamos dizer que isto significa violência, famílias desestruturadas, consumo crescente de drogas, propagação de doenças que poderiam ser evitadas, aumento dos índices de pobreza...
“As escolas têm um papel fundamental, especialmente quanto ao desenvolvimento das habilidades cognitivas. Mas enfatizo ainda a relevância dos programas sociais que tenham foco nas famílias, de modo que elas consigam fornecer os incentivos certos num momento-chave. Iniciativas mínimas têm altíssimo impacto, como o hábito de conversar com os filhos ou emprestar-lhes um livro. Só que alguns pais precisam ser orientados a fazer isso, daí a necessidade de programas específicos.” (James Heckman, Economista da Universidade de Chicago, ganhador do Prêmio Nobel, em entrevista a Revista Veja, Edição 2116, 10 de junho de 2009)
No que tange a importância da família, Heckman coloca em pauta a necessidade de a escola orientar os pais e demais familiares que tem contato com as crianças em idade escolar, quanto a ações e práticas que deveriam ser regularmente adotadas em seus lares para incentivar os estudos e o enriquecimento social e cultural destes infantes.
“Os estudos confirmam que um programa americano da década de 60, o Perry, amplamente copiado por outros países, tem ótimo retorno. Ele consiste, basicamente, em colocar crianças pobres na escola, em salas com poucos alunos, e envolver os pais no processo educativo. O professor visita as famílias para informar o que está sendo ensinado na aula, de modo que passem a participar mais ativamente. Sem esse amparo dos pais, dificilmente uma criança vai ter motivação para aprender, o que tende a se perpetuar no curso da vida escolar e resultar em adultos sem sucesso.” (James Heckman, Economista da Universidade de Chicago, ganhador do Prêmio Nobel, em entrevista a Revista Veja, Edição 2116, 10 de junho de 2009)
Ações como o Perry, mencionado por Heckman, adotado nos Estados Unidos a partir da década de 1960 e copiado por outros países, permitem não apenas o incentivo aos estudos, mas possibilitam que as famílias se tornem mais unidas, coesas e participativas. Os pais não apenas orientam e participam mais da vida de seus filhos, no âmbito doméstico e também no educacional (além de acompanhar mais proximamente outras esferas da vida de sua prole), mas passam a ouvir e aprender de seus filhos um pouco mais daquilo que é o mundo em que vivemos hoje.
1 Adelaide Moraes - Cuiabá
Excelente o artigo. Pena que grande parte dos pais e professores ainda não tem consciência da importância desse processo na vida dos educandos. E ainda, acredito que colocar tudo isso em prática não depende necessariamente de recursos financeiros e sim de iniciativa, compromisso e responsabilidade tanto de gestores e professores quanto dos próprios pais.
16/06/2009 07:50:10
2 PAULO CELSO - Ubatuba
Parabéns pelo texto. Acredito que o financiamento educacional nos anos iniciais deve ser repensado.Planos articulados entre educação, saúde, assitência social e outros setores poderiam reverter o histórico de desrespeito a essa fase tão importante para a formação do ser humano.
15/06/2009 21:33:56
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