Uma carta-depoimento - 25/06/2008
Um depoimento emocionante
Um depoimento emocionante enviado para nossa grande amiga e colaboradora Marta Gil, que resolvemos compartilhar com nossos leitores.
Boa leitura!
Piumhi, Minas Gerais, 22 de junho de 2008.
Querida Marta Gil:
A Prefeitura de Piumhi, através do CAAP - Centro de Atendimento e Apoio Pedagógico, está promovendo um curso sobre Educação Inclusiva, para professores da rede municipal de ensino.
Também estão participando educadores de escolas particulares e da rede estadual de ensino desta cidade.
Na semana passada, atendendo ao convite das organizadoras deste curso, dei uma palestra em um dos módulos sobre “Educação Inclusiva e a Legislação Brasileira”, ocasião em que utilizei o excelente material que você me encaminhou sobre o assunto.
Vou lhe relatar como foi este encontro.
Eu não fico à vontade para falar em público, mas tentei superar a timidez para abordar este tema importantíssimo, principalmente para educadores de Piumhi, cidade onde nasci e resido até hoje.
No evento, reencontrei duas professoras da minha escola, o que, para mim, foi uma satisfação enorme!
Além das discussões acerca da legislação, tive a oportunidade de explicar como foi a minha experiência na escola comum como aluna com deficiência física e apresentei o projeto do Ministério Público de Minas sobre a matéria.
Para a primeira parte da palestra, fiz pesquisas no livro da Rede SACI que você me enviou, e em alguns textos da educadora Maria Teresa Mantoan e da Procuradora da República Eugênia Fávero.
Os assuntos foram apresentados e intercalados com vídeos da Série “Vida em Movimento”, (um trabalho belíssimo, que você coordenou!).
Assim, quando falei sobre as parceiras entre professores e a família, profissionais de saúde, etc., apresentei o vídeo “Compartilhar o Afeto”, sobre a vida escolar de um aluno com Síndrome de Down e a rede de parceiros que viabilizou a inclusão dele na rede regular de ensino.
Ao explicar o significado da frase “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”, apresentei o vídeo “Conhecer e Conviver”, acerca do preconceito e da invisibilidade das pessoas com deficiência.
O vídeo “Eu posso ir?” ilustrou muito bem as discussões sobre acessibilidade.
Na seqüência, depois que eu mencionei os dispositivos legais referentes à Educação Inclusiva, vimos o vídeo “Para viver o Todos”, a respeito do atendimento educacional especializado, sala de recursos e depoimentos de pessoas com deficiência que estudaram na escola comum.
Na segunda parte da palestra, fiz alguns comentários sobre a minha vivência como estudante com deficiência.
Expliquei para os professores que eu tenho amiotrofia espinhal do tipo III, que causa progressiva fraqueza muscular; porém, desde pequena, meus pais sempre procuraram me estimular nas brincadeiras e nos estudos.
Do pré-primário até o terceiro ano do ensino médio, eu e meus colegas de sala tivemos a sorte de permanecermos juntos nos estudos, por mais de doze anos (foram poucos os que mudaram de turma ou escola).
Durante essa longa convivência, eu não tive nenhum problema de discriminação, ofensas ou brigas.
Eu me sentia muito bem na escola, principalmente pelo fato de que meus colegas aprenderam a respeitar as minhas limitações.
Mencionei como exemplo, a postura deles nas brincadeiras: eu me lembro que na hora do recreio, as crianças se encostavam nos dois lados das paredes do corredor da escola e quando um aluno se aproximava, eles o empurravam de um lado e de outro (uma brincadeira de mau gosto, por sinal!).
Porém, quando eu passava pelo corredor, todos os alunos paravam essa brincadeira, porque sabiam que eu não conseguiria participar.
O mais interessante é que eu e os professores não precisávamos pedir que meus colegas interrompessem a brincadeira para que eu caminhasse pelo corredor.
Eles tomavam a iniciativa de parar. A minha convivência com eles permitiu esse aprendizado.
Eu não deixei de citar na palestra, a atitude dos meus professores, que sempre procuravam me incluir nas atividades: na época da quadrilha, eu participava da dança e as professoras tinham o cuidado de planejar uma coreografia que eu conseguia fazer com os outros alunos, sem movimentos bruscos.
À medida que o tempo foi passando, eu fui crescendo e infelizmente a minha doença avançou.
As amigas mais próximas aprenderam a me levantar da cadeira. Às vezes, eu caía no chão e ficava envergonhada por isso.
Então, as minhas amigas se sentavam ao meu lado, para despistar, como se, de repente, todas nós tivéssemos resolvido sentar no chão, como se fosse a coisa mais normal do mundo...
Enquanto isso, eu me acalmava e depois levantava bem devagar e elas se levantavam também...
Marta, são boas lembranças como essas que me fazem compreender o quanto este convívio com os alunos na escola e a minha família fizeram diferença na minha formação!
E essas histórias da minha vida escolar também mostram que meus colegas tiveram um ganho, ao conviverem com uma pessoa que tem deficiência: aprenderam a respeitar os limites do outro.
É como disse a educadora Maria Teresa Mantoan: “na escola inclusiva, professores e alunos aprendem uma lição que a vida dificilmente ensina: respeitar as diferenças”.
Por fim, na terceira parte, apresentei o “Projeto de Inclusão Escolar do Aluno com Deficiência na Rede Regular de Ensino”, do Ministério Público de Minas Gerais, instituição na qual trabalho como servidora.
Também estava presente o meu chefe, Dr. João Bosco de Rezende Bastos, promotor de justiça responsável pela defesa dos direitos das pessoas com deficiência em Piumhi e nas cidades que pertencem a esta Comarca (Capitólio e Doresópolis).
Trata-se de um projeto que está sendo coordenado pelo CAOPPDI - Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e dos Idosos, do Ministério Público de Minas Gerais e é voltado para todos os promotores de justiça do Estado, que têm atribuição nesta área.
O objetivo do Projeto de Inclusão é promover o acesso de alunos com deficiência às escolas da rede regular de ensino, por meio de três estratégias de ação:
Este projeto já foi iniciado em Minas no começo deste ano. Ainda estão sendo feitos levantamentos da situação atual das escolas nos aspectos relativos à acessibilidade e ao atendimento educacional especializado.
Quando estes levantamentos ficarem prontos, o promotor de justiça da Comarca intermediará a solução para que as escolas ofereçam ensino para todas as pessoas com deficiência e, para isso, fará as cobranças necessárias, firmará termos de ajustamento de conduta e, se for o caso, poderá ajuizar ações civis públicas.
Segundo o Censo 2000, dos 853 municípios em Minas Gerais, Piumhi está em 569º lugar no ranking, com 18,8% de pessoas com deficiência.
Deste grupo, não sabemos quantos não tiveram (e continuam não tendo) acesso à escola, mas teremos esta informação com os dados que serão coletados durante a execução do projeto.
É isso, Marta!
Há uma distância enorme entre o disposto na legislação brasileira e a realidade das pessoas com deficiência.
Apesar de não termos estatísticas em Piumhi, é do conhecimento de todos que a grande maioria está fora da rede regular de ensino, fato que se repete em outras cidades do país. Ainda há muito a fazer para que a lei seja observada.
Uma luz no fim de túnel surgiu neste ano, com uma atuação mais rigorosa do Ministério Público de Minas. Também é louvável a iniciativa da prefeitura de Piumhi, que vem realizando cursos de capacitação de professoras relacionados à educação inclusiva (é claro que não é o suficiente, mas já é um começo).
Oxalá que todos os alunos com deficiência tenham a chance que eu tive e que sejam incluídos na rede regular de ensino!
E que a sociedade possa dar este passo para abandonar os preconceitos e estereótipos em relação à educação e às pessoas com deficiência.
Marta, gostaria de finalizar lhe agradecendo pelo apoio!
Mesmo sem lhe conhecer pessoalmente, você tem me proporcionado um aprendizado enorme com suas mensagens!
Abraços!
Eneida Soares Costa Melo: Contato: Skype: eneida_melo. MSN: eneida_soares@msn.com. E-mail: escmelo@yahoo.com.br
1 Eneida Soares Costa Melo. - Piumhi / Minas Gerais.
Em tempo: Cara Cidinha, você me pediu sugestões de vídeos sobre educação inclusiva: veja os vídeos do Projeto Vida em Movimento, no site www.bengalalegal.com e os indique para a professora do seu filho, especialmente aqueles com os seguintes títulos: “Compartilhar o afeto”, que conta como foi a inclusão escolar do garoto Samuel, que tem síndrome de down o vídeo “Para viver ‘O Todos’: Educação Inclusiva e Especial” o vídeo “Conhecer e Conviver” e o vídeo “Eu posso ir ? – Desenho Universal”, que trata de acessibilidade e tecnologias assistivas. Há também vários outros vídeos neste site que certamente vão ajudar a professora do seu filho. Um abraço! Eneida Soares Costa Melo. Analista do Ministério Público. Piumhi/MG.
13/01/2010 15:00:04
2 Eneida Soares Costa Melo. - Piumhi / Minas Gerais.
Prezada Cidinha,
Somente hoje li a sua mensagem me desculpe por ter demorado a respondêla.
Sem dúvida alguma, o ambiente escolar do seu filho é o da escola comum do ensino regular. É incumbência da escola prover os recursos humanos e materiais necessários à educação inclusiva.
Mas caso ainda haja dificuldades com a professora do seu filho, você pode buscar ajuda no Ministério Público da sua cidade, através do Dr. Alexandre Alves de Oliveira, 3º Promotor de Justiça da Comarca de Formiga Curador dos Direitos das Pessoas com Deficiência e Idosos. Como eu mencionei no texto acima, o Ministério Público de Minas Gerais tem o “Projeto de Inclusão Escolar do Aluno com Deficiência na Rede Regular de Ensino”. Também me coloco à disposição para ajudar no que eu puder.
Um abraço!
Eneida Soares Costa Melo.
Analista do Ministério Público.
Piumhi / MG.
13/01/2010 13:17:13
3 cidinha - formiga MG
achei interesante pois tenho filho na rede municipal na escola ele tem sindrome de down estou tendo muita dificuldade com a professora com seu etedimento sobre a incluçao presico de ajuda informaçao se puder mi responde fico feliz se puder me passar informaçao sobre os videos e tudo muito obrigado
18/03/2009 23:23:10
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