A Semana - Opiniões
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Corinthians, Renan e PISA... - 05/12/2007
Sínteses da história recente do Brasil

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Desenho-Renan-brincando

Enquanto se discute pelos quatro cantos do país o destino da nação alvinegra, estimada em quase 30 milhões de pessoas, formada pelos torcedores do Sport Club Corinthians Paulista, recém-rebaixado à segunda divisão do campeonato brasileiro de futebol... Renan Calheiros é absolvido pelo Senado depois de renunciar ao cargo de presidente daquela casa... E os índices mundiais do PISA (Programa de Avaliação Internacional de Estudantes), considerado o exame mais importante do mundo em educação, aplicado em 2006 em 57 países (que juntos representam 90% da economia mundial) são divulgados e, para variar um pouco, o Brasil continua nas últimas posições...

E o que há em comum entre essas três histórias para que se tornem objeto do Editorial de um portal especializado em educação como o nosso? No caso de uma análise dos resultados do PISA é até óbvio que nos debrucemos sobre o assunto para entender melhor a situação da educação brasileira... Mas, Corinthians e Renan Calheiros?

Pensemos caso a caso para entender então os pontos de conexão entre as três situações... Comecemos pelo rebaixamento do clube mais popular de São Paulo, possuidor da segunda maior torcida do país (superado apenas pelo Flamengo)... Mesmo tendo sido empurrados por milhares de torcedores, que acenderam suas velas, fizeram suas promessas em caso de não rebaixamento do time e que durante todo o Campeonato Brasileiro de futebol em sua edição de 2007 roeram suas unhas, arrancaram seus cabelos e se debulharam em lágrimas, o escrete corintiano ficou em 17º lugar e foi para a Série B.

Até aí nada de mais, concordam? Botafogo, Fluminense, Grêmio, Bahia, Coritiba, Atlético Mineiro e o arqui-rival Palmeiras também passaram por essa situação em anos recentes... Diga-se de passagem que todos eles foram campeões da Série A e que fazem parte da chamada elite do futebol brasileiro por suas tradições regionais e nacional...

Bandeira-corinthians

E o que pesa mais no caso do Corinthians? Além da rivalidade incomum e da incontida felicidade de torcedores de praticamente todos os outros grandes clubes brasileiros? A associação com a MSI, o endividamento da agremiação, o enriquecimento dos cartolas, a venda a peso de ouro de jovens valores e dos medalhões contratados durante a parceria para o exterior, a desestruturação ao longo dos últimos 18 meses do departamento de futebol corintiano e a constatação de que o maior celeiro de craques do mundo (o Brasil) é dirigido por amadores, estelionatários e incompetentes que irão levar o futebol a bancarrota (como já o estão fazendo) nos próximos anos...

Jornalistas e especialistas no assunto têm alertado com grande freqüência que o Corinthians é apenas a ponta do iceberg... Há outros clubes grandes que estão igualmente falidos. Patrimônios estão sendo desfeitos, jovens jogadores ainda inberbes estão sendo negociados com o futebol europeu antes dos 20 anos de idade, parcerias escusas que causaram (e ainda causarão) estragos nas finanças dessas verdadeiras instituições nacionais que são os clubes de futebol do país – constituem apenas parcela da história como um todo...

Penso que o rebaixamento para a Série B foi um remédio até suave para os desmandos que tomaram conta do Corinthians nos últimos anos. E pode inclusive ser sua tábua de salvação – ensinando o caminho das pedras para a lisura e a administração profissional e competente dessa paixão nacional que é o futebol – o que poucos times de tradição (como o São Paulo) já conseguiram entender e estão colocando em prática...

E é nesse ponto que associamos os descaminhos do futebol corintiano com a miopia (ou cegueira, como apregoam muitos críticos) do Senado Federal em relação à opinião pública. Escrevi recentemente uma postagem em um de meus blogs (para conhecer esse projeto de pesquisa que desenvolvo para a PUC-SP, entre no site Observatório da Educaçãowww.observatoriodaeducacao.com) em que reproduzo as palavras do colunista Clóvis Rossi, da Folha de São Paulo, em que o mesmo apresenta a qualificação dos eleitores brasileiros pelos próprios políticos nacionais como “rematados imbecis”...

Foto-político

Permanecendo em cena...

Ou seja, de acordo com os políticos que elegemos somos apenas massa de manobra, fazemos parte de seus currais eleitorais e estamos a seu serviço – quando o que deveria acontecer seria justamente o contrário, eles deveriam estar a serviço da população brasileira e dos interesses da nação...

No fundo mesmo penso que eles não deixam de ter razão em sua compreensão do eleitorado. Eleição após eleição os mesmos nomes e partidos se mantém em evidência. Caciques políticos e velhas raposas permanecem há anos (ou décadas) no Congresso e, evidentemente, o corporativismo é apenas uma das manobras corriqueiras para manter privilégios e vantagens pessoais.

Há outras “Mônicas Velloso” nos corredores do Congresso, assim como também devem existir mais jardineiros e motoristas que sabem muito sobre toda a podridão das entranhas do poder e que a qualquer momento, não recebendo o seu quinhão virão a público denunciar mais maracutaias...

Em suma, somos mesmo “rematados imbecis” e assim o seremos até o momento em que tomarmos as rédeas do processo e decidirmos por uma reestruturação da máquina pública, vetando através do voto, de passeatas, de manifestações públicas, de abaixo-assinados e de todo e qualquer tipo de demonstração de nossas insatisfações e de nosso descontentamento com acordos como aquele que livrou Renan Calheiros de mais um processo de cassação em troca da renúncia da presidência do Senado pelo referido político...

E por que somos esses “rematados imbecis”? Pelo fato de escolhermos nossos políticos sempre de forma errada, sem analisar suas trajetórias e compromissos reais (com eles mesmos e com instituições privadas)? Ou seria simplesmente por que nunca aprendemos a votar, como já dizia Pelé, lá pelos idos dos anos 1970 e 1980?

Nossa “imbecilidade” tem relação direta com os resultados do PISA. Com a educação desqualificada que temos – como comprovam não apenas os últimos lugares do PISA, mas também os exames aplicados pelo MEC dentro do próprio país (Enem, Saeb, Saresp).

O que esperar de um país onde as crianças não aprendem a ler e escrever além das palavras, podendo produzir e interpretar textos, compreendendo os sentidos evidentes e ocultos das mensagens lidas; ou ainda em que a matemática básica não é conhecimento adquirido nas escolas nacionais – tornando-se artigo de luxo, disponível apenas para os abastados que podem freqüentar escolas particulares (se o PISA considerasse apenas os resultados das redes privadas de ensino brasileiro o país ganharia quase 100 pontos em todos os quesitos avaliados e subiria no ranking desse estudo para posições equivalentes as de nações européias desenvolvidas, como a Espanha ou a Itália).

Desenho-de-dúvida

Enquanto formos esquálidas figuras no cenário internacional da educação continuaremos condenados à imbecilidade que faz com que figuras torpes como nossos políticos continuem a frente da nação ou que dirigentes de clubes e esportes prossigam na destruição de tradições, histórias, patrimônios e paixões...

A educação é a chave para o futuro do Brasil, isso não deve ser apenas discurso eleitoral, trata-se de constatação embasada em exemplos de outras nações que, nos últimos anos e décadas, como o Chile, a Coréia ou a Índia – superaram não apenas o nosso país em vários quesitos econômicos e sociais (isso foi até fácil, diante de nossa mediocridade) – mas que se equipararam aos gigantes mundiais, como o Japão, os Estados Unidos ou as nações da Europa...

Obs.: Três fatores me compeliram a escrever o presente editorial... Nunca estive tão descrente nas possibilidades do país como nas últimas semanas em virtude da violência, da corrupção, da situação da educação (e da teimosia dos envolvidos em admitir sua parcela de responsabilidade); sou educador e brasileiro e todos os dias cultivo e atuo em favor de uma educação mais qualificada e, apesar da incredulidade e referida descrença com os rumos do país, não desistirei jamais; faço parte da nação corintiana (louco por ti, Corinthians), e a despeito das lágrimas de meu filho (e minhas), penso que remédios amargos é que ajudam realmente a curar os doentes...

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