A Crise Mundial - 17/11/2008
Não aprendemos as lições de 1929...
Em 1929 vivemos a maior crise do capitalismo mundial, surgida após um ciclo de prosperidade nunca antes vivenciado na história dos Estados Unidos. Foi a crise da superprodução, movida pela especulação financeira na bolsa de valores de Nova Iorque que acabou ocasionando, em outubro daquele ano, a quebra do mercado de ações e inúmeras falências.
Quase 80 anos depois, o mundo não aprendeu as lições da história e, depois de anos sucessivos de “vacas gordas”, com o mercado financeiro sendo insuflado pela especulação no mercado imobiliário dos Estados Unidos, estamos vivendo uma nova, grave e incontornável crise – conforme já previam alguns dos maiores economistas do planeta, como Paul Krugman [que recentemente foi laureado com o Nobel de Economia justamente por seus brilhantes estudos e pesquisas que indicavam esse caminho sem volta para a economia mundial].
As demissões na Europa, conforme atestam os jornais de todos os países, já chegam a 10 mil por dia. O Japão também já jogou a toalha e anunciou estar em recessão com o encolhimento de seu PIB [Produto Interno Bruto] por dois trimestres consecutivos. Bancos norte-americanos que durante os últimos anos promoveram uma irresponsável jogatina no mercado imobiliário decretaram falência.
Empresas gigantescas e tradicionalíssimas de setores considerados vitais para a economia mundial, como as montadoras de veículos dos Estados Unidos [GM, Chrysler e Ford], passam por forte crise e, apesar de já terem contado com aporte de dinheiro governamental norte-americano [25 bilhões de dólares foram liberados por George Bush e pelo Congresso em setembro deste ano] correm o risco de iminente falência. As ações da GM e da Ford, por exemplo, despencaram em um ano de um patamar médio na faixa dos 30 a 35 dólares para dois dólares no presente mês de novembro. Calcula-se que hoje, a GM tenha valor de mercado equivalente a 2 bilhões de dólares e que, em contrapartida, os seus custos mensais [apenas nos Estados Unidos], girem na faixa dos 11 bilhões de dólares.
No Brasil, apesar dos iniciais depoimentos otimistas do presidente Lula, a crise também já chegou. Na indústria automotiva os trabalhadores já estão em férias coletivas e se discutem desde já a possibilidade de demissões. As vendas de veículos [novos e usados] caiu, em média, de 20 a 40%. A aquisição de imóveis no país está estagnada após vários meses de forte crescimento. Ninguém está se sentindo seguro para arriscar qualquer tipo de investimento ou aquisição que represente dívidas de médio ou longo prazo. As instituições bancárias nacionais e as financeiras aumentaram os juros e criaram elementos aos contratos de financiamento que tornaram mais difíceis as linhas de crédito.
A luz no fim do túnel existe e não está nos Estados Unidos, na Europa ou no Japão segundo os economistas. Estas economias estão estagnadas e sem previsão de crescimento considerável o suficiente para reverter o refluxo econômico provocado pela crise. A esperança reside nos países em desenvolvimento, em especial nos emergentes Brasil, Rússia, Índia e China [reconhecidos internacionalmente pela sigla BRICs entre os analistas financeiros e economistas].
E o que motiva os analistas a esta conclusão? Basicamente trabalham estes estudiosos com as possibilidades reais de expansão do consumo verificadas nestes países – situação esta que não existe no grupo das nações mais ricas do planeta [EUA, Japão, Alemanha, Inglaterra, Espanha...]. Só a título de demonstração, enquanto nos Estados Unidos e na Alemanha há - segundo dados oficiais - entre 480 e 500 veículos por cada grupo de mil habitantes, no Brasil e na Índia este número é de 90 e 10 unidades por cada mil unidades [respectivamente].
Simplificando poderíamos dizer que, a partir do exemplo da indústria automotiva, há um enorme potencial de consumo inexplorado nos países emergentes e, tendo em vista o crescimento econômico controlado e as políticas sociais em aplicação nos referidos países, este contingente da população anteriormente alijado do mercado consumidor está sendo integrado ano a ano em quantidades expressivas.
Mais interessante ainda é perceber que para os emergentes também se tornou favorável a adoção de políticas de austeridade fiscal que lhes permitiram diminuir os gastos públicos, aumentar a arrecadação de impostos, terceirizar serviços e desta forma transferir para a iniciativa privada a responsabilidade por compromissos e custos que antes eram dos governos, criar saldos favoráveis nas respectivas balanças de comércio e, com tudo isso acontecendo, fortalecer seus caixas internos, criando reservas que lhes garantem momentaneamente, ainda que não de forma definitiva pois estão todos os países atados pelos laços do mercado globalizado, alguma estabilidade operacional neste tormentoso momento de crise mundial.
A eleição de Barack Obama para a presidência dos Estados Unidos representa aos olhos de habitantes de várias nações, uma oportunidade histórica de reverter injustiças como a intolerância e os preconceitos, mas também em virtude da presente e grave crise econômica global cujo estopim foi a crise imobiliária e especulativa surgida na pátria do Tio Sam, criou a perspectiva e a ilusão de que os dilemas e dramas ocasionados com o estouro da bolha do mercado bancário e financeiro possam ser solucionados pelo novo governante norte-americano. É um desafio digno de Ulisses e, certamente, Obama terá que se mostrar capaz de enfrentar o cenário nebuloso que se encontra em seu horizonte [e no de todos nós...].
Não existe, porém, fórmula mágica para a crise e suas conseqüências – das mais imediatas as de longo prazo – já podem ser sentidas e vislumbradas. O auxílio econômico prestado pelos governos aos bancos, indústrias e demais setores da economia deve vir acompanhado de parcimônia, rigor e responsabilidade no trato com o dinheiro injetado nas economias, compromisso com a coletividade e muita austeridade. As pessoas têm que se conscientizar que acabou a era do vale-tudo, com o dinheiro de plástico permitindo um sem fim de aquisições e com todos assumindo uma nova atitude diante do mercado, ou seja, consumir sim... porém sem excessos, adquirindo produtos e serviços dentro das reais necessidades que possuímos ao longo de nossas vidas e, o que se aplica ao cidadão comum deve ser objeto de ainda maior rigor e austeridade entre as empresas, governos, instituições...
Creio, pessoalmente, que este choque provocado pela crise será superado, mas diferentemente de 1929, o que se espera é que os remédios amargos não deixem um gosto ruim na boca que seja apenas passageiro e facilmente esquecível... As lições da história existem para que não cometamos os mesmos erros e pecados que, em outras situações e contextos, podem se tornar mortais para inúmeras pessoas, instituições, países...
1 Lucas Augusto Monteiro de Castro - Piranga MG
Existe uma pequena diferença no combate à recessão entre os países desenvolvidos e países como o Brasil. Nos EUA, por exemplo, um processo de estagnação econômica é combatido com remédios como: aumento dos créditos, redução das taxas de juros, redução dos impostos, incremento ao consumo de bens e serviços seguido do aumento dos meios de pagamento. No Brasil, se observarmos com atenção, temos um histórico de recessão e estagnação associados por algumas décadas. No nosso caso, o remédio foi: redução no crédito, aumento dos impostos, aumento nas taxas de juros, achatamento salarial e redução nos meios de pagamento. São políticas opostas. Um olhar mais audacioso verá que exite um fluxo mundial de capital migrando para os Estados Unidos e para os demais países ricos. Este fluxo é representado pelas rendas líquidas que as economias periféricas exportam na forma de lucros das multinacionais, na forma de juros das dívidas externas, na forma de royalties sobre uso de tecnologias, etc. Assim sendo, estes países podem gerar déficits públicos para financiar suas crises, pois o terceiro mundo é o avalista principal. Não há necessidade de aumentar suas emissões monetárias, gerando menos inflação. No caso brasileiro, o mesmo não pode ser feito, pois nossa moeda, apesar de mais estável, ainda passa por processo de solidificação e o país não conta com aporte internacional de recursos como os Estados Unidos. Se o Brasil aumentar o crédito para combater a crise, será obrigado a emitir moeda, inflacionando a economia. Por este motivo, os últimos governos brasileiros adotam políticas públicas de orçamento equilibrado, controlando e diminuindo os gastos públicos, reduzindo investimentos e diminuindo o consumo. A consequência é uma só: redução da demanda agregada com recessão. Esta é a política ortodoxa monetarista da escola de Chigaco. E o que isto tem com a educação? No meu entender, tem tudo. É preciso que o governo seja criterioso nos seus cortes orçamentários. Cortar recursos para investimento em educação em nome do equilíbrio fiscal é, antes de tudo, tirar do país a possibilidade do ingresso no mundo desenvolvido. O projeto político pedagógico de qualquer sistema de ensino não funciona só. Ele está associado com variáveis macroeconômicas e institucionais. Vamos parar de achar que os problemas das escolas são de ordem exclusivamente pedagógicos. Nós educadores não podemos, portanto, ficar de braços cruzados. Vamos lá pessoal!! Vamos mostrar nossa força, nosso talento e nosso valor !!
16/12/2008 17:57:35
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