Universo Escolar
 

Fracasso Escolar: Deficientes ou desmotivados - 30/04/2008
Flávia Colen Meniconi e Isabel Campos Araújo Pádua

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Alunas do 8º período do curso de Pedagogia da PUC Minas - Projeto de extensão do Departamento de Educação em parceria com uma escola estadual, localizada na periferia de Contagem

Este projeto foi desenvolvido com o objetivo de prestar assessoria pedagógica a uma escola da rede estadual de ensino da periferia de Contagem, no atendimento de alunos por ela diagnosticados como portadores de deficiências mentais e disfunções neurológicas.

Neste relato de experiência, busca-se discutir as atitudes das instituições escolares que, por não compreenderem as características individuais dos alunos e os fatores intra e extraescolares que contribuem para o seu rendimento, acabam utilizando rótulos como distúrbios para justificar o fracasso daqueles que não se adaptam ao seu sistema pedagógico.

O trabalho iniciou-se com uma análise mais precisa do diagnóstico apresentado pela supervisora da escola, no qual constava um percentual de 35% de alunos supostamente acometidos de deficiências mentais e disfunções neurológicas.

O número era assustador. Ao estudar os relatos dos casos particulares apresentados e a forma como eram tratados pela escola, descobrimos grandes falhas.

O que na verdade a equipe pedagógica da escola estava fazendo era atribuir causas orgânicas a fatores de dificuldades de aprendizagem mais facilmente removíveis, como: déficit de atenção, problemas no processamento da informação recebida e comportamento social inapropriado.
Tal argumento comprova que a avaliação dos alunos apresentada pela escola foi realizada sem qualquer padronização de normas, instrumentos ou procedimento que levasse a um resultado coerente.

Carregada pela imagem negativa da criança da "classe baixa", a escola estava transformando questões de ordem social, que têm influência sobre as dificuldades encontradas no processo tradicional de ensino/aprendizagem, em problemas de saúde mental.

Uma análise do processo pedagógico da escola e da sua administração nos levou a perceber que, na verdade, a prática escolar adotada era a responsável pelo fracasso dos alunos. Ao lhes impor currículos elitistas, práticas de ensino/aprendizagem desvinculadas de sua realidade e um sistema avaliativo que rotulava de "doentes mentais" os que não se adaptavam a ele, essa escola acabava por contribuir para o atraso do desenvolvimento cognitivo e afetivo de grande parte das crianças.

O acompanhamento e a análise dos aspectos cognitivos e emocionais do universo de 16 alunos do ensino fundamental possibilitaram construir um quadro diagnóstico mais preciso dessas crianças.

Para tanto, as alunas receberam assessoria psicopedagógica de professores do Departamento de Educação para avaliar fatores relacionados à maturidade/prontidão, defeitos sensoriais, prejuízos motores, problemas emocionais e pedagógicos.

No resultado da avaliação estavam presentes apenas dificuldades relacionadas à falta de atenção, concentração, de interesse e persistência para aprender, baixa-estima, falta de confiança em si mesmas e desmotivação, o que as levou a concluir que os alunos identificados como portadores de distúrbios ou problemas e dificuldades de aprendizagem não apresentavam nenhum comprometimento neurológico.

No intuito de vencer tais dificuldades, as alunas desenvolveram um projeto com essas crianças durante dois meses, utilizando atividades desafiadoras e estimuladoras da criatividade, visando a vencer as múltiplas barreiras que impediam o desabrochar de alguns aspectos da personalidade, como independência, curiosidade e autoconfiança, e aspectos cognitivos, como atenção e concentração. Trata-se de características básicas para o desenvolvimento do pensamento e da busca prazerosa do saber.

Para o desenvolvimento do projeto, foram tomadas como referência as atividades estimuladoras do potencial criativo de Wechsler (1993), especialista na área da criatividade aplicada à educação.

A partir dessa referência, foram aplicados exercícios de analogias e metáforas, combinações forçadas, leitura criativa com sons e imaginação figural.

O resultado desse trabalho centrado na exploração do potencial criativo dos alunos foi, de fato, muito satisfatório, pois, segundo relato das professoras, eles se mostraram mais interessados nos estudos, mais atentos nas aulas e mais confiantes em si mesmos.

O sucesso do trabalho não resultou somente da experiência desenvolvida com as crianças, mas também de todo um processo de mudança de mentalidade dos professores e da equipe pedagógica da escola.

Ao criar um ambiente de aprendizagem atento às diferenças, motivador, encorajador e estimulador, a escola conseguiu fazer com que seus alunos desenvolvessem o potencial intelectual, guiados pelo prazer e o desejo de aprender.

Conclui-se que, de fato, é decisiva a contribuição das práticas escolares na produção do fracasso escolar. Alunos rotulados como deficientes mentais nada mais eram do que frutos do ensino homogêneo, incapaz de reconhecer as diferenças e promover a aprendizagem atendendo às necessidades individuais de cada criança.

Uma atitude responsável e comprometida seria organizar o processo pedagógico dentro de um sistema educacional inclusivo, capaz de atender às necessidades das classes populares numa perspectiva globalizante, levando em conta seus conhecimentos, experiências, valores e a sua história.

Para tanto, é também imprescindível investir na formação dos professores e lutar para o resgate da sua dignidade, traduzida em melhores condições de trabalho e, principalmente, na conquista de níveis salariais compatíveis com a responsabilidade do trabalho que exercem.

Esse é o começo para conseguirmos conquistar o paradigma da inclusão social na vida educacional, redefinindo e reestruturando a prática educativa de tal forma que ela seja capaz de acolher e trabalhar todo o aspecto da diversidade humana representada pelo alunado.

É o sistema educacional que deve adaptar-se às necessidades de seus alunos, criando mecanismos para atender desde as diferenças orgânicas e psíquicas às diferenças étnicas, culturais, sociais e econômicas.

Referências Bibliográficas

ALENCAR, Eunice M. L. Soriano. Como desenvolver o potencial do criador: um guia para a libertação da criatividade em sala de aula. Petrópolis: Vozes, 1992.

COELHO, Ana Silva Borges. A intervenção psicopedagógica na parceria com professores. Psicopedagogia, São Paulo, v. 17, n. 44, p. 29-31, ago./1998.
GOLDSCHMIDT, Lindomar R. Chaves. Pelo direito de sonhar e criar na escola.

ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino – Olhando a qualidade do ensino a partir da sala de aula, 9. Águas de Lindóia, p. 379, maio 1998.

GUIMARÃES, Marcelo Pinto. Acessibilidade: diretriz para a inclusão. Seminário Internacional - Sociedade Inclusiva, 1, PUC Minas, set./out. 1999.

SASSAKI, Romeu Kazumi. O novo poder: seu impacto nas entidades assistenciais. Seminário Internacional - Sociedade Inclusiva, 1, PUC Minas, set./out. 1999.

WECHSLER, Solange M. Criatividade: descobrindo e encorajando. Campinas: Psy, 1993.

http://www.sociedadeinclusiva.pucminas.br/anaispdf/fracassoesc.pdf

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2 COMENTÁRIOS

1 Marlene Zwierewicz - Florianópolis
Gostaria de saber a data de publicação do texto, pois pretende incluir uma citação em um trabalho que será publicado. Sugiro também que nos demais textos a data seja incluída, pois possibilita fazer uma citação mais completa, valorizando tanto o texto publicado como o site responsável por sua publicação.
15/12/2010 08:01:58


2 Eunice Pinheiro da Silva - São Paulo
gostaria de receber folhetos e reportagem da Revista Associação Brasileira de Psicopedagogica, se possível desde de já agradeço. Eunice
10/04/2010 23:25:38


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