A Semana - Opiniões
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Lições da Engenharia - 12/02/2008
O hotel das mil e uma noites...

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Vista do Hotel Burj Al Arab

Assisti um documentário no National Geographic Channel sobre a construção do único hotel 7 estrelas (isso mesmo, sete estrelas...) do mundo, o Burj Al Arab, localizado em Dubai, no Oriente Médio. Fiquei impressionado com vários aspectos do projeto, do trabalho, da ousadia e da perspectiva de futuro dos líderes locais. Creio que há várias lições e exemplos dessa notável obra da engenharia para a educação e também para tantos outros ramos de atuação humana.

Comecemos então revisando uma breve parte da história de Dubai, um dos estados que compõem os Emirados Árabes Unidos desde 1971, quando foi criada essa estrutura política na região. Até o início da década de 1960 Dubai era uma cidade de pescadores e comerciantes nos moldes do antigo mundo árabe, sem grandes atrativos turísticos, num local desolado (apesar de paradisíaco em termos de suas paisagens marítimas e praias), com a população em sua maioria pobre e sem grandes perspectivas para o futuro, rodeada de países ricos (em virtude do petróleo) e ameaçadores para sua estabilidade política.

A descoberta de expressivas jazidas de petróleo nos Emirados Árabes e, particularmente em Dubai, durante a década de 1960 mudou a história da região e criou para o povo local condições de prosperidade nunca antes vivenciadas por ali. Motivou também o fortalecimento político da região com a criação do pequeno estado composto por nações minúsculas, mas que, conjuntamente, passavam a ter mais expressão e força no cenário do Oriente Médio assim como importância mundial em virtude do petróleo que passaram a exportar.

A despeito disso, de toda a intensa atividade que iniciou-se por parte das empresas petrolíferas estabelecidas em Dubai e nos Emirados Árabes como um todo, estudos realizados por pesquisadores especializados quanto aos estoques de petróleo disponíveis na região indicaram que os mananciais locais eram limitados e que, com certeza, se esgotariam até aproximadamente 2.020 ou, na melhor das hipóteses, 5 ou 10 anos depois dessa data...

Foto do quarto do hotel
Quarto em estilo Mil e Uma Noites (Hotel Burj Al Arab)

Isso significa, na prática que todo o desenvolvimento proporcionado por essa riqueza mineral se extinguiria em aproximadamente 50 ou 60 anos e... O que seria do país a partir de então? Iria se tornar novamente uma pátria de mercadores do deserto? Ou voltaria a ser dependente da pesca? Quem sabe poderiam vender areia, a outra matéria-prima disponível em abundância por aquelas bandas...

Esse é o ponto em que as autoridades locais resolveram criar planos de transformação do perfil econômico do país para torná-lo independente do petróleo nesse curto espaço de tempo que teriam para fazê-lo com o apoio das divisas provenientes da própria exploração petrolífera. E que alternativa melhor do que o turismo e a hotelaria, num local de cultura exótica, bastante atraente para viajantes de grande poder aquisitivo, dispostos a pagar altos preços por luxos únicos e exclusivos?

Era necessário, nesse sentido, criar algo impactante para que o mercado mundial de turismo fosse não apenas alertado, mas despertado e, em especial, para que se mostrasse disposto a levar para o distante Emirado expressiva quantidade de turistas de alto poder aquisitivo. O que parecia ainda mais difícil se levarmos em conta que a região também é pouco atraente em virtude das questões políticas e religiosas que motivam violências, discórdia e guerras.

A criação de um hotel único, que se tornasse um ícone da região e que atraísse a atenção do mundo inteiro para Dubai foi então a alternativa pensada e realizada. Entramos então numa segunda etapa, a concepção do projeto e a execução da obra. Como os arquitetos e engenheiros ingleses contratados para essa hercúlea tarefa pensaram, a existência de belas praias, com mar relativamente agitado, propício a esportes náuticos (como a vela ou o windsurfe) poderia sugerir idéias para o hotel a ser construído.

E foi dessa característica que se originou a forma de vela adotada para a construção. Icônica como o Teatro de Sidney, a Torre Eiffel, as pirâmides de Gisé, o Taj Mahal ou a Estátua da Liberdade. Única, exclusiva, original, simples e, ao mesmo tempo, forte o suficiente para compor o imaginário e o inconsciente coletivo mundial. Ainda mais com o alarde que a obra originou, em particular depois da decisão das autoridades locais de realizar a construção numa ilha artificial criada especialmente para abrigar o hotel.

Foto do saguão do hotel
Vista do saguão do hotel Burj Al Arab

Levando-se em conta que o mar local é bastante agitado e que há regular atividade de ventos fortes e até mesmo de tornados no Golfo Pérsico, a edificação de um prédio com 300 metros de altura, ainda que a pequena distância do continente, numa pequena ilha artificial a ser erigida, parecia ousadia demais, ou até mesmo, na visão de alguns, loucura. Mas o desafio foi encarado de frente e, com inúmeras soluções inovadoras e inéditas criadas pelos arquitetos, engenheiros e técnicos que atuaram na obra, o hotel Burj Al Arab foi construído em 6 anos, para iniciar suas atividades no ano 2000.

Soluções foram criadas para que a ilha desse estabilidade para o enorme prédio que abrigaria, estruturas de apoio extremamente sólidas foram criadas, utilizaram-se elegantes materiais em metal e vidro para compor um visual atraente e moderno, os melhores e mais caros recursos foram adquiridos para dar a decoração e aos serviços do hotel qualidade única, fontes de energia e distribuição exclusivas foram concebidas para abastecer o luxo e as necessidades dos hóspedes durante sua estadia...

E Dubai passou a viver uma febre de novos investimentos na esteira de seu hotel 7 estrelas... O turismo é a alternativa escolhida pelos líderes locais e referendada pelo povo... A estadia nesse hotel é realmente para poucos, com uma diária custando aproximadamente 25 mil dólares...

E que lições afinal surgem dessa grandiosa empreitada da engenharia em Dubai? Primeiramente temos que destacar a necessidade da ousadia, da busca por alternativas que renovem nossas práticas, dando a elas novas soluções para antigos e novos problemas do cotidiano. A engenharia de ponta, numa constante de suas ações, utiliza todos os recursos que possui e até que ainda não foram criados para conseguir oferecer serviços seguros, de qualidade, confortáveis, estáveis e duradouros para seus clientes. O raciocínio em educação (ou qualquer outra área de atuação humana) tem que ser o mesmo...

Se não temos a resposta para as questões e problemas que nos são apresentados, devemos fazer como os engenheiros, ou seja, se debruçar nas pranchetas e calcular, recalcular, pesquisar variáveis, estudar outras edificações, avaliar projetos criados por outros grupos, conhecer e identificar novas tecnologias e materiais... Tudo isso sem perder de vista que o que já possuímos em termos de recursos, conhecimentos, técnicas e práticas continua vivo e pode ser a solução em muitos casos.

Pensar em detalhes e analisar todas as prerrogativas dos projetos que temos pela frente em nossa atuação profissional também é uma das lições da engenharia aprendidas com a construção do Burj Al Arab. Planejamento toma tempo e, no caso da educação, deve prever o conhecimento do plano político-pedagógico da escola, a orientação metodológica, o trabalho dos outros professores, a estrutura de apoio dada pela direção, os serviços de apoio (orientação e coordenação), os materiais disponíveis (desde instalações até livros e computadores),...

Outro aspecto a se destacar nessa história e que muitas vezes perdemos de vista em educação é que o cliente é o rei, por isso o hotel 7 estrelas possui o que há de melhor para oferecer a seus clientes. Isso não quer dizer que iremos deixar nossos alunos, os clientes finais da educação, fazer o que bem entenderem.

Foto do saguão do hotel
Restaurante com enorme aquário (Hotel Burj Al Arab)

Significa na realidade que o foco dos educadores é a formação integral e qualificada de seus estudantes e que, a utilização de metodologias diversificadas, o diálogo, a capacidade de ouvir, a valorização da experiência do aluno, o ensejo à produção conjunta (em pequenos grupos), o estímulo à cooperação e a troca, o uso de novas tecnologias, a atualização de seus próprios conhecimentos e outras práticas essenciais para uma nova escola a ser construída são elementos primordiais...

Obs. Recomendo a todos os interessados que assistam ao programa sobre o Burj Al Arab, exibido como parte dos documentários sobre obras incríveis, apenas no National Geographic Channel.

Avaliação deste Artigo: 4 estrelas
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2 COMENTÁRIOS

1 dete - BELÉM PARÁ
Usei este artigo como exemplo de paisagens artificiais criadas pelo turismo. Uma hiperespecialização dos espaços. ESTUDANTE BACHARELADO DO TURISMO.
22/11/2009 20:14:34


2 verônica - Campinas
oi muito legal o artigo eu curso arquitetura e preciso fazer um trabalho sobre análise estrutural de alguma edificação, e meu grupo está pensando em escolher o burj al arab, será que tem como ter acesso a esse documentário? seria muito interessante pois precisamos de dados técnicos como material utilizado, histórico da obra , área construída, etc. bom, se possível me responda por email muito obrigada
11/08/2008 18:58:45


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